agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

sábado, maio 31, 2008

Paródia do desassossego

O comando foi claro e simples: durante uma caminhada pela cidade objetos serão recolhidos individualmente, de acordo com o gosto e a necessidade de cada andante. A comunicação entre o grupo se dará através do olhar somente.

E fomos adiante: vetores da causalidade.

Uma cidade produz fenômenos particulares para o tato de cada indivíduo – os seus detritos, restos, lixo. Tudo o que é produto do aborto espontâneo do acaso – essas “coisas” materiais que são capazes de dar sentido ao caos, de denunciá-lo nas entrelinhas de uma determinada trajetória, assim como na maneira como se encontram dispostas na geografia urbana.
Reparei que, logo na curva da primeira esquina, meus olhos espiavam a realidade exposta dos pudores, do ciúme, do ticket-refeição, da leviandade, do desassossego. O auto-retrato condensado dos milhares de moradores errantes de uma metrópole encontra-se numa sarjeta e custa apenas o esforço de se abaixar para observá-lo, sentir seu cheiro de mijo, a textura de suas células mortas, a misericórdia leiga dos santinhos pisados. É como um olhar direcionado aos próprios olhos através de um espelho só para perceber e constatar: a deterioração unifica a humanidade.
O tempo, neste caso, torna-se então um fator indispensável para se compreender a ação proposta como exercício. Ele representa o caráter finito da caminhada, o caráter finito dos objetos encontrados e recolhidos, e o caráter infinito do acaso, pois o que não se encontra inserido no acaso não existe fisicamente, passa a compor diretamente o universo da memória subjetiva e intelectual. Ou seja, tudo o que o acaso oferece naquele instante é físico e concreto, tudo o que ele poderia ter oferecido é subjetivo e intelectual. Obviamente, este segundo caso não nos interessa.
A potência desta ação, no geral, parece estar localizada na relação caos/acaso/acontecimento; e isto me leva a pensar na idéia de happening e não de performance. Não que a performance não lide com tais elementos, no entanto, estruturalmente, relaciona-se com eles de forma menos radical. O happening atomiza noção estrutural de previsibilidade e por isso acaba estando mais ligado à idéia de caos do que a performance. Nós lidávamos, por exemplo, somente com a prévia de uma ação: a de caminhar. Não houve nenhuma preparação, nem a trajetória havia sido determinada; e a matéria sobre a qual agíamos era o próprio acontecimento. Por mais que as pessoas ainda olhassem para nós com curiosidade e estranhamento, o entorno da realidade nos aproximava mais de seu cotidiano do que nos distanciava dele. Como nós, haviam outros. Vários, catando ao léu. Enfiados nas brechas, fendas e esgotos. Uma cidade produz fenômenos particulares: transforma homens em ratos apenas tirando-lhes a gravata. É o que se vê durante o período que se caminha do escritório ao ponto de ônibus. O tempo é dos olhares e para os olhares, das redondezas ou alhures.
Paradoxalmente, os restos, a desordem, o frenesi urbano das 19:30 proporcionaram um exercício de respiro. O Núcleo Obscena nutriu-se com a sujeira do ar e a poluição dos escapamentos. Talvez este seja também um movimento natural: o do gatilho ao disparo, das amarras à injeção letal, da rejeição ao clonazepan. O lugar comum e confortável está em vias de suicídio. Eu acredito nisto, se não, não estaria aqui. No entanto, um acontecimento feliz assim é burocrático, precisa de empenho e assinatura em consciência timbrada, precisa ser lançado ao desconhecido.
Eduardo Giannetti escreveu:

“... como o que falta saber, por definição, ninguém sabe o que é, o desconhecido pode ter uma propriedade singular. Nem sempre o que era desconhecido, mas veio a tornar-se conhecido, restringe-se à descoberta de coisas que são meramente complementares ao estoque de saber preexistente. A tensão entre o antigo e o novo – entre o estoque e o fluxo na busca do conhecimento – gera surpresas e anomalias. O novo conhecimento gerado pode alterar radicalmente o nosso entendimento acerca da natureza do saber preexistente e do seu valor de verdade. O conhecer modifica o conhecido. O desconhecido é uma bomba-relógio tiquetaqueando e pronta para implodir (ou não) o edifício do saber estabelecido – uma ameaça pulsando em tudo o que se mantém de pé.”[I]

Nenhum happening seria possível se não proporcionasse o mínimo de happiness. É o calor das almas inquietas, afogadas em desassossego. E mesmo que um dia ser inquieto torne-se cansativo, mesmo que nossas posturas curvem-se ao peso do mistério, não tem problema: nós sempre voltaremos ao teatro. E lá haverá sempre um espetáculo esperando por nós. É o preço que se paga por vivenciar o fluxo de um acontecimento: até que se construa uma barragem, ele sempre acompanhará a massa.


O Registro:

Segue o registro de uma “escrita espontânea” feita a partir do fluxo logo após o término da caminhada:


Formigas, formigas me comem, formigas me comem a mim, formigas me comem a minha pele – Tijolo – Vidro – Este remédio não se encontra em farmácias - Caminhos – Caminho de tijolos – Caminhos de algodão – Algodão para os EUA – A colônia – Paródia do desassossego. Era o sinal vermelho – Moisés abriu o sinal vermelho: e os cavalos passaram: cavalos contemporâneos – Conterrâneos, congruentes envergaduras de madeira tosca para oração – Deslixo, desleite: lixo de leite, de mama, de buquê de garrafa PET – Mulher na lança, enfiada na lança... do parque, do jornal, da esquina experimento – Este remédio não se encontra em farmácias – BuscaTrajetória – ConhecimentoAcúmulo – Suspensão – Performance e no final espetáculo – Espetáculo no final – Alfinetes – Alfinetar – Retirar de um lugar para colocar em outro, espreita do laço – Confecção do desmundo, desnatural, descorpo, desnível, desrua, desface... desfaça.

[I] GIANNETTI, Eduardo. Auto-engano. Companhia das Letras, São Paulo, 1997.

As cidades e os mortos

26/05/2008

“Não existe cidade mais disposta a aproveitar a vida e a evitar aflições do que Eusápia. E, a fim de que o salto da vida para a morte seja menos brusco, os habitantes construíram no subsolo uma cópia idêntica da cidade. Os cadáveres, dessecados de modo que os esqueletos restem revestidos de pele amarela, são levados para baixo e continuam a cumprir antigas atividades. Destas, as preferidas são as que reproduzem momentos de despreocupação: a maioria é posicionada em torno de mesas servidas, ou colocada em posições de dança ou no gesto de tocar trombeta”.

Visitamos Eusápia, com a ordem de caminhar, estabelecer contato somente visual e sinestésico com os mortos. Não dá pra calar sempre. Mas, a voz, a fala, o registro simbólico, talvez, preservariam nosso corpo da experiência, mascarariam nossas possibilidades de relações com o real. A força da experiência pode ser aliviada e encobertada pelo discurso articulado da comunicação. Os símbolos sociais esquivam o olhar da coisa (não há nada de novo nisso). Caminhamos quase em silêncio, porque membros e órgãos falavam sozinhos com fone de ouvido e os mortos gritavam à nossa atenção. Aliás, como já foi dito, a morte é o contato com o silêncio. Calados, para visitar os mortos!

Essa cidade situada, sitiada n’outro plano da visão preserva sutilezas grotescas. Ali o que salta à percepção são os mortos. Aqui o que falta à percepção são os mortos.

Objetos falecidos pela perda da função na vida prática e ordinária esquecem de servir, se abandonam e somem diante dos olhos quase cegos do dia-a-dia que só vêem sinal fechado, outdoor arreganhado, promoção de camisinha e modelos de beleza. Aproveitar a vida cotidiana significa entorpecer a mente e falsear o desejo com des-prazeres. O mundo dos mortos é mais sinistro, obscuro, visceral. Está simbolicamente encoberto porque pode causar horror, ânsia, repugnância: é obsceno. Algodões ensangüentados, lenço de bolso (com escarros?), capa de bombom, restos de bumbum, madeira de ruínas, sacos vazios de comida, guimba de cigarro queimado, tijolos de des-construção, pedaços de limão, caixotes quebrados, remanescentes de feira, plaquinhas de venda (20 centavos), pets pequenas, vareta com resquícios de churrasco, galho de árvore, fitinha de santo, notícias já idosas de ontem, remédios pra não curar a dor, guardanapo com sujeira de bocas, líquidos, sólidos, pastosos...

