agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quarta-feira, setembro 23, 2009

BATE-PAPO COM CHRISTINA FORNACIARI

DURANTE SEU MESTRADO EM LONDRES, CHRISTINA TRABALHOU EM PRESÍDIOS COMO PROFESSORA E ORIENTADORA DE MONTAGENS PERFORMÁTICAS, EM QUE PARTE DOS PRESIDIÁRIOS TINHAM COMO PARTE DO CUMPRIMENTO DA PENA, AS AULAS ARTÍSTICAS, TENDO NESTAS AULAS, UMA FORMA DE ALCANCE EFETIVO DE EMPREGOS E DE REINTEGRAÇÃO SOCIAL. FORMADA EM DIREITO, CHRISTINA TRABALHOU A RELAÇÃO ENTRE DIREITOS HUMANOS E PRÁTICAS TEATRAIS, UTILIZANDO OS JOGOS DE BOAL COMO PONTO FORTE EM SEU PROGRAMA DISCIPLINAR. CHRISTINA DETALHOU QUE OS INTERNOS POSSUÍAM INÚMERAS DIFICULDADES, TAIS COMO A BAIXA AUTO-ESTIMA, A DIFICULDADE DE CONCENTRAÇÃO E APRENDIZAGEM. ELA RELATA QUE OS PASSOS DADOS ERAM TÃO PONTUAIS E PEQUENSO QUE, A CADA AULA, APLAUSOS ERAM UTILIZADOS, A FIM DE ALIMENTAR O CRESCIMENTO E INCENTIVAR A CONTINUIDADE. AOS POUCOS, A FRAQUEZA INTERIOR DAVA LUGAR À VONTADE DE SE COLOCAREM NO DISCURSOS DA CENA, DE MANEIRA AUTOBIOGRÁFICA, COMO ATUANTES DOS SEUS PRÓPRIOS PROCESSOS, E ÀS VEZES, REINVENTANDO OS SIGNOS DE SUAS HISTÓRIAS. SEGUNDO CHRISTINA, OS PRESIDIÁRIOS ERAM, EM GRANDE MAIORIA, IMIGRANTES POBRES DE OUTROS PAÍSES. O QUE LEVA A REFLETIR SOBRE ÀS CONDIÇÕES SOCIAIS (E APARENTEMENTE XENOFÓBICAS) QUE OS MOVERAM PARA O CRIME. FALAMOS SOBRE A PERDA DE IDENTIDADE E COMPARAMOS AS RELAÇÕES ENTRE O PRESÍDIO LONDRINO E O SÃO JERONIMO:
PARA MIM, FICARAM ALGUMAS QUESTÕES:
-ATÉ QUE PONTO APROXIMAR FISICAMENTE DAS INTERNAS, E QUAIS TIPOS DE RELAÇÕES ESTABELECER? JÁ QUE PERCEBEMOS QUE A RELAÇÃO HIERÁRQUICA, PROFESSOR- ALUNO NÃO É NADA ADEQUADA.
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IMAGEM E LÍNGUA

SOBRE A PALESTRA DE EUGÊNIO BUCCI, REALIZADA NA CASA FIAT DE CULTURA NO DIA 17 DE SETEMBRO:
BUCCI APONTOU QUESTÕES E FEZ CONSIDERAÇÕES (DE MANEIRA BEM SARCÁSTICA, DIGA-SE DE PASSAGEM) SOBRE O OLHAR E A IMAGEM NA SOCIEDADE ATUAL. PONTOS QUE ACREDITO SER DE GRANDE RELEVÂNCIA PARA O OBSCENA, OS QUAIS DESCREVO ABAIXO:

-ATÉ QUE PONTO FAREMOS SACRIFICIOS FARMACOLÓGICOS E ESTÉTICOS PARA CORRESPONDERMOS ÀS EXIGÊNCIAS DOS OLHARES EXTERNOS?
-O OLHAR SEMPRE É EXIGENTE, TANTO QUE A PROPAGANDA SE UTILIZA DESTE OLHAR ATÉ EM BANHEIROS PÚBLICOS;
-A IMAGEM ESCRAVIZA A MULHER , TORNANDO-A AMANTE DESTA SUBSCERVIÊNCIA MERCADOLÓGICA;
-DIVERTIR-SE É ESTAR DE ACORDO COM AS REGRAS DO ENTRETENIMENTO;
-O CAPITAL REMUNERA OS OLHOS COMO EM UM ESCAMBO;
-A IMAGEM PROPORCIONA UM PRÉ-GOZO, MESMO QUE INSTANTÂNEO;
-A MERCADORIA SOMENTE EXISTE QUANDO ELA É EXCLUSIVA, OU SEJA QUANDO ELA EXCLUI.
- O CORPO COMO SUPORTE DO DISCURSO VISUAL TEM TOTAL RELAÇÃO COM O MEDO DE SER REPROVADO PELO OLHAR.
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A criação de novos olhares através do exercício artístico/teatral

Segunda-feira , noite de 21 de Setembro de 2009 , recebemos a visita de Christina Fornaciari, performer, atriz, professora do Curso de Artes Cênicas da UFOP e fez mestrado na Inglaterra sobre "Performance e Direitos Humanos" focando o trabalho teatral nas prisões.

