agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

terça-feira, fevereiro 19, 2013

Cozinha Performática para um tempo obsceno


Tiramos um período de férias dos encontros do Obscena.  Um bom tempo para se pensar em outras coisas e também se pensar sobre os possíveis caminhos de pesquisa desse agrupamento artístico que já está em seu sétimo ano de existência. Muita gente passou, muitas linhas de pesquisa foram fundadas e investigadas, muitos encontros, muitos desejos e desafios constantes. O que nos une? O que nos alimenta? O que dá sede, seiva, saliva? Qual é o denominador comum?  O que nos diversifica? O que temos descoberto? Para onde apontam nossas próximas ações?

E esse tempo vivido “fora”, me trouxe a própria questão do tempo como matéria de questionamentos, sensações e silêncios. Acho que viemos de tempos muito produtivos e pouco reflexivos. Uma sensação de correria, de excesso, de uma certa superficialidade no que se refere a alguns pontos da pesquisa. E para mim: criação e pesquisa se situam no avesso da pressa. Hoje o “mal estar da civilização” (já nomeado por Freud) se localizaria no que Bauman chama de “mal estar da aceleração”? Não corremos então o risco de estarmos velozes demais?

Quais seriam as linhas de força numa prática de pesquisa? Tempo para observação ativa, tempo para experimentação, tempo para discussão, tempo para re-elaboração e por aí vai. Fora a complexidade de variadas naturezas temporais: meu tempo subjetivo, o tempo dos outros, o tempo de amadurecimento de uma ação, o tempo da cidade etc.

Numa sociedade performativa (cujo tempo é destinado à ação e razão eficazes, vide o lema “Faça tudo rapidamente e não perca tempo”) como fica o tempo das práticas artísticas performáticas? Elas reforçam a aceleração dos corpos e da percepção das coisas ou pelo contrário, criam lentidões e inauguram um tempo do kairós? Estaremos presos numa armadilha?

Como fugir do tempo cronológico faminto por durações e acúmulos de toda ordem? Há uma ideologia perversa das realizações que nos trazem a ilusão de felicidade, sucesso e poder. Tipo: “a gente faz e acontece”. E às vezes fazemos muito e realizamos tão pouco. Não pretendemos criar uma pausa ou uma interrupção (transgressões cotidianas) na velocidade da cidade e das relações? Uma outra vivacidade ou melhor: “viva a cidade”?

Há que se ter tempo para se perceber as “cores e formas da cidade” (nome de uma ação coletiva), sentir seus cheiros, tatear seus espaços e experimentar seus gostos. Descobrir suas possibilidades e proibições. Isso me lembra a arte de cozinhar. Ação que pede tempo e espera. Precisa de preparo, não necessariamente de receita. Cozinhamos um prato para nós ou para os outros. Certamente desejamos oferecer um presente para nosso paladar. Um “presente” também aqui no sentido de presença.

Penso o Obscena como uma cozinha performática poderosa, repleta de temperos, saberes e sabores, produzindo pratos (ações) na maioria das vezes coloridos e consistentes, ainda que um pouco indigestos para o senso comum. Talvez seja o momento desta “maravilhosa cozinha de Ofélia” fechar para um balanço, entendendo que há um tempo para ação e um tempo para reflexão, ou “reflexo da ação”. Talvez nem nós mesmos temos saboreado com vagar as deliciosas especiarias que cozinhamos e oferecemos. Confesso que o ritmo intenso no final do ano passado deixou minha boca seca e sem gosto.

Tempo de diálogo, dúvida e muita conversa entre seus cozinheiros-performers. Tempo de se ajustar o foco. Será esse tempo o de agora? Haverá algum cardápio já sendo pensado e preparado e que merece um investimento coletivo nesse momento, digo, maior investimento e atenção? A montagem de AS ONDAS pode ser esse tempo degustado e aquecido desde o ano passado? Um processo não significa tempo de escuta e experimentação? Não utilizaríamos melhor agora os temperos da teatralidade e da performatividade, que escolhemos lá atrás como ingredientes criativos e culinários?

Uma cozinha performática que respeita e percebe os tempos existentes para cada prato a ser criado certamente pode produzir uma boa mesa e um bom encontro. E mais: alimentar, na medida certa corpos, ideias e desejos. Deliciosa e demorada comida para tempos mortos! Ou quem sabe até permitir que se manifeste primeiramente o apetite e a fome! Mas até para isso precisamos vivenciar uma outra qualidade de tempo. Largo e preguiçoso. Tempo obsceno.