Um grupo quase silencioso caminha recolhendo cadáveres. A caminhada performática enxerga o chão, a doentia sub-cidade. Depois de adentrado o mundo dos mortos não se deve olhar para trás, porque estátua e pedra eternizam qualquer mitologia, tornam centro a margem, clássico o barroco, sublime o grotesco.

Aquele bando recolhendo lixo, pareciam estranhar as pessoas tentando ir embora depois da labuta pelo pão, também de cada dia. Nas paradas, nas estações nos campos Elíseos, um de cada vez, instalando os objetos de acordo com a vontade aleatória do gesto. O proponente escolhe o lugar, mas a ordem define aquele que recolheu os restos. Todos parados assistindo a construção da obra. Pronta a instalação, cada corpo dono do que construiu se posiciona na feitura: espetáculo ou acontecimento? Os vários mortos objetos escolhidos por cada pessoa, quando re-dispostos juntinhos, trazidos à cena, retornavam ao mundo dos vivos. Então, são observados, observáveis e viram arte (gargalhada). A perda da função assassina tudo. A-função da arte ressuscita algo?

Numa das atividades reproduzidas em Eusápia, cidade recriada para que os mortos pudessem viver, vê-se que “um barbeiro ensaboa com um pincel seco o osso dos zigomas de um ator enquanto este repassa o seu papel examinando o roteiro com as órbitas vazias”. Eu quis me aprontar fisicamente (aquecer e alongar o corpo) para caminhar através do mundo sub. Eu, ator, examinava o roteiro com as órbitas vazias enquanto a lâmina do acaso cortava a pele e sangrava os corpos preparados. O que a-prontar, se a ordem do caos estará sempre estabelecida? O cego ator se arruma pra sair a caminho do destino. Será que Édipo aquecia o corpo?

Existe natureza, naturalidade, no mundo dos mortos. Um corpo morto não representa. Sobre a morte há sempre representação. O teatro insiste incansavelmente com a morte. “É reconhecida a relação original do teatro e do culto dos mortos: os primeiros atores destacavam-se da comunidade ao desempenharem o papel dos Mortos: caracterizar-se era designar-se como um corpo ao mesmo tempo vivo e morto”. Barthes vai ao mito para encenar morte, fotografia, cena e teatro. Os objetos na caminhada são mortes. Parece haver algo de origem no trajeto margeante que fizemos. Recordações, retornos atordoam ainda. Encenamos a morte, instalamos dejetos como são, somente são. A força para não re-significar. Evita, evita, mas não dá. Evita, evita e dá.


“A incumbência de acompanhar os mortos para baixo e instalá-los no lugar desejado é conferida a uma confraria de encapuzados (...). Dizem que cada vez que descem encontram alguma mudança na Eusápia de baixo; os mortos apresentam inovações em sua cidade (...) os vivos, para não ficarem para trás, querem fazer tudo o que os encapuzados contam a respeito das novidades dos mortos. Assim, Eusápia dos vivos começou a copiar a sua própria cópia subterrânea”.


PS. Porque corpos também são acadêmicos e a cidade dos mortos é sempre universitária, na dúvida promíscua, consultar respectivamente as páginas 101 e 53 em:
CALVINO, Italo. “As cidades invisíveis”. Tradução Diogo Mainardi. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
BARTHES, Roland. “A câmara clara”. Tradução Júlio Castanõn Guimarães. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

terça-feira, maio 27, 2008

objetos... partes de mim..

No início da prática achei difícil me encontrar no exercício, pois estava distanciado, tentando encontrar relação com a minha pesquisa, visando a uma explicação lógica para cada objeto que encontrava.
Colhi garrafas, bitucas de cigarro (nossa! Como alguns fumantes são porcos, encontrei umas cem bitucas em 15 minutos), e outros objetos que caracterizassem a mulher marginal- algo que caminhe entre o fetiche e os vícios modernos - só consegui desvincular disto quando vi um jornal sensacionalista na minha frente. quis expô-lo, sangrá-lo, cravá-lo em algum lugar...era o cartão da cidade.
Coloquei no portão do parque municipal, na lança. Alguns de pontas cabeça... sugeri dificuldade. A leitura remetia:
Travesti é assassinado", "Criança morre ao voltar de casa", acho que ainda me prendi nas palavras, mas elas soavam como um varal a ser lavado, algo exposto que pudesse contribuir com a leitura de um transeunte.
Os comentários das pessoas que passavam nas ruas era: gente doida! gente de teatro! ambientalistas!
Ouvi os relatos de pessoas dizendo que era difícil abandonar o objeto, eu senti o oposto. Queria deixar exposto: uma paisagem , algo estranho algo cotidiano.
Mariana disse que os objetos eram partes dela, acho que isto dá outro significado ao corpo, outra leitura aos detritos recolhidos na cidade grande... um lenço, uma história. Uma placa de 0,20 centavos , outra história. e outra e outra e nenhuma. Isto era esvaziar, deixar ir ...

Brasil vai a júri na ONU por morte de grávida em 2002

O Brasil será julgado pela primeira vez pelo Comitê das Nações Unidas pela Eliminação da Discriminação contra a Mulher (Cedaw). O caso em julgamento ocorreu em novembro de 2002, Alyne da Silva Pimentel tinha 28 anos e estava no sexto mês de gravidez quando procurou um centro de saúde do Rio com vômitos e dores abdominais. Ela não sabia, mas o feto que carregava já estava morto. Demoraram para descobrir, demoraram para operá-la. Houve falta de atendimento, muitas horas de espera e ela morreu cinco dias depois, com hemorragia interna.

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Fundado na Assembléia-Geral da ONU de 1979 - e do qual o Brasil passou a ser signatário parcial em 1984 e integral em 1994 -, o comitê é formado por representantes de 23 países membros, que devem observar o cumprimento das metas definidas na convenção. O País atualmente está representado pela jurista Sílvia Pimentel, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Os responsáveis por levar o caso ao comitê foram a Advocaci e o Centro pelos Direitos Reprodutivos, organizações não-governamentais sediadas nos Estados Unidos, que atuam em todo o mundo pela saúde e pelos direitos das mulheres. "Consideramos que esse é um caso simbólico e muito importante. A decisão que o comitê vai tomar terá repercussão em todos os países membros", afirma a advogada Carmem Campos, consultora do Centro no Brasil. O comitê aceitou o caso e já notificou o governo brasileiro, que tem até agosto para se pronunciar.

O Brasil é responsável por um terço das mortes maternas na América Latina, 98% delas evitáveis, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). O próprio organismo, em documento elaborado com o Unicef e o Banco Mundial, afirmou que o índice brasileiro, oficialmente de 72 mortes por mil mulheres, é maior do que de países menos desenvolvidos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

sem prêambulos

Obscena, Segunda-feira, dia 26 de maio de 2008.