Sua visita se tornou especial ( partiu de um convite de Erica Vilhena) pelo fato de que no próximo sábado iniciaremos o projeto "DIÁLOGOS OBSCÊNICOS" com as jovens internas do Centro de Reeducação Social São Jerônimo aqui em Belo Horizonte. Nossa proposta nos próximos dois meses é tentar um díálogo artístico com essas jovens mulheres a partir de uma série de procedimentos artísticos e performáticos.

A conversa com Christina foi muito interessante devido a alguns aspectos abordados por ela, tais como:

- Ter calma no processo de trabalho dando cada passo em consonância com o ritmo e tempo do grupo e valorizando e incentivando cada momento vivido. É importante começar do mais fácil para que cada uma possa se sentir capaz de participar das atividades.

- Valorizar aquilo que elas têm como refência cultural: música, filmes, revistas etc. São materiais que podem ser utilizados na criação e improvisação de cenas.

-Propor exercícios e atividades mais corporais e deixar que as palavras venham aos poucos, isto é, mais prática e menos teorizações. Uma vez que o corpo se encontre menos defensivo e mais relaxado e aberto, aí se tornam possíveis mais conversas e reflexões.

- Importante trabalhar com o audiovisual pela questão da imagem e depois a possibilidade de se verem e se reverem. No exercício artístico a RECRIAÇÃO DE SI MESMO.

- Os exercícios do Teatro do Oprimido do Augusto Boal são muito interessantes e apresentam perspectivas não somente artísticas mas também sociais e políticas.

-A proposta mais potente é a abertura para novos olhares e pontos de vista sobre o mundo, o Outro e si mesmo. Não trata-se de um procedimento de reabilitação, mas a possibilidade de experiências novas, singulares e capazes de produzir deslocamentos e descobertas.

- Instalações corporais, de objetos pessoais ou construídos, enfim, a dimensão plástica e performática de variadas atividades. Falar do pessoal para se chegar ao universal.

Acredito que oferecer a PRESENÇA HUMANA já se configura como poética e política da existência. Fica nosso desejo de continuar dialogando com Christina.

terça-feira, setembro 22, 2009

Procedimentos domesticados e espetacularizados?

Semana passada deambulei por dois trabalhos do Obscena: "Desejos classificáveis" do Marcelo Rocco com o Didi e a Patrícia na porta do Palácio das Artes e o "Baby Dolls" com Nina, Erica, Lissandra e Joyce na Praça da Estação. É sempre bom presenciar experimentos e poder avaliá-los, ser atravessado por eles e criar novas perguntas para a pesquisa.

São três vetores que me chamaram a atenção no que presenciei nos trabalhos e me provocaram algumas questões: o espaço, o tempo enquanto duração e a natureza ou forma do experimento. Vou tentar passar por estes tópicos.

No caso dos "Desejos classificáveis", avalio que foi uma experiência interessante pelo fato de ter provocado alguns movimentos e deslocamentos no olhar dos transeuntes da cidade. O experimento que priorizou a imagem e ação dos atores e não qualquer tipo de texto ou fala, provocou pelo estranhamento de algumas imagens. Tudo foi sendo construído de forma orgânica e isso trouxe uma presença mais dilatada dos atores. Ficou evidente que Marcelo atua neste procedimento através de sua corporalidade presentificada no entorno e no centro da ação. Só que em alguns momentos isso se perde e Marcelo fica muito de fora, distraído e atuando muito como um diretor ou o responsável pelo acontecimento. Isso se dá por exemplo quando é ele que entrega os folders do evento Terças Poéticas e deixa claro que a ação faz parte de uma programação do Palacio das Artes.

Considero que a intervenção se mostrou muito leve e perdeu uma agressividade potente que sempre existiu nela. Para mim isso se deve pelo fato do espaço escolhido ( um espaço artístico, o que deixa claro do que se trata e acho mais potente criar ambiguidades ) a duração ( somente 20 minutos onde o trabalho não acontece e perde força ) e a forma como a ação acontece, isso porque influenciada por fatores externos como o fato de estar dentro de outro evento. Para mim essa concessão é pouco interessante porque retira a força e a violência da ação. Questiono então Marcelo, Didi e Patricia: não seria perigoso demais atender outras expectativas e perder algumas linhas de força da pesquisa? O que perceberam, descobriram e problematizaram com essa experiência? Certamente novas percepções surgiram. O procedimento não acabou por se domesticar? O que se ganhou e se perdeu? Pergunto porque me interessa identificar todas as possibilidades existentes. Nas ruas a ação de vocês não os coloca mais em risco e traz a possibilidade de um "CORPO VULNERÁVEL"? A opção de participar deste evento ( o lançamento do livro ESCRITURAS BORDADAS ) dialoga e provoca a pesquisa de vocês em que sentido?

Aguardo as respostas para que um diálogo se estabeleça.

Quanto ao "Baby Dolls" na Praça da Estação tive a sensação de que o trabalho ficou disperso e sem força. O espaço ficou maior que a ação e tudo muito "policiado" e espetacularizado demais. Havia um público ali convidado para assistir uma peça de teatro?

