agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quinta-feira, maio 28, 2015

Festa ambulante e “deseos obscênicos”: encontros na cidade

Preparativos- Aquecimentos- Agenciamentos

O desejo de encontrar e trocar experiências com o coletivo artístico toda deseo. Surge a possibilidade de um festar na e pela cidade. Primeiras conversas: circular com um corpofesta e instaurar pequenas e temporárias festividades em locais de passagem e de aglomeração. Nomadismo noturno. Derivações espaciais. Ambiências festivas. Estados de festa. Acontecimentos e acometimentos alegres. Diversidades e encontros. Festa como ação gratuita que surge pela força dos acasos. Festa que pede participação. Segunda conversa: Corpos festeiros. Baderna, algazarra, comemoração. Carnavalizar. Criar situações. Risco, arriscar presenças. Desejos. Festa no ônibus? Mapas? Festa marcada ou invasão de corpos festivos? Uma TAZ (Hakim Bey)? Uma fechação? Os situacionistas estão chegando...



Minha cartografia afetiva- atletiva:
Uma escrita infestada começa aqui. Jogo perfográfico. Mapa sensitivo: o que ficou “dançando” em meu corpo. Memórias. Presenças. ConversAÇÕES.

Primeira parada: Bar da Cledir. “Tá rolando bafo puro!” Cerveja, alegria, paquera, corpos carnavalescos e muita excitação. Interação com a rua. O passeio do bar “infestado”. Chega Bárbara (uma moradora de rua que é trans) e a partir dos figurinos das personas começa a identificar as novelas da Rede Globo. Plim, plim! A gente causa... Point da concentração, esquentando os tamborins, tamancos, tamanhos, talentos. E mais cerveja. Um brinde! Levantem os copos. Levante de corpos. Um brinde? Não blinde nossos corpos. Vai ou não vai? Qual bus a gente entra? Qual bonde a gente forma? Vamos dar uma pinta, um rolé nos bares do Maletta?




Sim.

Lá vem a gaiola das loucas, dos loucos, dos alterados, vagabundos. Vagabundear como política dos afetos. Vaga, vagamos... vaga bunda, vago mundo, vaga noite. Vaga. Tem vaga, tem espaço, pode chegar.... vaga livre. Vagalumes, mariposas, risos, bebida, luminosidades... Pisca, pisca, pesca atenções, pesca movimento. Pisca vida! Pisca, pisca. Pica, picada na noite que só começa!

Segunda parada: Bar do Olympio no Maletta. “Luz na passarela, chegaram elas”. Somos foco, festa, fetiche, fichas, bichas, fechação...  Uma boate se inaugura. Festa dançante, noite generosa, música boa. Flashes, flechas, gentes que chegam e dançam coletivamente. Coreografia toda deseo, corpos inflamados, show gratuito, o público vibra... Festa, foco, somos fuleiros. Performance é fuleiragem (Medeiros, Bia). Contágio, peste, alegria como revolução e revolta. Re-voltam-se os corpos montados, pintados, pintudos, tesudos, carne viva! Fogueira, noite feiticeira. Os seguranças não sabem se nos contém ou se nos convém. VEM! Vem, vem, vem... Paisagem festiva. Chega Davi e seu violão.

- Vamos circular, gente? Tem mais lugares prá gente festejar. Despedida. Despe a dita. Despe esse calor, esse furor, esse desejo de festejar e abraçar a noite.

Terceira parada: Esquina da Rua da Bahia. “Serenata da piroca”. Foi na encruzilhada com a Guajajaras. Momento único. Carrinho de pipoca e canção dedicada a duas trabalhadoras e irmãs: Maria e Isabel. Pipoca, piroca, paçoca, oca. Casa do encontro. E elas se jogam, dançam com a gente, frisson, delícia, um pouquinho de loucura no trabalho, um pouquinho de descanso na loucura. Piroca. Pipoca. Salve Obaluaê! Cura a cidade dessa doença de tristeza, medo e silêncio. Senhor da Saúde dá-nos rebeldia, anarquia, alegria! Encruza, entrecruzam corpos nômades, chegam pessoas, mais festa que se esvai para a faixa de pedestre que se transforma em faixa musical, corporal, libidinal. Dança, gira, roda, ritualiza corpos e carnes. E atravessamos atravessados através do sinal vermelho de perigo, pestigo, peste, desejo... a festa está faminta, quer devorar mais gente. Comidos caminhamos para comer mais espíritos vagabundeantes.

