agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quinta-feira, agosto 19, 2010

NEM TÃO BONECAS: CARTA OBSCENA


CARTA ABERTA À POPULAÇÃO DE BH E A TODOS OS INTERESSADOS
Queremos não só relatar o amadorismo, o desrespeito e a ignorância que marcaram a 10ª edição do FIT-BH – do qual participamos com um dos trabalhos locais selecionados em edital público – mas também exigir a discussão da política cultural de privatização de espaços públicos, mercantilização e consumo da arte implementada pela gestão de Márcio Lacerda, a qual encontra reflexo no modo de organização desenvolvido pelo Festival Internacional de Teatro deste ano. Para isso, vamos fazer uma rápida recapitulação dos eventos que compuseram a “novela” FIT.
Apesar desse importante festival ter sua realização garantida por lei e contar com dotação orçamentária e previsão bienal, em março desse ano – a cinco meses do FIT acontecer e em pleno processo de seleção dos grupos locais – a Fundação Municipal de Cultura anuncia seu cancelamento, alegando desde falta de verba até escassez de bons espetáculos para compor a grade. Diante da reação da classe artística, a FMC volta atrás em sua decisão – sendo o retorno tão autoritário, arbitrário e leviano quanto o cancelamento, pois não há diálogo nem consulta à população, ou justificativa real em relação às decisões. No mesmo dia do anúncio de Thaís Pimentel, presidente da FMC, demitem-se os curadores do evento, Richard Santana e Eid Ribeiro e, em seguida, o coordenador geral, Carlos Rocha. No dia 12 de abril, ela anuncia o novo modelo de gestão do FIT: a coordenação será assumida pelo corpo de diretores da Fundação, o que permite o alinhamento da “coordenação às diretrizes institucionais da FMC”.
Com nossa intervenção urbana selecionada a integrar a programação (resultado publicado em abril), aguardamos a comunicação da FMC para podermos, como em todo festival do qual já participamos com Baby Dolls, negociar as condições de apresentação. No dia 10 de junho, preocupados porque não havíamos recebido ainda nenhuma comunicação, entramos em contato com o secretário da comissão de seleção, André Ferraz, para iniciarmos as negociações e recebemos como retorno um breve email da coordenação do FIT avisando que seríamos comunicados em breve das datas, horários e locais de apresentação.
Temerosos com a pouca comunicação e dispostos a garantir a realização da intervenção em suas especificidades artísticas, dirigimos um email no qual explicávamos claramente as condições de realização de nosso trabalho. Ficamos aguardando e não obtivemos retorno. Após insistência, obtivemos resposta de que não seria possível integrarmos a programação descentralizada do Festival e enviamos, então, nova proposta, centralizando a nossa ação em uma ocupação das estações de metrô.
Nesse mesmo email, reiteramos as condições levantadas por nós desde nossa primeira comunicação: a impossibilidade de existir um aparato de divulgação nos locais de intervenção e a solicitação para que não fosse divulgado o horário em que ocorreriam as ações. Fomos informados de que nossa proposta tinha sido repassada ao coordenador Rodrigo Barroso e que ele entraria em contato para resolver as pendências. No dia 5 de julho, ainda sem retorno algum, recebemos da produtora Ana Jardim uma solicitação de rider técnico.
Novamente preocupados com a falta de comunicação do FIT e com o silêncio em relação às nossas questões, apelamos para as redes sociais e no dia 11 de julho postamos uma mensagem no Facebook de Rodrigo Barroso, solicitando uma reunião pessoal para definir nossa participação no Festival. No mesmo dia, ele retornou, também pelo Facebook, com garantias de admiração e respeito pelo nosso trabalho, mas ainda com informações gerais, da mesma ordem das recebidas anteriormente. Ou seja, a negociação não avançava.