Aconteceram imagens potentes e até belas, mas isso é muito pouco. Faltou talvez mais risco e presença das atuantes. Acabou que também ficou leve e gostoso de se ver...O mesmo se deu em relação ao tempo: uma passagem muito rápida da exposição para a cidade das mortas. Faltou mais tempo distendido, mais calma e escuta e tudo foi muito veloz, que a passagem não alterou nada. Faltou tempo de exposição das imagens a se contraporem à velocidade da cidade e dos passantes.

Pergunto: o que é ocupação? E o que é intervenção? Serão a mesma coisa?Existem pontos aí a serem investigados. A ação pede mais tempo, mais exaustão, mais "tatuagens", sujeiras e restos no corpo da cidade?

O procedimento terminou e o rastro não ficou.

Nina deixou 14 marcas no espaço, foi a última a abandonar a ação e senti nela a densidade do trabalho, tinha uma presença diferenciada. Pude sentir a potência desta escrita.
Pergunto: será que a ação não pede mais riscos, espaços diferenciados e novas formas a se experimentar? Não estará já se fixando? Penso na destruição como forma de reconstrução.

João me revelou que se ateve ao olhar e reação dos passantes frente ao procedimento. E o que foi percebido? Como seu trabalho atinge o procedimento? Longe, perto, claro ou escondido? Mas que altera, não resta dúvida.

Ficam aqui meus rastos, restos, memórias e ficções dessas deambulações obscenas.
Cadê o risco, a margem e dúvida?
Esta minha escrita tem um pouco disso tudo e exponho assim minha pesquisa de espectador, mas necessito de diálogo, conflitos e questões. Senão corro o risco de ser um crítico e ter a última palavra.

Quem vai me questionar?

segunda-feira, setembro 21, 2009

Setembro, obscena no são Jerônimo.




O agrupamento de pesquisa Obscena, através de uma parceria com o Euler, que atualmente trabalha como professor do instituto São Jerônimo, viabilizou este contato entre o agrupamento e a instituição.
Fizemos alguns encontros com este professor do instituto São Jerônimo.
Levantamos questões que fossem pertinentes para estabelecer este dialogo e a partir daí fomos para as propostas individuais de cada pesquisador onde elaborou, uma forma pratica de dialogo com as internas do instituto.

Hoje é o segundo dia que vou ao São Jerônimo, tudo parece uma aventura,
conhecer novas pessoas, dialogar com elas e ver o que vai sendo possível de trocar.
A instituição esta toda bem cuida, limpa, paredes bem pintadas, na verdade a estrutura física é bem diferente do que eu imaginava.

Entramos e saímos em varias portas e sempre acompanhados pelos agentes de segurança, tudo me parece tranqüilo.

Lá de fora já se ouve a voz dessas garotas, tão novas mais já cheias de
“Cicatrizes, feridas....”

Depois de destrancar, abrir, fechar, passar por corredores, chegamos ao pátio, elas estão vestidas azul e branco, umas com calças azuis de moletom ou brim outras de bermuda.
Os cabelos esta bem cuidados a grande maioria com unhas feitas.

E alguma diz assim a Erica: “e aí doidinha, beleza?” e por aí, varias outras já começam também a cumprimentar, comigo que estava chegando ali pela primeira vez junto a elas recebo: olhares. Eu disse: oi, elas: oi beleza, você também mora no Floramar? Eu disse: não nós trabalhamos juntos.... ( referindo a Erica)

Este primeiro dia foi mesmo uma forma de aproximação, apenas para conhecer,
Criar algum vinculo.


Sábado 19 de setembro de 2009,



Adolescentes/Mulheres
Lembranças
Saudades dos filhos, da mãe.
Lembranças dos amigos



Mais um dia de trabalho no instituto São Jerônimo, Saulo, João e Lica são os Obscenicos presentes nesta tarde.
Chegamos com filmes, bastão, revistas, livros e uma vontade imensa de revelas.
Logo na entrada, já encontramos com algumas conhecidas, algumas lembro do nome, outras não, cumprimentamos, sorrimos e demos apertos de mão, como se estivéssemos selando algo de bom que estaria por vir.
E não foi diferente.

“Para conhecer um preso ou uma presa, basta ter contato com uma pessoa pobre que não teve garantidos proficuamente seus direitos econômicos, sociais e culturais e que, por este motivo, muitas vezes não conseguem exercer plenamente seus direitos civis e políticos. Lógico que não são todas as pessoas pobres que vão para prisão. Mas indivíduos com este perfil são vulneráveis a ingressar no sistema de segurança......
São os cidadãos considerados de segunda classe pelo Pode Publico...”.

Lica, sugeriu uma biblioteca ao ar livre e montamos, foi maravilhoso, com colcha de retalhos, livros, revistas e almofadas. Deitamos, sentamos e algumas preferiam ficar de pé rodeando a colcha de retalhos estendida ao chão.

Muitas não se misturavam, então preferiam pegar o que lhes interessavam e procuravam outro canto, pelo que percebi uma forma que elas encontram para tornar a convivência menos atrituosa.

Na colcha de retalhos tecemos prosas, trocamos experiência de vida, à medida que alguma via alguma imagem, uma fotografia nos livros, elas lembravam de uma época da sua vida e acabavam falando, desabafando, falamos também da gente, contamos casos, rimos, escutamos, algo de bom aconteceu ali.