Sem preâmbulos, sem preparação... Saímos a caminhar pela cidade centro volta parque municipal, buscando objetos ordinários do dia-a-dia que sob nosso olhar ganhassem especial destaque.
Éramos um estranho bando... uma procissão? Um arrastão? Não, bem vestidos demais para isso. Palmas para os burgueses e as burguesas que somos. Coleta e despacho. Aproveito para coletar conversas que não fixo, mas que dão o que pensar...
Onde está nosso tema mulher margem de hospícios, prisões e asilos? Não tenho respostas para ninguém. Tenho perguntas. Muitas. Quer? São baratas. Brotam. Propagam. E são resistentes à radioatividade e a bomba nuclear. Baratas não são rosas de hiroshima.
A margem é aqui. No centro da cidade. Nas ruas de cada dia mulheres são construídas, mulheres de cada dia. Mulheres de cama e mesa. Sobremesas. Valem tanto como um bombom sonho de valsa. Baixou. 20 centavos. Custam só vinte centavos. Vejo o casal que se abraça. Que pena, tivesse visto antes e deixaria meu buquê de vinte centavos para ela. Futura noiva domesticada pela tv se deus quiser. O corpo ordinário. É tão difícil não representar, não dar o sentido unívoco. A personagem. Devo guardá-la bem embrulhada para mais tarde. Plastificada.
Os materiais ordinários. O corpo suporte. Algodões ensaguentados. Oratórios populares. Ordinários. A mulher suporte. A mulher com o pau na mão. Matérias materiais. É difícil estar no meu corpo corpo com esses objetos objetos. Embalagens. Bombom. Bala. Salgadinhos. Plásticos. Vou construindo com pouco. Sensação. Gesto. Imagens.
Mulheres de plástico não passam por aqui. Mulheres papelão? Mulheres notícias de jornal? Mulheres vendem cerveja. Pneus. Carros. Cigarros. Bombons e mulheres noivas. Bombons, margarina, e a promessa de um casamento feliz. Ou pelo menos um amor padrão global. Mulheres domesticadas pela novela. Filés. Gostosas. Boas de comer. Devorar. Meter e gozar. Afinal, o homem tem o pau na mão.
Loira boa é igual cerveja... gelada, em cima da mesa. Os homens protestam: mulher boa é quente! Mulher boa é como um churrasco. Uma maminha quente, bem temperada. Um pedaço de carne embrulhada em roupas de seda, algodão, não importa. Ela vai ser despida. A carne também é dócil e muda.
Sabia que 60% das mulheres brasileiras nunca gozaram? Segundo a pesquisa de um famoso desodorante masculino que torna o homem um garanhão e as mulheres presas fáceis, um chocolate dá mais prazer que um homem. Pelo menos é você que come o chocolate. Dá para saborear, se lambuzar, sem pressa.

Nina Caetano

segunda-feira, maio 26, 2008

Alguma coisa está fora da ordem

Belo Horizonte,
Segunda-feira,
19 de maio,
Teatro Marília,
Relato obscênico,
sob o ponto de vista do pesquisador/ ator,
Saulo Salomão

Princípio da pesquisa: relatórios, dia da semana, o horário, a pratica, a teoria, o lugar, os textos....

Alguma coisa está fora da ordem

Reunimos para este encontro como havia previamente combinado para esta segunda-feira do mês de maio. Daríamos prioridade para as seguintes ações:
_ Desenvolvimento e aprofundamento no estudo da “Dança Criativa” e algumas demandas burocráticas do trabalho.

Na semana anterior, foi ressaltado por alguns pesquisadores que seria necessário um maior rigor com a pesquisa do “não representacional”, que tem sido o foco de trabalho do agrupamento obscênico.

Tivemos alguns ganhos nesta empreitada.

No que diz respeito à Dança Criativa como elemento colaborador da busca do não representacional, que está sendo apropriada para servir de meio para este trabalho, conseguimos uma conduta menos expressiva/representacional nessa semana. Damos início a esse trabalho dentro da sala cheia de cadeira, mesa e outros objetos que, em princípio, poderia levar a um lugar mais representacional.

A meu ver, ocorreu exatamente o contrário, pois nos tirou de uma seqüência de exercícios já codificados que estamos desenvolvendo e que teriam que ser realizados em um local previamente programado, como o palco, que já traz toda uma carga de informações que dificultaria a chegada nesse lugar almejado.
Já o uso da sala serviu para romper e para nos decodificarmos dos lugares comuns antes explorados, forçando-nos a trabalhar dentro de uma “novidade”: não seremos mais aqueles atores que se alongam no palco, realizam movimentos que o corpo está precisando e, sim, lidam com um lugar novo que não permitiria prévio planejamento para o uso do mesmo, uma organização de como lidar com aquele lugar, fortalecendo o aqui e agora, o não programado.

Em seguida, saímos em destino à goiabeira que fica no fundo do Teatro Marília, mais uma vez lidando com um lugar “ desconhecido”. Neste trabalho da dança criativa,
encontramos com vários transeuntes do teatro. Tivemos que lidar com a chegada daquela massa de gente que descia dos ônibus e entravam no Marília e os obscênicos executando, junto a eles, sem imaginar que isso aconteceria. Foi realizado a dança criativa junto com aquele monte de gente que entrava sem perder a busca do não representacional.

Já na goiabeira, demos continuidade no trabalho, talvez possa me faltar palavras para explicar o que aconteceu ali naquele momento, mas o que é notório é que chegamos mais perto deste lugar procurado.

Um ponto que distanciou realmente desta busca foi na etapa final do trabalho. Cada um fez uma “mostra” do seu estudo ali naquele dia, e, em alguns momentos, estabeleceu-se o lugar do espectador e do atuante, distanciando do objetivo. Que os pesquisadores, que optaram em fazer sua “mostra” no próprio lugar onde estava, possam servir de exemplo mais próximo da nossa busca do não representacional.

_ Esclarecimento de algumas demandas burocráticas (impostos) do projeto “Texturas Femininas a Margem”

Alguns Pontos que estou pensando atualmente nesta pesquisa que estão fora da “ ordem”, do lugar, da dedicação, do pré estabelecido:

_ A escrita refletindo e colocando “ações” desta pesquisa,
_ A postagem dos relatos relatos
_ O Rigor com o não representacional
_ Que hora vou Gozar? (onde aplicar a pesquisa individual?).

domingo, maio 25, 2008

lguém que seja mais esclarecido, me esclareça, por favor!

Alguém que seja mais esclarecido, me esclareça, por favor!

O encontro começou com a pratica proposta pela Patrícia , apenas o movimento , buscar o centro , andar para frente, para trás e para o lado, depois em duplas. Estava feliz, porem, aos poucos fui ficando frustrada , o corpo não é o mesmo , o corpo não responde, o outro corpo me impõem limites , que antes não tinha, fico cansada rapidamente principalmente com o sobrepeso. No exercício em duplas , o riso, paradoxalmente me senti muito bem , foi muito prazeroso para mim, logo o riso se tornou coletivo. Na mesa , fui repreendida , por “querer fazer graça” ( ou pelo menos foi assim que entendi , me desculpe se estiver equivocada), mais não quis fazer graça, foi muito prazeroso, já estava sendo antes , apesar do cansaço.

E através de questões levantadas pelos meus colegas no dia 12 e depois que li os relatos muitas duvidas surgiram: afinal , o que é um agrupamento colaborativo? Qual a diferença para um grupo? Até onde um procedimento é geral ou individual ? o que é ser neutro? Ser neutro é ser não representativo? A gramática gestual e verbal da atuação rapsódica e o modelo não representacional de ações (proposto por Artur Barrio) são uma mesma coisa? Eu tenho que necessariamente usar em minha pesquisa o corpo neutro? Eu posso utilizar em minha pesquisar outras questões pertinentes a dissertação da Ivone barriga que não o modelo não-representacional dentro do núcleo do Obscena? A dissertação de Nara Kaiserman não é também um modelo a ser seguido dentro da pesquisa do Obscena? O modelo de Nara Kaiserman é não representacional?Afinal existe alguma coisa não seja representativa? O que? O que é não representar? O que é representar? Existem respostas únicas para essas perguntas? Dentro do núcleo do obscena podem existir respostas múltiplas para as mesmas perguntas? Existe um objetivo em comum no nucleo do obscena, ou são objetivos múltiplos? O que nos faz ser um agrupamento? Quando eu sou rigoroso com a pesquisa e assim sou generoso com o outro fazendo os apontamentos necessários e quando eu sou intolerante e agressivo?Quando eu atrapalho o agrupamento e até onde vai a minha liberdade de experiment e ação?O que é qualquer coisa que vem do outro? Eu posso achar pertinente as questões levantadas no agrupamento mais não concordar (por ter um entendimento diferente) e não me sentir atravessada por tudo o que é discutido e continuar freqüentando o núcleo?Quais os pré-requisitos para freqüentar o núcleo? Fazemos parte de uma mesma pesquisa ou de pesquisas individuais? Se por um acaso fizermos parte de pesquisas individuais, não temos necessidades diferentes?