Quarta parada: Café e bar. “Baile da Geni”. Espírito qual é o teu nome? Legião, re-ligião do amor e da alegria. Rodrigo Ferrari pega o violão e lá vem Chico Buarque prá gente reverenciar a Geni e jogar pedra na calmaria da vida. Um baile se forma: dança, rodopio, arrepio, assovio, teatro, te mato, te-ato, te cato, pura epifania... Somos corpo coletivo. Abocanhamos o espaço, mordidas, lambidas, a noite geme agradecida. Fogo, pavio curto, pólvora, incêndios poéticos. Alguma coisa acontece, alguma coisa entontece, festece, tece fios finos fibras, findos estados de prazer. VAMOS SUBIR GENTE? Força no “edí” (cú) e canta prá subir!

Quinta parada: Café Cultura. “Carnaval de Rua”. Já estamos excessivos, excessórios, exceções na ordem pública. Funk, fode, senta, e quem aguenta? De repente um novo bloco de corpos festivos vem chegando e eis um encontro mágico: beco das misericórdias. Corpos inflamados, quem sobe, quem desce, abraços, beijos, trocas, gritos, bando de indígenas devoradores, o tempo cotidiano coitado suspenso.... euforia, eu-folia, manifesta-ação, quem combinou esse momento? Esse corredor? Corre dor, corre normatividade, corre tempo cronológico... abençoados, abensonhados, protegidos pelo deus acaso, uma multidão alegre pára o trânsito, bloqueia qualquer passagem prá pedir passagem pra vida circular sem vergonha e comemorar sua trepada com o inexplicável. Instantes que ultrapassam meu existir. Bloco se desfaz e se refaz, o tempo jaz, a festa leva e traz.




Sexta parada: Igreja de Lourdes. “Performance bandida: ajoelhados e sem pecados”. O trânsito engarrafado, lento e os corpos soltos livres e velozes. Vorazes. Engarrafados com conhaque, agarrados ao espaço aberto e diante do sagrado ajoelhamos para ironizar a instituição do Pecado. Quanto custa o teu pecado? Pecado não existe.... ou se existe é não viver teu desejo, tua obscenidade, teu bailado e ficar ajoelhado esperando esse Deus que na verdade já dança nas ruas, nos corpos anônimos, nos sinais abertos, não fechados.... O tráfego de carros tão devagar, e nós na velocidade dos beijos, carícias, comemorando sei lá o quê, fazendo festa, fresta, fricote, frevo com essa noite que não cansa de gozar e a gente faz amor prá mais amar... O tráfego de carros tão devagar e nele o tráfico de corpos escravos: contidos, contenções, sentados, cansados, com tensões, “vem prá cá, tesões!”- convida a dama da noite. Rumo a praça da Liberdade? Mas a cada parada uma praça da liberdade e da libertinagem a gente cria!




A gente quer andar mais!

 Ambulantes, ambulância prá socorrer o mal estar de uma cidade estratificada, privatizada, mas “Paradise is now”, baby! E a festa ambulante segue e eu sigo outra festa, outras paragens e volto prá casa festejando essa saúde que não cessa, essa fome que não passa, esse cansaço que não cansa, essa alegria que não dorme, esse descontrole que protege, essa faísca-festa de vida que me engole, co-move, movência, mamulência, molecagem, festa brasileira, tupi-guarani, conga, puta, mestiça, festa madame, festa-enxame.



Que o céu da cidade nos proteja, festa benfazeja!

(Imagens de Lissandra Guimarães).