O desejo de sair é latente, xxx reclama que sua cabeça esta doendo, yyyy chora no canto da quadra escorada no ombro da amiga.

O jogo com bastão:

Aconteceu de forma bem sutil, começamos com uma dupla, eu e ttttt jogamos bastão, estabelecemos uma confiança, chegando a ficarmos bem distantes e arremessamos o bastão sem medo. Depois João também entra no jogo, uma outra garota também chega.
Ficou mais animado, lançamos desafios, olhamos olho no olho estabelecemos uma regra: “quem errar sai” o desafio deu gás maior na parada, uma mistura de nervosismos e vontade de vencer ou não..... Talvez uma forma de ludibriar o tempo, que para elas ali parece passar tão lento, é o que elas dizem.....

O jogo de basquete:

João e eu aproximamos em momentos diferentes e juntos brincamos de um jogo: 21 com a bola de basquete que acontecia entre duas garotas, João lembra de um tempo que ele já foi esportista, compartilhou algumas técnicas e é verdade, funcionou mesmo.... Tanto para elas quanto para mim.

Os filmes:

Convidamos algumas garotas para assistir um curta metragem “Jardim das Cores” de Guilherme Reis, levei este filme que trata de um universo infantil propositalmente, para ver o que acontecia ali, pois sei que algumas delas são mães, assistimos, quando chegou ao final uma garota perguntou: “ não tem filme de tiro? Gosto de filme que fala de bagulho e tiro....” então passei um outro onde passava um pouco por este universo, elas gostaram mais, no final fizemos um rápido bati papo, onde cada um falou de suas impressões dos filmes exibidos.


È hora de ir embora, passo perto de hhhhh uma garota que estávamos conversando e ela de uma certa forma esta bastante envolvida nas atividades que estamos fazendo, ela me chamou para dançar um fank que estava tocando na radio , coincidentemente o mesmo do dia que a conheci.

Neste primeiro dia ela falou da sua vida.... hoje quando estávamos despedindo mais uma vez a mesma musica repeti, dançamos um pouco em uma roda , depois Lica chegou ... dançamos ...


“Prisão perpétua é a morte e eu volto sim
Você é a parte boa que existe em mim...”

Precisamos ir até mais....

“Pedindo de joelhos pra Deus me Proteger.
Na vida loka é assim parto pro tudo ou nada
Sem saber se volto, só tenho você por mim
Então não me abandona amor eu te imploro...”


e realmente, nosso tempo ali, naquele sábado, já estava esgotando...

“ até semana que vem..., até. Tchau.... até mais... ooooo lembra de trazer a musica é mc romeu...”


“ Hoje perdi meu bem eu rodei,
Mas troquei foi tiro a riviria
Armaram pra mim
Quem foi eu não sei
Me entrguei pra te rever um dia.


Hoje, fico por aqui.
Abraços,
S.S

sexta-feira, setembro 18, 2009

bonecas domesticadas




não, ontem não foi uma intervenção. não fizemos uma interrupção. não provocamos nenhuma ruptura. nem em nós mesmas. claro, podemos culpar o espaço. não havia fluxo de passantes, a praça da estação é uma praça que leva à contemplação... que leva à autorização.


evento tem que ser autorizado.


ordenado.


como dialogar com o espaço no qual nos propomos a interferir?


estávamos apresentáveis ontem. autorizadas. ordenadas. domesticadas.


sintomático todo o aparato da lei e da ordem presentes no local. todas as formas de dominação do poder. homens fardados. motos. máquinas. guindastes. tudo a serviço da ordem. e nós, sob o monumento em homenagem à ordem e ao deus pau. pai. domesticadas. pequenas. fêmeas.


penso que não pode existir mais uma definição a priori da forma de ocupação que não venha do diálogo direto com o espaço escolhido para a ação. penso que temos que, urgentemente, considerar o elemento "câmera/registro" em nossa ação. Como lidar com esta obsessão pela imagem que nossa imagem causa? como reverter isso em questão para o trabalho? devolver a imagem para as pessoas? hipertrofiar a presença das câmeras? questão presente na primeira experiência de baby dolls e que retorna, cada vez mais forte.


para alguns espaços, mais amplos, talvez o giz não seja a forma única, e mais eficiente, de escrita. quais os meios possíveis para a interferência escrita nos espaços? em espaços como esse? placas, avisos, faixas? cartazes? talvez eu também devesse ter um carrinho, com materiais escritos diversos. palavras recortadas. colagens.


ontem explorei a escrita contornando os corpos. e a palavra que se desdobra em outras. preciso fazer mais isso. ainda estou em estudo. ainda estou em processo.


precisamos novamente nos colocar em risco. sinto que a ação precisa mover-se. literalmente. pelo centro da cidade. pelas estações de metrô. pelos bairros e periferias.


mover-se e nos mover.


sim, proponho percursos pelas estações de metrô. cartografias para essas mulheres objetos.


carrinhos e sacolas carregadas. um elemento de estranhamento? um corpo/parte de corpo plastificada? como as embalagens, envoltas em filme plástico? um objeto estranho porque deslocado do seu habitat natural: a casa, a prateleira? erica a carregar vassouras, calcinhas na cabeça? lica a passear de noiva?


