agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

sábado, maio 24, 2008

PARADOXO DA IMPOSSIBILIDADE


FADE-IN.

MINHA CONTURBADA CONSCIÊNCIA. INT. DIA.

Som in-off do interfone tocando.
Dirijo-me, subjetivo, até a porta.
Uma mulher qualquer:

- Leia Mateus 22:14.

E pronto. Nada mais. Foi-se desta forma, causal.

A Causalidade pressupõe a multiplicidade do ser assim como o movimento originário da relação entre os seres. Aristóteles apresenta como objetivo principal da ação a melhoria do ser, considerando-a como força capaz de gerir o movimento. Em outras palavras, ele a compreende como princípio motivador do movimento para o alcance da felicidade.

No ponto chegou 2214: o ônibus.
Ali dentro, felicidade não se encontra em versículos. Ali, Deus é valor de troca, moeda sem câmbio suficiente para pagar o tempo entre o giro da roleta e o sinal de desembarque. Isso por que todo mundo precisa acreditar em alguma coisa além da materialidade.
Felicidade, por exemplo, não se compra, dizem. Logo, não é material.
Como Deus ela é invisível, não se toca.

Sendo assim, o motivo fundamental da ação é alcançar valores utópicos. Aristóteles sabia bem que o objetivo final de qualquer ação é algo que não pode ser alcançado materialmente por que reside no mundo das idéias, são valores ou sensações abstratas como paz, amor, serenidade, Deus, felicidade... Considerando que todo material ambicionado é uma ponte de acesso a esse tipo de sensações e valores.
No final das contas, o ser humano é pura endorfina.

No entanto, para poder visualizar e idealizar a conquista dos seus sonhos, o ser humano precisa de contato direto com seu mundo concreto e real e que ele seja por si só a ação, ou seja, a força capaz de manter o ser humano permanentemente em estado de vigília e movimento. Desta maneira, o mundo real e concreto torna-se auto-suficiente na sua funcionalidade por que conta com a causalidade; neste mundo permanecemos constantemente em contato com o assassinato, o terrorismo, o extermínio, a xenofobia, a peste, a guerra... valores que dependem da materialidade para existir; valores cuja causalidade nos permite contemplar e desejar o seu oposto complementar no mundo das idéias.

Então, disto concluímos:

É necessário que o mundo se mantenha permanentemente desordenado e caótico para que os seres humanos continuem tentando consertá-lo, e que nisto eles encontrem a razão de sua existência.

Paradoxo da Impossibilidade: A guerra é irreversível e incontornável. Num mundo no qual pais defenestram seus filhos, a paz é uma reação química.

Seguindo esta mesma linha comparativa, mas transferindo do universo macro para o universo micro: o corpo de um indivíduo só é impelido a agir para alcançar um determinado objetivo por ele idealizado se mantido em estado perene de tensão e incômodo.

Nós, pesquisadores agrupados do Núcleo Obscena, possuímos como objetivo idealizado experimentar Um Modelo Não Representacional Para o Ator Contemporâneo. E para tal, contamos com a dissertação de mestrado de Merle Ivone Barriga sobre este assunto como material de embasamento teórico.

No entanto, o que no universo macro é conquistado através da causalidade, no universo micro só pode ser conquistado através do esforço. A Causalidade só é generosa conosco até um determinado momento, a partir dele é necessário que se produza algo para gerar outras causalidades. É como engravidar alguém: se vai ser menino ou menina é causal, mas para que isto seja possível é necessário que a porra seja produzida.

O conteúdo teórico de uma pesquisa, além de não invadir casualmente o intelecto de ninguém não produzirá nada se não houver o mínimo de esforço e rigor diante de sua expressão material. O estado perene de tensão e incômodo capaz de detonar o combustível que alimenta nossa pesquisa só pode ser produzido individualmente. E isso quer dizer que eu posso e devo me sentir no direito de, por efeito de causa e conseqüência, cobrar por ele.

O mínimo de esforço pode esclarecer, por exemplo, que a critério de diferenciação nós lidamos com dois tipos de modelos para o ator: um não-representacional e outro representacional. De acordo com a lógica de meu raciocínio, se um pesquisador diz que não se interessa pelo modelo não representacional, logo ele se interessa pelo outro... e logo, eu não entendo por que ele está integrando este Núcleo.

O mínimo de esforço pode esclarecer, por exemplo, que a critério de diferenciação, “não-representacional” é um modelo e “épico” é gênero. E se um pesquisador diz que não se interessa pelo “não-representacional”, mas sim pelo “épico” logo eu entendo que ele não entende por que está integrando este Núcleo.

O gênero pode estar incluso no modelo, mas não servirá de nada se o modelo não for perseguido com ele. O épico não vale nada para nós se for entendido isoladamente. Deixa de fazer parte da pesquisa para se tornar um mero fetiche, como o necrófilo que vai ao buteco para sanar sua libido obscura tomando uma loira, gelada.

O Núcleo Obscena não é um espaço de exacerbação de fetiches e vaidades. Para isso existem as prostitutas e os vídeos pornográficos. Eu espero que permaneçam aqui pesquisadores sérios e rigorosos com suas pesquisas e, antes de tudo, pesquisadores esclarecidos de suas pesquisas. E se nós somos vetores da causalidade, que ela nos leve a um abismo de dúvidas e não a um córrego de certezas.

Em hipótese alguma deixarei de chamar atenção, fazer cobranças e alfinetar o trabalho alheio; e espero dos demais que façam o mesmo comigo.
Se o objetivo final de minhas ações como pesquisador é a experiência de um ideal. E se ideais são figuras de linguagem abstratas conquistadas através de derramamento de sangue: patrocinarei a guerra.

“Por que são muitos os chamados, e poucos os escolhidos” – Mateus, 22:14.

FADE-OUT.


Fim

2 comentários:

Clóvis Domingos disse...

Moacir,
muito bom o teu relato, se não estou enganado vc fala da necessidade de se tirar o corpo de um certo conformismo ( olha a forma aí )e deixá-lo numa outra zona de percepção, é isso? Ter um olhar atento e perceptivo sobre o corpo? Vc falava de corpo neutro, quase branco, sem significações pré estabelecidas..... fiquei pensando no conceito de '' corpo vibrátil '' da Lygia Clark, vc já ouviu falar dela?
Outra questão : no final do teu relato vc faala que teu objetivo de pesquisador é viver a esperiência de um ideal. Vc poderia falar mais disso? achei interessante e queria te provocar te pedindo mais explicações.
Aguardo vc,
Clóvis.

Moacir disse...

Clóvis, querido, a forma me perturba. Esta é a minha realidade atual como criador, talvez por vir de um histórico de criações rebuscadas e barrocas como diretor universitário. A forma viciada adoece o corpo e a investigação... vislumbro no "nada" uma potência para um "corpo absoluto", revestido somente pelo acaso. Já ouvir falar de Lygia e me me interesso bastante por esse material. Você tem?

E sobre a experiência do ideal: provocação aceita, também sinto necessidade de falar mais sobre isso. Vou escrever mais, quero utilizar o espaço do blog para escrever coisas além dos relatórios. E provocações como a sua são ótimos estimulantes. Precisamos mais disso, por parte de todos.
Até breve.
Moacir.