Tenho a impressão que meu entendimento sobre algumas questões com relação às pesquisas e ao funcionamento do núcleo tenha sido equivocadas, peço desculpas desde já se causei transtorno por um entendimento mal sintonizado com o núcleo.

Assim que respondidas minhas questões espero não cometer os mesmos erros,mais como Herrar é umano, prometo sempre dizer sim!

sábado, maio 24, 2008

PARADOXO DA IMPOSSIBILIDADE


FADE-IN.

MINHA CONTURBADA CONSCIÊNCIA. INT. DIA.

Som in-off do interfone tocando.
Dirijo-me, subjetivo, até a porta.
Uma mulher qualquer:

- Leia Mateus 22:14.

E pronto. Nada mais. Foi-se desta forma, causal.

A Causalidade pressupõe a multiplicidade do ser assim como o movimento originário da relação entre os seres. Aristóteles apresenta como objetivo principal da ação a melhoria do ser, considerando-a como força capaz de gerir o movimento. Em outras palavras, ele a compreende como princípio motivador do movimento para o alcance da felicidade.

No ponto chegou 2214: o ônibus.
Ali dentro, felicidade não se encontra em versículos. Ali, Deus é valor de troca, moeda sem câmbio suficiente para pagar o tempo entre o giro da roleta e o sinal de desembarque. Isso por que todo mundo precisa acreditar em alguma coisa além da materialidade.
Felicidade, por exemplo, não se compra, dizem. Logo, não é material.
Como Deus ela é invisível, não se toca.

Sendo assim, o motivo fundamental da ação é alcançar valores utópicos. Aristóteles sabia bem que o objetivo final de qualquer ação é algo que não pode ser alcançado materialmente por que reside no mundo das idéias, são valores ou sensações abstratas como paz, amor, serenidade, Deus, felicidade... Considerando que todo material ambicionado é uma ponte de acesso a esse tipo de sensações e valores.
No final das contas, o ser humano é pura endorfina.

No entanto, para poder visualizar e idealizar a conquista dos seus sonhos, o ser humano precisa de contato direto com seu mundo concreto e real e que ele seja por si só a ação, ou seja, a força capaz de manter o ser humano permanentemente em estado de vigília e movimento. Desta maneira, o mundo real e concreto torna-se auto-suficiente na sua funcionalidade por que conta com a causalidade; neste mundo permanecemos constantemente em contato com o assassinato, o terrorismo, o extermínio, a xenofobia, a peste, a guerra... valores que dependem da materialidade para existir; valores cuja causalidade nos permite contemplar e desejar o seu oposto complementar no mundo das idéias.

Então, disto concluímos:

É necessário que o mundo se mantenha permanentemente desordenado e caótico para que os seres humanos continuem tentando consertá-lo, e que nisto eles encontrem a razão de sua existência.

Paradoxo da Impossibilidade: A guerra é irreversível e incontornável. Num mundo no qual pais defenestram seus filhos, a paz é uma reação química.

Seguindo esta mesma linha comparativa, mas transferindo do universo macro para o universo micro: o corpo de um indivíduo só é impelido a agir para alcançar um determinado objetivo por ele idealizado se mantido em estado perene de tensão e incômodo.

Nós, pesquisadores agrupados do Núcleo Obscena, possuímos como objetivo idealizado experimentar Um Modelo Não Representacional Para o Ator Contemporâneo. E para tal, contamos com a dissertação de mestrado de Merle Ivone Barriga sobre este assunto como material de embasamento teórico.

No entanto, o que no universo macro é conquistado através da causalidade, no universo micro só pode ser conquistado através do esforço. A Causalidade só é generosa conosco até um determinado momento, a partir dele é necessário que se produza algo para gerar outras causalidades. É como engravidar alguém: se vai ser menino ou menina é causal, mas para que isto seja possível é necessário que a porra seja produzida.

O conteúdo teórico de uma pesquisa, além de não invadir casualmente o intelecto de ninguém não produzirá nada se não houver o mínimo de esforço e rigor diante de sua expressão material. O estado perene de tensão e incômodo capaz de detonar o combustível que alimenta nossa pesquisa só pode ser produzido individualmente. E isso quer dizer que eu posso e devo me sentir no direito de, por efeito de causa e conseqüência, cobrar por ele.

O mínimo de esforço pode esclarecer, por exemplo, que a critério de diferenciação nós lidamos com dois tipos de modelos para o ator: um não-representacional e outro representacional. De acordo com a lógica de meu raciocínio, se um pesquisador diz que não se interessa pelo modelo não representacional, logo ele se interessa pelo outro... e logo, eu não entendo por que ele está integrando este Núcleo.

O mínimo de esforço pode esclarecer, por exemplo, que a critério de diferenciação, “não-representacional” é um modelo e “épico” é gênero. E se um pesquisador diz que não se interessa pelo “não-representacional”, mas sim pelo “épico” logo eu entendo que ele não entende por que está integrando este Núcleo.

O gênero pode estar incluso no modelo, mas não servirá de nada se o modelo não for perseguido com ele. O épico não vale nada para nós se for entendido isoladamente. Deixa de fazer parte da pesquisa para se tornar um mero fetiche, como o necrófilo que vai ao buteco para sanar sua libido obscura tomando uma loira, gelada.

O Núcleo Obscena não é um espaço de exacerbação de fetiches e vaidades. Para isso existem as prostitutas e os vídeos pornográficos. Eu espero que permaneçam aqui pesquisadores sérios e rigorosos com suas pesquisas e, antes de tudo, pesquisadores esclarecidos de suas pesquisas. E se nós somos vetores da causalidade, que ela nos leve a um abismo de dúvidas e não a um córrego de certezas.

Em hipótese alguma deixarei de chamar atenção, fazer cobranças e alfinetar o trabalho alheio; e espero dos demais que façam o mesmo comigo.
Se o objetivo final de minhas ações como pesquisador é a experiência de um ideal. E se ideais são figuras de linguagem abstratas conquistadas através de derramamento de sangue: patrocinarei a guerra.

“Por que são muitos os chamados, e poucos os escolhidos” – Mateus, 22:14.

FADE-OUT.


Fim

Dentro e fora de mim

19/05/2008
Hora e meia de prática. Sala apertada, impossível mover com meu viciado corpo. Mal estar, representar mesa, cadeira, poltrona, saco! Meu corpo não quis. Fiz, mas de fora. Fiz esforço, demora. Não entrei no jogo. O juiz apitava e eu corria feito barata bêbada. Tímido, sem graça, cansado de ter vontade. Não podia tudo que conseguia. Aquém. Tímido, péssimo fingidor. Sofria sem mundo. Senti um corpo frágil por dentro e por fora. Fora do alcance das crianças. Reclamei as sensações de pele, as forças do corpo em movimento. Nada colava. Estava insensível, intocável, impenetrável. Respirava, o ar não tinha... Saímos da sala.

Corredor de entrada do teatro: relacione com a entrada da casa! O que é isso? Um bando de Hitchcock, uma matilha de raivosos, uma multidão de famintos, liberto um campo de concentração, um enxame invadiu o prédio. Gelamos com. Viramos obstáculos, só. Desviavam na subida. “Cara folgado, aí!” “Já faz parte do teatro!” “Não vai pisar no cara, heim!” Nada me afetaria mais. Precisava de gente, meu corpo desejava gente. A mais inculta carne me faria mudar. Exaltaram os ânimos. Quero seguir esse povo. A cultura não deixa. Eles gritavam, falavam alto, seguiam o fluxo, reclamavam. Povinho grosso, mal educado! O crasso da incultura me faz respirar. Uso palavras difíceis pra falar de bosta que invejo. Inoportunas invasões: quero isso corpo afora! Eles passando, nós parados. Eles se movem, nós assistimos. Eles correm, nós refletimos. O fubá e o milho. Eles fazem, eu represento. Quero ser o outro, sem sê-lo, sem selo, porque não tem garantia. Não quero ser o outro, nem eu, nem intermédio. Ir ao teatro sem ligar pode não ser representação. Fazer teatro ligando pode ser representação. O monte de gente passou. Fomos pro fundo.