proponho a ação sem licença, nas travessias para o metrô, nas rampas de acesso. nessa arquitetura vazada.


a cada vez, os percursos se encontram numa mesma estação.


baby dolls, a qualquer hora, em qualquer bairro desta cidade.

quarta-feira, setembro 16, 2009

DEAMBULAÇÕES OBSCENAS- UMA NOVA PESQUISA

Trata-se de minha nova pesquisa dentro do agrupamento Obscena. Agora em 2009 fui um ativo participante e pesquisador-espectador de vários trabalhos dos artistas do agrupamento. Percebo que "deambulei" muito, isto é, caminhei e andei atrás, em torno, longe e perto, pelas variadas experimentações que aconteceram na cidade e pude ser atravessado pelos fluxos e refluxos dessas interrupções performativas. Principalmente o "BABY DOLLS" foi um território muito potente de novas questões e investigações. Daí muitas trocas, relatos e produção de novas perguntas.

Com as questões vivenciadas no e pelo Obscena tenho deambulado pela UFMG e mais precisamente em meu projeto de mestrado. Em variadas trocas com outros grupos artísticos e de pesquisa cênica tenho "raspado" muitos conceitos, dúvidas e inquietações. Enfim, no ato de deambular de lá para cá, em todos e vários sentidos, o Obscena se faz presente, se faz encontro, se faz lugar de produção de novas subjetividades e construção de relações coletivizadas.

Na deambulação se encontra o OUTRO, o diferente, o acaso, o risco e o obsceno. Nas palavras de LACAN : "IR ALÉM DA CENA, NÃO É VER MAIS, MAS SE TORNAR OBSCENO." Não temer ou se defender das multiplicidades ou acontecimentos que escapam da lógica do sentido, ou então, estão em outras lógicas com ou sem sentido. Há de se reiventar novas formas.

Duas deambulações me atravessam:
- as pesquisas do Obscena
- a intervenção artística com as jovens do São Jerônimo. Aqui recupero minha pesquisa anterior sobre o feminino e a escuta dele, no caso agora, através da juventude. Aqui se mesclam pensamentos artísticos, estéticos e meus estudos de psicanálise.

Meu desafio : como estar dentro e fora do agrupamento? Como ser um espectador-pesquisador?
O que fica de uma ação performativa na cidade? O que o Obscena faz hoje é performance, teatro ou é o quê? Como espectador posso interferir també? Enfim.....acho que é isso.

Eu também entendo que o transeunte da cidade quando se depara com uma ação do Obscena age e deambula de alguma forma. Deambula nas suas percepções e leituras do acontecimento. Deambulação física, mental, cultural etc. Abrir-se a outro tipo de experiência e contato. O mesmo se daria para quem faz a ação? Haveria então uma deambulação recíproca? Ou antes uma AFETAÇÃO ou AFECÇÃO?

Deambular de lá para cá, caminhar, criar movimentos, abalar certezas, interromper, incomodar,suportar o vazio e o não-saber, perguntar. Isso está presente nas pesquisas dos obscênicos?