Cientes da urgência de solucionarmos os termos do contrato de modo claro e transparente, fizemos contato telefônico com Barroso, fechando então as estações de metrô Minas Shopping (proposta mantida por ele) e Vilarinho (sugestão nossa), além das imediações do terminal rodoviário. Nesse contato telefônico, novamente colocamos nossas condições e, em relação à divulgação, ficou ACORDADO que não haveria, nos locais de realização das intervenções, NENHUMA FORMA DE DIVULGAÇÃO do FIT ou da ação em si: banners, spots etc. Em relação ao horário, Barroso informou da necessidade de oferecer ao público as informações, mas ficou de estudar uma alternativa – a colocação na grade do período de ocorrência das ações (fim da tarde, horário de almoço) – para a qual nos daria retorno. No dia 12 de julho, mais de um mês depois de nosso primeiro contato e sem que tivéssemos obtido, de fato, uma resposta satisfatória da FMC, recebemos outra comunicação sumária, já definindo os horários de apresentação e, em seguida, a carta de oficialização de nossa participação no FIT, assinada por Barroso.
Na primeira semana de agosto, fizemos uma visita técnica aos locais de realização da intervenção e, já no primeiro local visitado, a Estação de Metrô Vilarinho, fomos informados de que o FIT não havia enviado notificação de qualquer atividade no local, mesma informação obtida mais à frente, na Estação Minas Shopping. Somente o terminal rodoviário tinha sido comunicado de nossa atividade e somente nele tínhamos sala de apoio. Nessa visita, nosso produtor negociou diretamente com o metrô a liberação das catracas e pontos de apoio, necessidades que a produção do FIT havia afirmado não ter conseguido resolver, tendo nos informado que teríamos de arcar com os tickets necessários à realização da intervenção. Enviamos no dia seguinte um email a Ana Jardim, informando-a das nossas conversas e das negociações firmadas pelo nosso produtor, além do plano de desenvolvimento da ação.
No dia 10 de agosto, demos início às nossas intervenções e já nos deparamos com o descaso e a má vontade da equipe de produção que, sem entendimento do trabalho, pressionou o encaminhamento da intervenção para o local onde, pasmem! estava todo aparato de evento que, segundo o ACORDO FIRMADO COM RODRIGO BARROSO, precisamente NÃO DEVERIA ESTAR LÁ: banner, controle de público e presença de pesquisador/entrevistador durante a realização da intervenção. Questionado sobre a presença do banner, o produtor respondeu: “se não gostam de divulgação, porque estão em um festival?”
Nesse momento tivemos a real dimensão do quão despreparadas estavam as pessoas que assumiram nossa produção. Ao longo da intervenção, fomos insistentemente abordados pela coordenação do metrô, pois a ORGANIZAÇÃO DO FIT AINDA NÃO HAVIA COMUNICADO A REALIZAÇÃO DO EVENTO AO METRÔ. Insistentemente tentamos que os produtores presentes assumissem o controle e resolução da situação, mas isso não ocorreu. Eles apenas assistiam nosso produtor se esmerar para permitir que nossa ação se realizasse assim como havia saído na programação, mas não como tinha sido selecionada para acontecer.
Após o término, deixamos clara a necessidade de falarmos com eles, mas os produtores simplesmente se esconderam, sem oferecer água, lanche e sem, sequer, nos informar onde o transporte nos aguardava. Indignados com o rumo que as coisas estavam tomando, entramos em contato com a produção por telefone e por email, para informar de não havia a possibilidade de executar nossa ação nas condições do primeiro dia e solicitando reunião para reorganizarmos o trabalho, mas, uma vez mais, não obtivemos retorno.
