agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

terça-feira, junho 29, 2010

Performações ou Deformações?

Foi simplesmente fantástica a tarde de sábado, quando trabalhamos nas ruas da cidade e performamos na Praça da Estação. O encontro com o Zona de Interferência ( que propôs o evento), mais o Maurício e o Paulo, foi muito provocador e abrimos possibilidades de diálogos muito interessantes.

A mediação de Denise Pedrón foi muito pontual, principalmente ao destacar a impossibilidade de se definir ou explicar o que é performance. Um lugar de fazer, experimentar, se um conceito, este sempre impreciso, impuro, poroso e transitório.

Experimentamos o trabalho das filas : FILAS PARA O NADA. Percebi que é uma experimentação que precisa de mais tempo, um lugar bem planejado ( como foi o de Joyce: de frente para uma faixa de pedestre), alguns corpos e um certo "estado" corporal, uma composição talvez mais tensa, mais impaciente, enfim, há várias possibilidades de se colocar um "corpo em fila". Diga-se de passagem, um treino diário de muitos de nós, dizem, que o Brasil é o campeão de filas do mundo. Há duas que são as fundamentais: fila para procurar emprego e fila para ir aos estádios de futebol.

Quanto ao tema do evento, falei das ações obscenas não somente nos espaços abertos e públicos da cidade, mas em outros espaços, os "invisíveis", como o prostíbulo, as portas dos hospitais e o Centro de Reeducação Social. Corpos no anonimato, negados e vigiados, espaços mais fechados, controle e disciplina.
Que arte é esta que se propõe a conviver? Será arte ou outra coisa?

Criar espaços e tempos de convivência para se estar com o outro, que ação será esta?
Então as performações atuam de forma a provocar uma ameaça aos comportamentos estabelecidos e padronizados, deformando-os.
Fica a pergunta: tratam-se de performações ou deformações no cotidiano da cidade?

performando no performações


Os espaços esvaziados da vida pública nossa de cada dia nos informam de quê? O que temos feito de nossas vidas, com nossas vidas nesse vai-e-vem entre espaços privatizados, fechados, impermeáveis às diferenças? Como a arte tem agido/reagido a tudo isso? Afinal, já há muito que a arte saiu dos museus. Ou não? Será que temos conseguido fazer uma arte pública, política, urbana?
Qual o lugar da performance na relação entre espaços privatizados e as ações de corpos que resistem, no exercício de sua existência política?

Essas foram algumas das provocações lançadas pelo coletivo Zona de Interferência para o encontro Performações (proposto por eles como contrapartida da residência, dentro do projeto Cenário do CCUFMG): reunião de artistas/performers para discutir performance e ocupação de espaços públicos. Estavam presentes, além do Zona, nós do obscena, Maurício Leonard e Paulo Nazareth.
A discussão, que aconteceu de seis às nove da noite do sábado dia 26 de junho, foi muito interessante e profícua. Mediada por Denise Pedron, que iniciou pontuando algumas questões sobre o conceito de performance, tivemos a apresentação do trabalho, em vídeo, do Maurício e a discussão da experiência vivenciada por Paulo, ao sair caminhando pelas ruas da cidade com um peixe na boca. O obscena apresentou seu trabalho e discutiu um pouco sobre algumas ações performativas que, de quatro às seis, realizamos, nas imediações do Centro Cultural da UFMG:
1. Reperformando Moacir ou ovacione seu país. Reconvocando uma ação de interrupção – que tinha como mote a discussão sobre as possibilidades políticas da cena contemporânea (Lehmann) – proposta pelo pesquisador Moacir Prudêncio nos inícios dos trabalhos do Obscena, essa intervenção consistiu em pregar bandeiras do Brasil que continham, em seu amarelo gema, a inscrição: “ovacione seu país” e colocar abaixo da bandeira uma caixinha com ovos crus. Realizamos eu e Saulo, nas imediações da arena de comemorações da copa (inclusive em um poste na entrada da arena), em “homenagem” ao nosso país, à seleção brasileira e ao prefeito Márcio Lacerda.
2. Filas para o nada ou Fila de artistas aguarda liberação para utilização da praça pelo povo sem pagar aluguel. Proposta por Clóvis – instigado pelas provocações do Zona – para pensar a conformação dos corpos, as filas para o nada propõe a construção de filas que não sirvam a um fim: pegar o ônibus, pagar as contas, comprar ingresso. Realizada em frente à arena de comemoração da copa (espaço proposto por Joyce, ao iniciar a fila com seu casaco amarelo gema), no local de atravessar a rua, atrapalhou o trânsito e causou ruídos.
3. Mulher painel ou mulher não é bola de futebol. Continuação da investigação que Lica e eu realizamos, a mulher painel junta um experimento anterior, testado na praça sete em dia de Marcha Mundial das Mulheres ao desejo de experimentar um novo material em minhas ações: o plástico (ai, Ricardo Carvalho, muito obrigada pela dissertação de mestrado sobre a educação de meninas e o modelo Barbie que você me enviou!!!). O experimento consiste em cobrir o corpo de uma mulher com notícias de jornal, propagandas, fotos de revistas, relacionando estatísticas e dados da violência contra a mulher, à exposição corporal excessiva, imposta pela mídia, à reprodução de clichês corporais e imagens do feminino. Com a aquisição do plástico, ganhamos em dinâmica e em “plasticidade”: conseguimos criar formas, quase uma roupa, a partir dos jornais: com um cone na cabeça, uma saia jornal e peitos de silicone-papel, Lissandra parecia um ser de outro mundo, algo entre o humano e o neutro, o vazio. Muito interessante o que ela conseguiu provocar ao se postar em frente ao telão que passava o jogo EUAxGANA, ao circular pela arena, ao se postar ao lado das bandeiras de ovacione. As formas corporais que criava, ao se colocar disponível à leitura, como um verdadeiro painel.
Em tempo: selecionei, para o painel, algumas especiais da copa: as mulheres bombadas do imperador Adriano (que, de vez em quando, confunde algumas com uma bola e bate nelas pra ver se obedecem, no que é defendido pelo goleiro Bruno, aquele que espanca prostitutas e que agora é suspeito de assassinar a mãe de seu filho), notícias do assassinato (também por um jogador de futebol, seu ex-marido) de ana cláudia com 14 facadas e claro, a memorável frase do nosso querido convocado para a seleção 2010, felipe mello: bola boa é igual mulher de malandro, a gente bate e ela obedece (diferente da jabulani, que parece uma patricinha: não gosta de apanhar...)
Em tempo: duas meninas (entre 7 e 9 anos, circulavam absolutamente sozinhas pela praça), ao me verem colocar mais uma notícia nela e enrolar seus braços com filme plástico ficaram doidinhas. Uma me pediu para que eu a vestisse assim também, com a roupa de papel, os braços de plástico. Na menina, não tive coragem (nem vontade) de pregar nenhum dos materiais que eu trazia, a não ser as tarjetas escritas com “URGENTE” (que espalhei por todo o seu corpo) e uma bandeira do Brasil (que ela solicitou) e que preguei em seu ventre. Acredito que elas queriam acompanhar a mulher painel, mas acabaram circulando um pouco comigo e se integrando à fila.
Depois pegaram alguns ovos e criaram um jogo constante de perigo para a performer: constantemente sob a ameaça de ser ela, e não a bandeira, ovacionada.