AINDA QUE CONSERVADOR

DIA 15 DE SETEMBRO DE 2009. 18 HORAS. PALÁCIO DAS ARTES. ENTRADA ENTRE A RUA E O FOYER.PATRICIA CAMPOS, DIDI VILELA, MARCELO ROCCO. PROCEDIMENTO DESEJOS CLASSIFICÁVEIS. CLÓVIS ESTAVA LÁ. APENAS ELE DO OBSCENA. OBRIGADO CLÓVIS. NOSSA PROPOSTA ERA ENGAJAR O PROCEDIMENTO QUE FAZIAMOS SOBRE "CLASSIFICADOS", NA PROPOSTA DA ARTISTA PLÁSTICA FLÁVIA CRAVERO, QUE HAVAI FEITO UM LIVRO E UM DOCUMENTARIO SOBRE MULHERES DO INTERIOR DE MINAS QUE BORDAM SUAS VIDAS EM TOALHAS, BOLSAS, PANOS DE PRATO, ETC. ELAS ESCREVEM SEUS DESEJOS, SUAS ANGÚSTIAS NAS SUAS OBRAS:OS PANOS. FALAM SOBRE A CONDIÇÃO DE SER MULHER, ÀS QUAIS ASSOCIAMOS AO NOSSO PROCEDIMENTO:
DESEJO SER HOMEM
DESEJO CASAR
DESEJO TER FILHOS
DESEJO NÃO MENSTRUAR MAIS
DESEJO UM PRÍCIPE
DESEJO SER MAGRA
DESEJO AMAR INCONDICIONALMENTE
DESEJO SER MAIS BONITA
DESEJO FAZER FACULDADE E CASAR
DESEJO SER FELIZ
DESEJO TER BUMBUM MAIOR
DESEJO NÃO SER TRAÍDA
ACOPLAR AS IDÉIAS AO NOSSO PROCEDIMENTO DESVIAVA UM POUCO O NOSSO CURSO, MAS DESEJÁVAMOS EXPERIMENTAR, MESMO SABENDO QUE O PALÁCIO DAS ARTES DARIA UMA CATEGORIZAÇÃO DE ARTE AO NOSSO TRABALHO, OU SEJA, FICARIA MAIS CLARA A IDÉIA DE PERFORMANCE, MENOS DILUÍDO O LIMITE ENTRE O REAL E O FICCIONAL JÁ QUE ESTÁVAMOS EM UM LOCAL CATEGÓRICAMENTE TEATRAL.
COMEÇAMOS O TRABALHO. PATRICIA E DIDI DEITADOS. CARNES AO REDOR: MUXIBA, PELE, RESTOS DE VACA E GALINHA. COMO ESTÁVAMOS ACHANDO O NOSSO TRABALHO UM TANTO DIDÁTICO E VERBORRÁGICO, EXPERIMENTAMOS RETIRAR A FALA, APENAS GESTOS PARA UMA NOVA PROPOSIÇÃO. PRECEBI NESTE MOMENTO QUE A FALTA DE VERBO DEIXOU NOS ATORES UMA LEVEZA MAIOR, RETIROU A AGRESSIVIDADE QUE BUSCÁVAMOS EM NOSSO DISCURSO. MAS AS IMAGENS ERAM CRIADAS. OS TEXTOS NO CHÃO ERAM O COMBUSTIVEL DAS CONSTRUÇÕES: DORA: HOJE SOU DOR. MARIA: BEBE, COME, PROCRIA. E DESEJOS. CARLOS: DE NOITE CARLA. JÁ TINHAMOS O NOSSO DISCURSO E NÃO PODÍAMOS NOS DESPRENDER TOTALMENTE, ENTÃO TRABALHAMOS TAMBÉM OS TRANGÊNEROS: DIDI TROUXE OS DESEJOS DELE, SOBRE MASCULINIDADE, SOBRE O QUE É SER MACHO. ENTRE AS IMAGENS FORMADAS, CONSTRUÍMOS:
-A TENTATIVA DE SER MAGRA, BELA, PRINCESA;
-O CORPO EXPOSTO COMO CARNE;
-AS POSIÇÕES FEMININAAS SEXUAIS DO UNIVERSO MACHISTA;
-OS DESEJOS DO CORPO;
- A ANIMALIZAÇÃO DAS PESSOAS;
-A COISIFICAÇÃO DAS RELAÇÕES;
DIDI E PATRICIA SE ANIMALIZARAM SE MISTURAVAM À CARNE, SE TRANSFORAMVAM EM COBRAS, PIRANHAS, GALINHAS.COMIAM RAÇÃO. SAIAM, DEIXANDO OS RESTOS DE CARNE E ESCRITOS PARA TRÁS. TRABALHARAM OS TEXTOS CONSTRUINDO IMAGENS SOBRE O FEMININO E SOBRE OS CORPOS. EM UMA MISTURA DE SERES HUMANOS COISIFICADOS.

terça-feira, setembro 15, 2009

cadê o salto no escuro?

sim, um tempo de muita ação. empenhadas no fazer, carregadas de compromisso, nós mulheres nos lançamos à aventura de fazer correr baby dolls...

da última interferência realizada em belo horizonte, em 05 de junho de 2009, à próxima, a ser realizada no próximo dia 17, na praça da estação, muitas coisas aconteceram.

estivemos em ouro preto e em mariana, palco histórico de uma cultura católica e machista. novamente as meninas interagiram completamente com a boneca joyce, negra que que se transmuta em loira boneca rosa (como já tinham feito na praça sete, no dia 05). elas brincam com ela com brincariam com suas bonecas. e brincam com seus corpos como se também fossem, elas mesmas, bonecas. bonecas em série. a poderosa imagem de erica dona de casa santa santo orixá ganhou beleza especial no altar da praça tiradentes. mas lá quase (quase?) resvalamos em espetáculo, perdendo a dialética necessária à construção do estranhamento que queremos. fomos simpáticas. desejadas. amadas. faltou o nó amargo. de minha parte, me pergunto: será que tenho sido muito condescendente em meus escritos a giz no chão? como lidar com as meninas sem perder a potência da ação? o que escrever em seus corpos de criança marcados no chão? como relacionar estes corpos aos outros corpos de mulheres mortas?

em seguida, fomos para o festival de são josé do rio preto, onde iríamos enfrentar o não lugar, bar do festival. como fazer tal ação naquele espaço de diversão? como não sermos engolidas? a experiência foi exaustiva, confesso. não foi fácil segurar aquele espaço. mas acho que conseguimos, mesmo assim, garantir um mínimo de atrito para o incômodo necessário às mulheres dondocas burguesas, fabricadas sob medida para o mercado da buceta, para a caça de todo dia. estas têm um "plus a mais": consomem cultura.

no dia seguinte, fizemos em uma praça, no centro comercial da cidade. primeiro sinal de uma percepção que a mip2, em agosto, veio a fortalecer: de que uma platéia constituída como tal altera o sentido da ação. como quebrar com as expectativas de um público já instruído? como garantir o estranhamento da ação em diálogo com esta espetacularização da forma? como romper com este lugar? o que é necessário para garantir a eficácia da ação? como garantir a processualidade desta construção e a manutenção dos espaços de experimentação e risco?

essas questões ainda estão latentes em todas nós, ou, pelo menos, em mim. baby dolls precisa novamente saltar no escuro. ou, pelo menos, eu preciso.

terça-feira, setembro 01, 2009

Inquietações Obscênicas...