Piso de cimento grosso. Aspereza que atinge a pele. Dói, machuca. O corpo sente como organismo, como natureza. Eu tenho um corpo! Há um espaço que influencia, há objetos em contato comigo, há a lua cheia que não posso ver. Pensei que não tinha entrado. Agora, não sei mais. Tento me esconder. Mas, de quê? De quem? Descobri que meu corpo tenta me suportar, tenta me esquecer, me esconder. Se eu sair do meu corpo, talvez, deixe de representar. Mas, será isso possível? Se descobrir onde estou eu no meu corpo? Não sei ao certo. Patrícia provoca ali, na ferida. Tudo responde, talvez, como suporte de movimento, não de gesto, menos ainda de significados. Investigar meu corpo como objeto de suporte. Em que implica isso? Lançar com tudo na próxima prática.

Vou confessar algo em relação a essas teorias. Não as acho muito complicadas. É só ler que a gente acaba entendendo. Talvez, na verdade, eu não as compreenda, porque quase sempre sei o que quero com elas. Mas, gosto de me confundir, gosto de não saber, gosto de complicar o percurso, gosto de não acreditar. Quando clareio, fecho a cortina e deixo o saber à meia-luz. Não sou meu professor, sou meu próprio a-luno iluminado de escuridão. Tem gente querendo ensinar por aí? Tem gente querendo aprender por aí?

diário de bordo de nina caetano

Obscena, Segunda-feira, dia 19 de maio de 2008.

Preâmbulos...
Muitos dias se passaram do meu último relato, o da segunda/segundo dia de mostra. Sobre a terça, nem falei. E olha que foi o dia do meu/nosso procedimento. Será que a prática está me impedindo teorias?
Passou a terça da mostra, o feriado 21, dia de avaliação/exaltação. O que fazemos/fizemos é espetáculo? Sabemos o que queremos com o que estamos investigando? Qual o objetivo do debate na mostra? E dos relatos do processo de pesquisa? Somos um grupo de teatro ou uma rede de colaboradores? Somos instrumento do outro? Por que uma rede colaborativa? Fazemos cenas ou investigamos procedimentos? Qual a importância dos nossos conceitos de base (ocupação/instalação, não-representacional, atuação rapsódica) para cada um de nós? Qual a pesquisa individual de cada um? É possível decidir o que não quero sem aprofundar antes na investigação de cada um desses elementos? E vou sentindo falta de muitas coisas em nós. A tolerância falada. Mas também o rigor, como contraponto. É necessário aceitar o outro, mas não o qualquer coisa que possa vir dele.
Passou-se o dia 28 de abril. E o futuro? Quais os elementos que parecem mais conectados com o desenvolvimento do trabalho? Representacional versus não representacional, performance, performatividade, risco, ação, teatral, espetacular... É um dia de definições e rumos a tomar até a próxima mostra, a que virá em junho. A mostra será conseqüência dos trabalhos, já conseqüentes da mostra anterior... É o máximo de causalidade permitida no momento: elegemos Barrio. As profundezas do não representacional. Que significa isso? Ninguém sabe. É necessário investigar.
Passei dois dias sem comparecer nos compromissos que não pude impedir adiar. Primeiro São Paulo doutorado. Depois Ouro Preto mofo grude não me furto não posso me furtar...
Todos às voltas com Barrio. É bom voltar ao trabalho. A investigação começa aqui, já no trabalho com Patrícia. Será que ainda pensamos que é aquecimento?

O Encontro.
Engraçado. Foi difícil vir, confesso. Eu também pensava no aquecimento. Em fugir dele, confesso de novo. É trabalho corporal, não sou atriz... Que bom que Patrícia esperou todos, apesar do atraso. O trabalho para mim foi, hoje, revelador. Talvez fosse já evidente para alguns. Algumas coisas eu já sabia, mas não no corpo. Agora meu corpo começa a saber. Talvez por que a leitura do Barrio tenha me instigado questões sobre os caminhos possíveis, sobre as relações possíveis entre teoria e prática. Entre a teoria do outro e a minha teoria na prática. Vir com o olhar de questões para o trabalho prático foi revelador. Quais os pontos de ligação entre o trabalho proposto e as ações do Barrio? Entre o corpo proposto dança pura criativa e o um modelo não representacional?
E mais: o que me interessa investigar, para a dramaturgia que quero propor?
Interessa-me muito o corpo coisa suporte material. As relações dele com o espaço. Quem é o causador das ações? O artista ou os materiais por ele empregados? Pergunta Barriga.
O espaço impregna esse corpo sensível. Causa sensações. Impulsos. Impulso do movimento. Pausa criativa. O corpo recebe/re-age.
As relações corporais da sala reverberam nesse chão áspero de cimento, nessa goiabeira, céu enluarado. Meu corpo trabalha bem na dificuldade. Sensações. Não sentimentos. Ou sentidos, significados. A tentação é grande. Dar sentido aos movimentos. Personas. Narrativas. Mas o corpo quer agir. É mais necessário perceber o que gera o movimento/ação.
Percepção da situação lançada. Barrio tem se mostrado frutífero.

Nina Caetano

quarta-feira, maio 21, 2008

Forma forma forma!

12/05/2008

Uma hora de dança criativa. Pouco duradouro tempo. Teoria e prática convergem-se. A ação, o corpo, somente ele à disposição, o acaso dos dados, a ficção, o real da carne sem tempero e processo. Atrás da platéia. Ante-sala do teatro com madeira no piso, pés sobre madeira, pernas sobre pés. Movimentos simples, aparentemente fáceis. Mas, não. Sentir o peso, perceber o corpo, respirar somente ar, olhar e ver sem significar, experimentar velocidades, desfingir os músculos, desfranzir a face, ninguém testa, mover no espaço de cada dia sem representar. Somente organismo de um lado para o outro, de cima para baixo. Deixe fora carcaça, couraça, máscara de convívio social, porque interessa o neutro, o vazio cheio de órgãos. Matéria viva escorregando sem graça, sem farsa, sem metáfora. Graça pode ser achada na ação, não na cena, na ré pré zen ta são. Ação pela ação. Ação pelação? O vazio instiga porque está carregado de presentação sem ré. Vamos pra frente que pra trás traz memória. Há que seguir adiante, antes de se constituir símbolos. Símbolos são fáceis de achar, ficam plantados no chão, são dados por toda parte. Basta se agarrar a um e segurá-lo até o final da vida. Hoje penso que um “grau zero de representação” está próximo de um lugar não simbolizável: a terceira margem, talvez.

Espreguiçar, circular, contorcer, relaxar, molar, pendular, perdurar, tudo é forma. Forma forma forma. Não há como negar. Seria um corpo amorfo neutro? Não há amorfia. “Não há nada a dizer”. Cale a boca, Beckett! Você fala demais. O corpo espera Godot, sempre, incansavelmente.

Constitutivo interno da gente (dá, gente!) fazendo mudar, de casa, do conforto da sala pro confronto da fala. Discutimos. Nova(mente), Barrio de madeira com o cínico pelado dentro; Barriga com estômago cheio e pesadelo durante a sesta. Um corpo que parte de um constitutivo interno. Um corpo que parte o constitutivo interno. Um corpo que pari um constitutivo interno. Um corpo cansado de neutralidade. Um corpo cansado de razão. Um corpo cheio de ração. Um corpo imenso. Um corpo sem máscaras. Um corpo sem gesto. Um corpo honesto. Um corpo como instrumento. Um corpo com aresta. Um corpo de festa. Um corpo com água, pó, café. Um corpo até. Um corpo sem fé. Um corpo neutro em prática. Um corpo como ele é! Um corpo, como ele é?

“...Por uma geografia da arte”. Sugestão. Leremos em breve.