No dia 11/08, novamente o amadorismo e má-vontade da produção se mostraram: para o transporte dos materiais e do pessoal ao terminal rodoviário, foi enviada um van completamente cheia de bancos, adequada ao transporte de um grupo grande de pessoas sem bagagem. Dividimos o transporte com o carro de uma das integrantes da ação e nos dirigimos ao local, onde verificamos que a sala de apoio estava sem condições mínimas de uso: suja, sem água, luz ou lanche. Verificamos também que os produtores, designados para nos auxiliar, estavam, ao invés disso, “vigiando” o banner afixado na entrada da rodoviária, enquanto nosso produtor providenciava, junto aos funcionários do terminal, as soluções para nossas necessidades. Chamamos novamente a produção para uma conversa em relação às condições negociadas para as nossas apresentações e obtivemos o seguinte retorno: “Caso vocês não façam nestas condições, a FMC suspenderá o pagamento do cachê”.
Indignados com o absurdo da situação e percebendo que com a produção não conseguiríamos resolver nada, novamente apelamos para as redes sociais e deixamos uma mensagem no Facebook de Barroso. Diferentemente da primeira vez, quando obtivemos um pronto retorno, ficamos sem resposta. Como também ficaram sem resposta os telefonemas e recados deixados na secretária eletrônica do referido coordenador. Fizemos uma reunião e resolvemos, apesar de todo o desrespeito e desconsideração por parte da organização do FIT, cumprir nossa parte no acordo até o fim e realizar a última intervenção.
No dia seguinte, ao iniciarmos nosso percurso em direção à estação Minas Shopping, recebemos um telefonema da produtora Ana Jardim informando que a intervenção não poderia ser realizada na Estação, devendo ser realizada na rua. Diante da nossa recusa, ela, aos berros, nos ameaça novamente com o não pagamento.
Demos prosseguimento à ação – conforme programação do próprio FIT e plano de ocupação traçado e comunicado à produção do evento – e chegamos à estação Minas Shopping, onde um aglomerado de pessoas aguardava. Como o FIT não havia comunicado à chefia do Metrô a realização do evento, nem havia solicitado a liberação para uso do espaço, começamos a ser pressionadas, por funcionários da CBTU, a nos retirar do local.
No melhor estilo Kafka, ao coro do metrô se juntaram os produtores do FIT que, eximindo-se da própria responsabilidade, pedem nossa retirada. Diante de nossa reiterada recusa, informam que estamos, então, por nossa própria conta e risco.
Sob clima tenso, a intervenção prossegue até ser interrompida por um funcionário da CBTU. Com o protesto do público presente, a confusão se instala e exigimos, então, um esclarecimento por parte da produção. A produção alega que NÓS não temos autorização para realizar a intervenção no lugar, esquecendo-se de que a LIBERAÇÃO DO ESPAÇO constante na programação é RESPONSABILIDADE do FIT. Diante da evidente incompetência, irresponsabilidade e despreparo da organização do evento, o público se junta às performers numa ação de intervenção pela cultura de BH, deitando-se no chão e deixando as marcas de seus corpos e os escritos de seus protestos marcados a giz.
Ao final de tudo, com o circo armado e os fatos escancarados, recebemos, finalmente, um comunicado da FMC que, agora, se digna a falar conosco: a coordenadora Solanda oferece, entre pedidos de desculpas e esperanças de que não fiquemos tristes com o Festival, uma nova apresentação para sanar nossos transtornos.
Não, FMC. Não queremos panos quentes nem douração de pílulas. Mais do que “tristes com o FIT” estamos INDIGNADOS. Não queremos uma apresentação extra, quando tínhamos três em que poderíamos realizar perfeitamente o nosso trabalho.
QUEREMOS RESPEITO, DIÁLOGO, CONSIDERAÇÃO. QUEREMOS SEMINÁRIO DE AVALIAÇÃO NÃO SÓ DO FIT, MAS DAS POLÍTICAS CULTURAIS IMPLEMENTADAS POR ESSA GESTÃO. E, por último, queremos lembrar que não há luta sem ranger de dentes. Lembrar que as pessoas não sorriem quando estão sendo massacradas, desrespeitadas, manipuladas. Elas gritam, elas berram, elas lutam bravamente. Não esperem de nós atitudes menos combativas.
Fraternalmente,
Obscena
Agrupamento Independente de Pesquisa Cênica