Um tempo de silêncio e muita ação.
Entre julho e agosto levamos a intervenção urbana ‘Baby Dolls – uma exposição de bonecas’ ao Festival de Ouro Preto e Mariana, ao FIT - São José do Rio Preto e à MIP2 – manifestação internacional de performance. Clóvis esteve no 1º Festival de Performance de BH com o trabalho ‘corpoalíngua 4x4’ e Joyce com ‘Promoção do dia: entre sem bater e suba na vida’.
Participar destes eventos colocou-nos diversas questões e a que me move agora é a relação entre o ato performativo e a formação do indivíduo. Será a ação interventiva ou performativa também potente na construção da cidadania? Como a ação performativa pode realmente interferir no presente construindo brechas e espaços para a geração de identidades autônomas? E por que tal inquietação se dá em mim? Creio que muito devido à mudança de eixo que impus a minha trajetória profissional, pessoal e intelectual. É na crise e no caos que surgem as potências e como não há lugar para mim que não este optei por ser uma ‘facilitadora’ do projeto PRO JOVEM (FMC e Secretaria Municipal Adjunta de Assistência Social) que atua junto a coletivos de adolescentes de famílias cadastradas no Programa Bolsa Família (Governo Federal) e também pelo trabalho com jovens adolescentes do Centro Reeducacional São Jerônimo, destinado a meninas entre 13 e 18 anos que infringiram a lei. Um trabalho totalmente novo e no qual terei de me reinventar, pois não sou nem de longe uma arte educadora.
Percebo que há um reajuste no foco do meu trabalho, passei o ano de 2008 direcionando minha pesquisa junto ao OBSCENA partindo de questões pessoais. Estas motivaram meu caminho em busca dos elementos e ferramentas da educação destinada às mulheres. Minhas limitações, frustrações e necessidades me impulsionaram ao entendimento daquilo que se caracteriza como o gênero ‘feminino’. A gama de instrumentos para a composição deste encontra-se desde o nome do bebê até os tabus destinados à população feminina. Através dos ‘procedimentos cênicos’ – no OBSCENA utilizamos este termo para designar ações individuais e/ou grupais que efetivamos ao longo de 2008 – e da aglutinação destes compus a imagem ação ‘Santadonadecasa’. Uma intervenção urbana que não compartilha da simpatia do público feminino. Isto devido à exposição de utensílios domésticos? Ou devido à imagem estagnada da mulher que carrega em sua boca seu molde? Ou será que em tempos de Mulheres Melancia, Jaca, Melão e Abacaxi é difícil encontrar reflexo nesta que se apresenta tão coberta em panos? Ao longo de nossas exposições – ‘Baby Dolls – uma exposição de bonecas’ fruto da fricção das pesquisas da dramaturga Nina Caetano e das atrizes Erica Vilhena, Joyce Malte e Lissandra Guimarães - em alguns cantos do centro urbano de BH – Pça da Savassi, Pça 7, Pça da Estação – observei a curiosidade das adolescentes, a irritabilidade das jovens acima dos 20 anos e a indignação das senhoras. Será este fato a constatação do acirramento dos códigos sociais destinados à mulher e à sua submissão à sociedade paternalista e capitalista?
Bom, uma vez que as adolescentes se mostraram mais instigadas pelo trabalho, por que não ir até elas e averiguar o quão afetadas estão por esta ordem social? Creio que por isto cheguei aos trabalhos aos quais me dedico agora neste segundo semestre. Desejo encontrar-me com estes jovens adolescentes e instigá-los. É necessário agir sobre eles com imagens e ações diversas às incutidas pela cultura de massa. É necessário criar junto a eles brechas para suas expressões. Assim retorno a Artaud (1896-1948), as bases precisam ser revistas e revisitadas, é necessário re-compreender a cultura

“Nunca como neste momento, quando é a própria vida que se vai, se falou tanto em civilização e cultura. E há um estranho paralelismo entre esse esboroamento generalizado da vida que está na base da desmoralização atual e a preocupação com uma cultura que nunca coincidiu com a vida e que é feita para reger a vida.”

Os coletivos de adolescentes encontram-se em áreas de risco social. Eles moram na área limítrofe da guerra civil que enfrentamos no Brasil há anos. O tráfico, os assassinatos pelas mãos da polícia ou pela própria justiça do local, este é o cotidiano. As jovens do São Jerônimo já ultrapassaram a linha tênue entre o risco social e a criminalidade. Um fator comunizante é a ausência da figura paterna, a mãe é santificada e sobrecarregada por toda a responsabilidade sobre a família. O acesso aos bens de consumo é significativamente restrito e da cultura não é diferente. Mas, eles têm fome, querem pertencer, querem também inscrever sua história na história da cidade.
Tento aqui e agora traçar um paralelo entres as duas realidades que apresentam: jovens em livre processo de formação e criação de suas expressões e jovens reclusas e em progressiva estagnação do processo de formação e criação de suas expressões. Os adolescentes dos coletivos mesmo com sérias dificuldades na aquisição de bens culturais estão amparados por um aparelho governamental que se esforça em mantê-los ‘ocupados e afastados’ da criminalidade; as jovens do São Jerônimo romperam a barreira do socialmente aceitável e encontram-se reclusas num aparelho governamental destinado às suas reinserções no convívio social. A força criativa dos primeiros ainda não foi subvertida pelas drogas, tráfico e homicídios; já nas jovens reclusas esta força encontra-se totalmente calcada na justiça do ‘olho por olho, dente por dente’, a agressividade é a arma empunhada dentro da instituição, o corpo é uma armadura e a voz expressa em monossílabas e grunhidos. Mas, é justamente aí, nesta armadura que se expressa suas potências. Agora o desafio é transformar este corpo institucionalizado em corpo autônomo. Mas como? Ainda não tenho respostas, somente inquietações.
Os jovens dos coletivos responderam muito positivamente às dinâmicas propostas. Cada um guarda suas singularidades, como dizia minha mãe: ‘_ um tem que empurrar e o outro segurar’; expansão e contenção são as ações que terei de empreender em cada.