Alguém alfinetou e os corpos reagem. “Sou pesquisador ou finjo que sou?” Quem é mesmo um fingidor? Eu, declaradamente, finjo, até o paroxismo. Até que sismo. Vou a fundo no raso da pele, na profundeza da superfície. Não mergulho, não afundo colher de pau em gordura fervendo, não entoco a cabeça no buraco, não enfio a mão em cumbuca, porque voz pode ser isolada. Calo pra não dar calo. Rio para o rio. Debocho, divirto e choro. Rigor é rigor. Rancor é rancor. Dureza é dureza por qualquer canto. Canto.

Barriga, por favor, o que é um signo de expressividade?

Mais tarde, despacho, entrega, macumba, sei lá. Achar encruzilhada específica. Tarefa árdua. Essa pomba-gira não pode encher a cara em qualquer esquina? Entidade folgada! Vou no ritmo de festa. Noite, vento, silêncio. Esquinas, frio, encruzilhada propícia, calafrio. Que porra é essa? Permissão para o guardinha, permissão para a pomba-gira. Meu deboche brocha. Raio cruza meu corpo. Quietude. Energia demais. Brinca idiota, que você perde o peso! Fiquei suspenso. Entendi nada. Instigado e medroso, não comento. Calo.

segunda-feira, maio 19, 2008

PARA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORES... AS QUE NASCEM EM FEVEREIRO...relatório sobre fevereiro

A minha vagina era a minha aldeia
a minha vagina era a água e os campos suaves...
Há algo entre as minhas pernas que não sei mais o que é...
Desde que puseram rifles... um cano de aço ... mais soldados.

Estar à margem, no sentido marginal do termo, é ficar à sombra de uma democracia feita pela maioria,
maioria esta esmagadora, que decide por muitos, que opta por todos,
deixando uma parcela esvaziada, esquecida, esmerando um lugar de voz,
algo que a represente... talvez o Espanto!
A democracia como algo bom?


Havia varas, soldados, vassouras, mais soldados...
Ouço minha pele rasgando
sons estridentes, gargalhadas... cinco em cima de mim...


A democracia elege o padrão
e deixa outros à deriva calados,
no filme de Lars Von Trier, Maderlay, os escravos preferiram a chibata à democracia,
já estavam acostumados a não questionarem e este pressuposto talvez não modificasse o redor.
Calar-se diante da ditadura imperial da maioria.
"É a democracia!" eles dizem...
outro diria "a cracia do Demo"
Ela, muitas vezes, esquece a unidade invisível do ser.
Este ser é constiuído por elementos feitos de um pouco de suor, um sangue menstrual, um bico de um seio, umas curvas macias e alongadas.


a minha vila desapareceu, secou.
eu me tornei um pus de veneno e râncor
e minha vagina era um coração pulsante
grande, com olhos, mãos e placenta,
Minha vagina está furiosa

isto forma o elemento químico extraído da costela de Adão,
Eis que surge a mulher,
esta química feita de luz que não deseja virar carbono no fogão, na faxina, no ideal materno,
e querem ter voz, uma audiência marcada com o opressor,
sem passar pelo CALA-TE, sem entrar em um molde brazilian girls ,
Esta audiência tem hora e local marcado, segunda á noite no Teatro Marília,
um grupo de pessoas que vislumbram falar, saírem do sofá confortável para investigar os elementos obscenos,
safra de alguns renegados como a carne prostituída. Investigar as abordagens dos rótulos dicionarescos que evidenciam o preconceito

Galinha! Vaca! Piranha!

desejamos falar da democracia feita por muitos
para poucos
mas é claro, é sempre mais fácil falar.

minha vagina não irá se calar
não irá embora, não nem depois, nem agora!
(trecho em vermelho extraído do monólogos da vagina)
OBSCENA – RELATOS - MAIO
Relatos Maio de 2008

Relato - 19/05/08

Iniciamos ás 19:30. Outra vez na sala da diretoria.O trabalho prático começou na sala mesmo. Espaço limitado, como limitado era o nosso movimento neste espaço. Um pouco de exercício de eixo.Deslocamentos na sala.Relação com o espaço. Com os objetos da sala. A partir da estrutura do próprio objeto.Uma experiência mais contida,mais minuciosa em função do espaço. Um corpo mais "sentido",percebido,porém, limitado.
Saímos da sala com este corpo aberto ao espaço.
Na escada de saída, um aglomerado de estudantes subiam-na,vinham contra nós.Estranhamento, atençao e muita gozaçao. Atravessamos na mesma concentraçao. Eu trabalhava em torno ou na risca do quadrado ou melhor, com as linhas da cerãmica no chão. Os pés, seguiam-na e o corpo junto.Trepei no ferro, pelo impulso das próprias pernas.
fomos ao quintal do Marília. A orientaçao era relacionar-se com a primeira "coisa" que achasse/considerasse interessante.Avistei uma mangueira. Sua espessura, cor, tamanho, posição no chão.Soltei o corpo. Deixei-o ir ter com o objeto e evocar a relaçao a partir dos impulsos corporais, sensoriais. Deitar em cima da mangueira, estimulou a transformação do corpo na gangorra que se desloca de um lado a outro.
Outro espaço.Outro objeto. Desloquei para a escada.Coloquei o corpo em sua forma, sua estrutura. Ao contrario da mangueira, os movimentos vieram duros , mecanizados.Parede. Chão. Fomos nos deslocando, experimentando outras possibilidades. Experimentei o céu. Perceber o impulso inicial:onde começa e onde termina? Inserir pausa. Perceber onde começa e onde termina, ajuda a perceber melhor o movimento, a concentrar no estado, na situaçao. A estar presente. Os 2 espaços proporcionaram, com o mesmo exercício, percepções diferentes do corpo e do próprio impulso no corpo.
Impulsos longos e curtos.Nao consegui realizar os longos. Ou pelo menos não consegui perceber que os realizava.
Fiquei tão centrado no próprio impulso que não dei tanta importância se eram longos ou curtos.
21:15.Retornamos á sala da diretoria.Algumas questões: As propostas do relatório no blog – colocaram como problemático. Não está sendo compartilhado. Do mês de fevereiro ainda não fora postado? Abril até que sim, está próximo, mas,fevereiro?...
Nina aprovietou a deixa pra dizer, em relação á colocação da Patrícia, sobre dificuldade em falar de si num espaço como o blog, que a postagem tem sentido de reverberar as perguntas no ensaio/reunião posterior. Deve ser o resultado dos questionamentos: Que procedimentos temos feito?Como temos chegado á ele?
A esse respeito, penso que já precisamos aprofundar no exercício da Patrícia, “virando o exercício”. Temos trazido nada para destrinchá-lo. Aí? Como vvamos disso para relação com o não representacional? Com os objetos? Como compartilhamos com Patrícia a prática?
Como é que cada um relaciona a questão de Barrio com o trabalho de Patrícia?
Patrícia principia elucidando que , no seu trabalho, evoca sensações. Diz que o corpo tem sensações e as sensações tem força. O trabalho seria uma provocação para estas sensações.
Segundo também, no trabalho, o corpo traduz o objeto, sua textura, sua cor, sua forma, etc. e transmite esta sensação.
Entramos em causalidade e conseqüência. O que causa o movimento como sentido? Não deixando o corpo ir nessa causa? O representacional como busca de significação. O não representacional como busca de não significação. No trabalho realizado,provocado por Patrícia, a causa não é simbólico,ou seja, não é objetivo para algo.
Relato - 12/05