sábado, agosto 14, 2010

(Re) Ações Obscênicas



Dia 04/08, primeira semana de trabalho do Obscena pós férias. Retornamos determinados a explorar mais as ruas de BH, independente de qualquer condição.


Sigo para o trabalho, trago comigo 4 sacolas de roupa de calcinha à cachecol. São restos de mim, produtos dum desejo, dum presente que cumpriram já comigo sua estadia, agora é hora de abandonar estas cascas. Resolvo torná-las em trouxas de roupas, trouxas de mulheres roupas e dependurá-las na estrutura de ferro que há embaixo do Viaduto Santa Teresa. É um espaço hostil, com vários moradores de rua que dominam a área e sente-se incomodados com nossa presença, um deles passa e avisa para tomarmos cuidado com as fotos, outro se aproxima e diz que aquilo que fizemos ‘parece mais é Carandiru!’ e pergunta que hora será o teatro.


Desde 2008 trabalho com o abandono, o que do meu corpo pode ser deixado no corpo da cidade e quais as formas de executar isso? São questões que me perpassam. Como deixar meu sopro nesse concreto?


Uma teia foi-se formando com as trouxas de roupas mulheres, contei com a presença ativa afetiva dos pesquisadores do OBSCENA, como também dos artistas colaboradores Matheus, Fred e Patrícia. Não houve direcionamentos, simplesmente apresentei os materiais e convidei ao trabalho. A proposta de Saulo foi muito próxima à minha e logo unimos nossas instalações e reorganizamos a paisagem.


Nina e Lica trabalharam com a Mulher Painel, na qual o corpo de Lica é suporte ambulante de notícias sobre o gênero feminino, da saúde ao assassinato ela exibe aos transeuntes sua roupa páginapainel.


Joyce espelhou post’s pelas pilastras com frases que expressam bem a situação da cultura em BH. Em outra ação ela saca uma meia fina do bolso e enrola o cabelo tentando ridiculamente formatá-lo dentro duma toca. Enquanto isso seu celular toca a música “little boxe’s’ (creio que é esse o nome).


Clóvis propôs a fila para o nada e é interessantíssimo como com o perdurar desta os transeuntes vão se incomodando com aquela ‘falta de propósito’.


Reiniciamos nossas atividades – ocupação da cidade em reação à privatização sistemática do espaço público!

sábado, agosto 07, 2010

Obscenos nas ruas de Belo Horizonte

Nesta semana voltamos a todo vapor aos trabalhos do Obscena: reuniões, discussões e experimentos nas ruas. Na quarta-feira à tarde nos encontramos debaixo do Viaduto Santa Tereza e aconteceram muitas coisas. Tivemos as presenças de Patrícia, Mateus e Frederico.

Erica trouxe muitos objetos, roupas e barbante e juntos fomos compondo um espaço, um território com as roupas instaladas. Paralelamente o Saulo também coloria o espaço, ele trouxe uma trouxa verde muito interessante. Joyce escrevia pequenos textos e os anexava às pilastras do local.
O interessante é que não houveram direcionamentos prévios, tudo foi se dando em seu próprio fluxo e me vi trabalhando na proposta de Erica. Agíamos em silêncio, conectados uns aos outros e alguns transeuntes acharam que íamos apresentar uma peça de teatro. O fato é que o lugar era muito agressivo, perigoso (marginal mesmo) e fomos o circundando com os barbantes e formando uma teia e vários varais. Não se tratava de entender, mas de fazer e cooperar. O espaço vazio era preenchido com objetos cotidianos.

Depois percebi que Erica propôs um "abandono" de coisas no espaço. Olha o Barrio ainda presente. Pensei nestes verbos de ação performática: ABANDONAR, INSTALAR, COLORIR, RECOLHER E SUJAR. Se havia uma encenação a acontecer, esta era o próprio preparar e depois abandonar. Uma travessura muito interessante. Cria-se a expectativa para um acontecimento que acontece nele mesmo e não depois, quando se é esperado. Erica, ao longo da pesquisa, vem abandonando coisas pessoais sobre o corpo da cidade.

Saulo com a trouxa na cabeça cria uma figura interessante, assim como a Lissandra e sua "mulher painel" que circulava e atraía muitos olhares. Ela trabalhou com a Nina. Interessante porque ela parava para as pessoas lerem as notícias (sobre a violência contra a mulher, entre outros). Numa oposição à mulher nua vendida e divulgada o tempo todo, temos o corpo da atriz como um suporte que carrega notícias sobre crimes e banaliza o feminino. Um corpo coberto e Lissandra alternava momentos de espontaneidade e movimento com outros como imobilidade e estilização.

Criamos uma fila de frente para um cartaz e num movimento contrário a quem vai atravessar a faixa de pedestre. Foi muito interessante sentir os carros atrás de nós ( ficamos de costas), sem esta visibilidade, meu corpo tremia e eu sentia a cidade de modo diferente. Era uma fila que se movimentava e assim sempre era recomeçada... Transgredimos as direções dadas pelo espaço, invertemos lógicas estabelecidas para os corpos dos transeuntes. Uma fila para ler uma notícia? Isso levantou suspeitas e curiosidades....

Foi uma tarde de descobertas e foi muito bom sentirmos a força e agressividade das ruas... A cidade não como um lugar de passagem apenas, mas um lugar de encontro, confronto e novas relações.
QUERO MAIS!!!!!!