O ato performático como ação cidadã – utilizando exercícios teatrais para a construção do indivíduo (Esta prática desenvolvo junto aos coletivos de adolescentes, por hora vou abordar somente esta frente de trabalho uma vez que o trabalho com as jovens do São Jerônimo está ainda na construção duma confiança mútua)

E é este viés que tenho utilizado para impulsionar os jovens dos coletivos para um exercício de autoconhecimento e reconhecimento de sua situação/localização sócio cultural e assim estimular a criação e desenvolvimento de ações que permitam burlar a ordem geral da sociedade, que visa estratificar as camadas sociais e estagnar o indivíduo em seu processo de autonomização. Para tanto exercícios de narrativas acerca de si mesmo e da sua vida cotidiana são a matéria prima para geração de questões fundamentais para nossa formação como cidadãos – Quem sou eu? Onde estou? O que faço? Eles têm muita energia e é preciso incentivá-los a gastá-la, ou melhor, aplicá-la diariamente na busca do próprio caminho. Ir em busca daquilo que eles não têm em suas comunidades e tomar posse de suas auto expressões. Creio que este exercício é uma ferramenta na luta contra esta dita ‘cultura’ que Artaud suscita, a Indústria Cultural. Como os próprios jovens disseram: ‘_ a Favela tem cultura também, aqui a gente também faz nossa história!’ e é atrás disto que estou: do que é pertinente a eles, às suas famílias, à suas comunidades. Desejo insuflar os seus desejos de compartilhar com jovens de outras regiões e assim formarmos uma rede de agentes que estão inseridos na sociedade de consumo e que fazem uso de suas arestas para gerar meios e possibilidades de ações efetivas para si.
Estes dias ganhei do pesquisador Clóvis o livro ‘Culturas juvenis – múltiplos olhares’ de Afrânio M. Catani e Renato de S. Porto Gilioli. Já no primeiro capítulo ‘Faces do consumo cultural’(pág.19) me deparo com a seguinte questão

“(...) Ainda que o consumo cultural construa uma imagem positivada da juventude, a diversidade de condições sociais e econômicas nem sempre permite que os jovens possam vivenciar as idealizações de que são objeto. A indústria cultural contribui de forma decisiva para uma série de exclusões e diferenciações entre as múltiplas condições juvenis.”

e mais,

“(...) A juventude é ... tanto ... um mito fabricado por um ramo industrial específico da sociedade capitalista, o da Indústria Cultural, quanto um consumidor cultural a ser domesticado (D. Helder Câmara).”

As observações acima trazem luz ao exercício que propus no primeiro dia de trabalho junto ao Coletivo Vista do Sol (12/08/2009). Pedi a eles que criassem um cartaz com o título – ‘Quem sou eu?’ como material de composição cedi revistas, canetas coloridas e papel branco. A maior parte utilizou imagens que não têm correspondência com a realidade sócio econômica deles, e o mais agravante, as meninas têm as composições mais deturpadas pelas imagens midiáticas dos corpos femininos e os acessórios e modos de agir pertinentes a este gênero. Um modelo aí se reafirma.
Não repeti este exercício com os jovens do Coletivo Arthur de Sá (27/08/2009). A partir da colocação de um dos jovens quanto a expectativa me relação ao projeto, este jovem perguntou-nos se iríamos trabalhar com a cultura afro brasileira, então perguntamos o que era isso para ele _ uai, são nossos ancestrais... Logo, propus que cada um contasse sua história, compreendendo-nos como descendentes de alguém, que também descendeu de outrem... E que principalmente localizassem suas histórias nos locais onde já moraram e moram. Alguns souberam compor bem seu quadro histórico, outros tinham a narrativa mais fragmentada. Este coletivo, talvez por ter um Educador, Ricardo, com um perfil mais assertivo, também se coloca de forma mais contundente que o primeiro citado. Mostrei a eles duas fotografias de Cláudio Versiani – ‘Projeção’. A primeira imagem mostrada é de uma multidão de crianças negras, provavelmente africanas e a segunda é duma arquitetura super higth tech. Pedi que cada um dissesse, ao admirar a foto, uma palavra que resumisse a imagem. Depois traçamos um paralelo entre ambas. O resultado foi estimulante, eles são muito agitados, mas creio que consegui transpor esta energia para o trabalho.
Enfim, estou caminhando.