18:58
Um corpo doente.Febril. Estou fora da prática. Mary,Lica, Saulo, Erica, Wilian,Patrícia, Joyce,Clóvis. Estão no espaço para deficientes físicos. Todos já trabalham o material físico.
Aquecimento individual. Livre. Patrícia não propõe a passagem deste exercício livre para o exercício do eixo.Ou seja, ir-se desfazendo do exercício até encaminhar-se para o eixo.
Didi acabou de chegar.19:10.Exercitamos o eixo individual e coletivo. Executamos o exercício de simples mergulhar, no eixo.
Primeiro de cima pra baixo e em seguida, puxando o movimento para frente ,finalizando embaixo.
Pêndulo - espreguiçamento - mola - jogar fora - deslocamento : Patrícia orientou para que todos passassem por estes elementos.
Caminhar de lado - de frente - trás - objetivando com o corpo a direção que se quer ir.
O grupo fora dividido em duplas. Um é o líder ativo, o outro o seguidor, passivo ou receptivo. Ambos caminham pelo espaço. Ao primeiro movimento do líder, o receptor deve reagir com movimento.
Ao decorrer do exercício,Patrícia orienta que as duplas se desfaçam e sejam criadas novas duplas. Ao final, as duplas iniciais retornam, cada uma de sua vez e o grupo assiste o trabalho.
08h.Sala da diretoria. Justificados Nina, Fabiana e Bacelar ausentes, fomos á discussão de Barrio.
Erica principia pelas imagens. As imagens fascinam: "ser fascinado é o cúmulo da distração..."Divide os conceitos de encantar, que tem a ver com manter o olho atento e fascínio , deslumbre e perda de um olho crítico. Fala da imagem como isca para pegar o interlocutor- enquanto fascínio. 'Eu sei que agente se acostuma".Wilian leu. É de Marina Colassanti, achado num livro de Clarice Lispector.
"Movimento é material"
Ás vezes é difícil achar o foco da discussão,mas, a fala de Patricia sobre seu trabalho localizou-me na ação. Patrícia falou do seu trabalho como sensação orgânica do corpo para atingir a neutralidade.
Como atingir esta neutralidade?
o corpo me soou como matéria flexível. O corpo como matéria flexível á essas sensações e apto a transformar-se a cada necessidade advinda destas sensações e vivencias.
o exercício proposto pela Patrícia, no primeiro momento, muito executado em outras práticas,acredito,por todos,mas hoje, com outra perspectiva,pareceu-me conduzir para esta neutralidade que ela mesma e nós todos desejamos perceber.
perceber, primeiramente, o corpo em essência, parece ser o primeiro passo. Direcioná-lo para a função de "matéria flexível", parece ser o 2º passo importante a observar.
Aprofundar nestas práticas, a meu ver simples, nos faz extrair uma riqueza na sensibilização do nosso próprio olhar.
Moacir colocou,acentuadamente, agudamente, sobre a rigorosidade em assumir a condição de neutralidade e não deixar ser possuído pelo que já está impresso. Formulado..Sobretudo, ressaltou, a partir do exercício realizado hoje.
Á Mariana, ressoou como referido ao seu exercício com o Didi, quando extravasando o cansaço latente pela concentração que pede o exercício, deixa vir risos incontroláveis.
Discussão e divergências tomaram a mesa de discussão.
O fato desenvolveu tensão.Criou desconfortos.
Escutar é compreender na fala do outro, o que ele quis dizer
Amaneira como nos dirigimos ao outro, retorna com a mesma intensidade.
No próximo dia 26, Clóvis propõe e direciona um exercício a partir de trabalho realizado em Ouro Preto e que envolve a performance.






RELATO - 05/05/08

Patrícia não veio. A prática se iniciaria por ela. Saulo trouxe Fabiana. Apresentou-a. Não houve relatos. Destrinchamos o capítulo 2 da tese sobre as ações de Artur Barrio.
A partir do referido capítulo, algumas ações de Barrio forma lembradas, como as trouxas lançadas em espaços, sem referência autoral. Discutiu-se sobre a "necessidade do artista em ser reconhecido como autor da obra".Neste caso, de Barrio, a proposta interferia e provocava, sendo até reproduzida, mas, não se sabia naquele momento quem era o autor da obra. Havia uma proposta de negação da autoria. Sobretudo, num momento crítico em que o que prevalecia era o valor ao nome do artista, mais que a obra.
sobre esta linha de pensamento em que o autor não é maior do que a obra, a reflexão sobre as ações de Barco, propõem uma valorização da "vida própria dos materiais, sem a intervenção máxima de um ator". Pois, para Artur, ao contrario da supremacia do corpo sobre o material, estes devem estar dispostos de forma equilibrada,igual, nenhum sobrepondo ao outro. E no caso do corpo, ele torna-se apenas um suporte para o material.Mediante isto, nossas conversas tem girado em torno desta questão. O corpo passa a ser um suporte, ele completa e não dá sentido.Ele se movimenta em função do objeto, e em relação com este objeto.Porém, não se compromete a justificá-se a si próprio nem ao objeto,criando imagens e estórias para serem lidas racionalmente.Racionalidade é do que se despede o corpo, para se permitir ser orientado pelo fluxo do próprio momento, da relação.
Neste sentido, agimos não em função do espetacular. Como colocado em discussão, a ação aqui torna-se independente do espetáculo. A própria ação , no fluxo do material, se confronta com a ação(estabelecida) espetacular,negando-a.
Como é mesmo que não se representa diante dos e com os objetos propostos? Como é que faz isto não ser espetáculo?
Tenho pensado muito em como propor esta realidade, evidenciá-la dentro do universo de interesse.. Como lançar á experimentação, os objetos desta realidade? Mas, percebo que tenho ficado mais no racional e me lançado pouco ás ações concretas, aos experimentos concretos.
Outro dia, no relato da prática aberta dia 14 de abril, descrevi o momento em que Wilian, generosamente, se propôs a auxiliar-me na composição do espaço em que eu propunha. Coloquei como generosa a ação. Mas, não queria deixar de concluir o que havia pensado: que as coisas continuassem a ser dispostas enquanto o público entra. Não é espetáculo. Queria ser visto preparando para depois "interagir". Já que não era o foco convencer ninguém de uma representatividade.
Hoje tocamos neste ponto. Expor a preparação do espaço para o público foi pauta para a discussão. Viciosamente realizamos esta ação de ajeitar tudo, deixar tudo pronto para o público chegar e "mastigar" apenas.
A discussão é necessária e pertinente para a próxima mostra, por que nos convidava a potencializar este lugar e colocar em opostos estas duas situações, confundindo e levando o público-colaborador á percepções,talvez, desses elementos que diferirão uma ação espetacular de uma não espetacular.
O obscena tem orkut:
obscenica@yahoo.com.br!

segunda-feira, maio 12, 2008

Estudos

Belo Horizonte, segunda-feira,... De maio de 2008, no Teatro Marília.

Mais um dia e aqui estamos nós, meninos, meninas, transgênicos, e a textura feminina.
Recebemos hoje mais alguns interessados pela pesquisa do “Obscena”: Fabiane Aguiar, atriz formada pelo T.U ( Teatro Universitário da UFMG), com formação também em Psicologia, dramaturga do espetáculo “ Por Esta Porta Estar Fechada as Outras Tiveram que se Abrir” ( dirigida pela Sara Rojo), o retorno do Cristiano Barcelar, ator ( formado pelo Cefar), bailarino e percussionista, a moça que estava sem voz, bailarina e jornalista, o retorno da atriz Joyce Malta formada pelo T.U (Teatro Universitário da UFMG) e produtora, a primeira visita da moça que estava de blusa roxa ( apresentada pelo Marcelo - acredito que graduada pela UFOP). Esses foram os últimos a chegarem no núcleo de pesquisa. Sejam bem-vindos.

A pauta para esta semana:
1_ Prática com a Patrícia da “Dança Criativa” (que não pôde comparecer)
2_ Estudo de “As ‘ações’ de Artur Barrio: Um modelo não representacional para o ator contemporâneo”, de Merle Ivone Barriga.

sexta-feira, maio 09, 2008

Sobre fevereiro

Sobre 11 de fevereiro de 2008


Discussão do projeto de ocupação do teatro Marília, lembrando objetivos, datas de apresentações e a necessária divisão de verbas. Isto tudo precisa ser pensado e estudado individualmente para a definição de quem estará dentro do projeto, assumindo as suas obrigações.


Sobre 18 de fevereiro de 2008


Uma semana para por na balança e na bola de cristal as perspectivas de cuidados de saúde de minha filha, possíveis cirurgias e a real possibilidade de assumir os compromissos do Obscena. Como a lida diária na profissão materna segue das 6hs até às vezes as 22hs..., questionei minha disponibilidade de tempo, mas principalmente o equilíbrio emocional para atuar e cumprir prazos, com a possibilidade de cuidar ao mesmo tempo de questões cirurgicas... quase abri mão. Mas, ao entrar na sala de reunião e ver as pessoas obscenas, senti uma sensação muito boa que me fez esquecer os empecilhos e ter coragem de andar mais para frente. Percebi que os tais emperrantes eram resquícios de uma mulher que pela força da lida valorosa, necessária e cuidadosa com as filhas, se deixava cair na cilada das opressões do papel da mãedonadecasa.
Assumo meus compromissos com o grupo, dando predominância ao papel de preparadora corporal e propondo uma oficina de dança criativa.
O tema da construção da mulher, a sua educação, parece-me abranger a todos, influencia o que ela é ou se torna: prostituta, esposa, louca..., feminista...


Sobre 25 de fevereiro de 2008


A intimidade da televisão, a passividade, a alienação da responsabilidade, o medo, a proteção pelo parar, pelo receber toda informação sem precisar agir e nem refletir. A esperança de que a exposição do poder paralizante televisivo e midiático caminhe para o seu extermínio, ou para uma suave vivência responsável, dura e ativa, mas antes de tudo expressiva. Arte em ação.
Li o texto “A ação sem idéia” de Krishnamurti.
A turbulência das questões e idéias em mim ser, em mim mulher, em mim arte faz amanhecer o dia seguinte com dois temas, vontade de desenvolvimento coletivo: o funcionamento de um brechó com textos depostos na conversa obscenas; e, a reflexão/criação de uma fábula.

terça-feira, maio 06, 2008

Alguns links sobre o Artur Barrio

http://pphp.uol.com.br/tropico/html/textos/1759,1.shl


http://www.mac.usp.br/projetos/arteconceitual/barrio.htm


http://verbover.blogspot.com/2006/01/artur-barrio-rflexions-no-palais-de.html


http://www.cultura.gov.br/brasil_arte_contemporanea/?page_id=107


http://www.tecnopop.com.br/portfolio_projeto.php?cod=3


http://www.rioartecultura.com/arturbarrio.htm


http://fernando.zarur.com.br/noticia.php?noticia=12

http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u396826.shtml


E por aí vai...

Debruce no Barrio e deixe a Barriga crescer

05/05/2008
Andar pra quê? Se posso ficar parado, Patrícia leu um dia. Ler pra quê? Se felicidade não tem verbo. Discussão causa polêmica e a gente fica tentado a discutir de novo, e a gente fica tentado a saber, e a gente não sabe nada, e as coisas falam da gente, e os textos alfinetam, e sai sangue, e a gente tenta responder, e a gente só tem palavra, e nada serve, e não tem curativo, e nada é, e tudo é passado, e a gente não vê nada, e a gente não vai a lugar nenhum e, no final, com dor, beliscão, casca de ferida, sangramento, arrepio, pneumonia, catarro preso na garganta, a gente se acostuma. A gente acaba se acostumando. A barriga cresce, querendo ou não. A gente se acostuma à falta de Clarice. “A gente se acostuma para poupar a vida”. A gente cola, sente.

Borra de ferida. Borra de café. Barrio de Barriga. Não temos tempo pra terminar opiniões. A água ferve e dissolve o pó antes de dita palavra. Esses artistas deveriam se calar. O silêncio artístico pode ser protesto. Não tem jeito. A gente tem fome e, hora ou outra, acaba comendo alguma coisa para forrar o vazio, o vazio da existência, o vazio da barriga que ronca pra não se acostumar à toa. Como unha não para matar a fome, mas para controlar a aflição e para forrar o vazio...

Aquele monte de gente falando, aquele monte de gente ouvindo, aquele monte de gente preocupado, aquele monte de gente sem entender nada, aquele monte de gente correndo na rua, aquele monte de gente esperando o sinal abrir, aquele monte de gente que não atravessa na frente do carro, aquele monte de gente reclamando, aquele monte de gente querendo dinheiro. Aquele monte de gente querendo a vida, sem saber que ela vai cuspir na cara dum monte de gente. A gente não respeita o que a vida oferece de mão beijada e acaba beijando o pau que o diabo amassou.

Será que Aristóteles tinha pau? E, se tinha, será que foi beijado?

Ansiedade com café corta fluxo de qualquer pensamento. Lado a lado na mesa, todo mundo pode falar. Branco, preto, loiro ou moreno... um dois três. A democracia não é linda? Obscênicos, seguimos sem muita frescura, porque ônibus lotado não respeita bunda de passageiro em pé. O Barrio é instigante, para discutir e para debruçar. A Barriga é grande e não deixa que Descartes. Barriga toca em pontos de cruzamento no Barrio; teatro e artes plásticas. Aliás, os dois são gordos e redondos.

Mudança no cronograma. Prática para teoria. Patrícia não pôde comparecer.

Discutimos.
O material de referência, “As ações de Artur Barrio: um modelo não representacional para o ator contemporâneo”.

Às vezes, juro, sinto falta da escolinha. A professora dizia, era verdade e pronto. Agora a gente não consegue concluir nada. No final das conversas, ninguém disse nada. A gente chuta. E chuta com o corpo inteiro. Ninguém sabe de nada ou todo mundo sabe tudo. “Ninguém é doido. Ou, então, todos”.

Alguns chutes que demos e não vimos onde a bola foi parar:
• Barrio como contra-regra de objetos não simbolizados.
• Distinção entre objeto de cena manipulado por atores e artista conduzido por objetos.
• Abertura da obra inacabada e processual.
• A recusa em transformar processo em obra finalizada.
• Descarnar a realidade encoberta pelas relações simbólicas.
• Preparação do ator (para o espetáculo) e arranjos do artista (para a ação).
• Ação como negação do espetáculo, mesmo que seja espetacularizável posteriormente.
• Exacerbação do tempo nas ações.
• Os materiais finitos e efêmeros utilizados nas ações de Barrio.
• A marginalidade no fazer artístico.
• O lugar do corpo na ação. Sentir e viver o corpo.
• Grau zero de representação.
• Fluxo cotidiano interrompido.
• Questões de autoria.

Para o próximo encontro:
Uma hora com Patrícia. Duas horas discutindo o texto.
Mudamos nossos pontos de apoio. Vamos mudar o olhar sobre Barrio, espero. Se não, a gente engorda encostado mesmo. E os deuses voltam a dizer pra gente que não podemos desejar a mulher do próximo, principalmente se ela for gorda.

Encontros obscênicos privados e públicos

Primeiro encontro com povo: 12/04/2008
Procedimentos: Didi, Marcelo, Érica e Mariana

Meia-noite. Horário sugestivo e sintomático. Bruxas, diabos, vampiros.
Estranhamentos e dúvida na rua.
Desejo e curiosidade na vitrine. Putas, veados, escrotos remexendo-se por carne. À noite, toda puta pare: parda, branca, preta. Todo rebolar tem sexo, pra satisfazer carentes afoitos por coito.
Santa Bárbara na torre. Desfile de liberdade no hall de entrada. Érica age, conta, pergunta, indaga, desafia, sugere, aponta o dedo, literalmente tece. Deixo a pergunta: você quer ensinar algo?
Passagem pelo palco. Hesitação. Sentar e assistir passivo nas caderinhas da platéia. Hábito burguês detestável! Adoro sentar na poltrona e assistir passivo!
Descida. O inferno é o porão, dos outros. Lixo. Enfie a mão no lixo e conte sua história. As narrativas surgem do lixo e, depois de tecidas, pra ele volta. Não me lembro do que estava escrito no papel, mas contei duas histórias:
Primeira: minha irmã, meu pai. Papai judiava, aproveitava e molestava minha irmã mais velha que eu. Ficava excitado. Mamãe sabia e nunca disse nada. Será que tinha tesão nos dois?
Segunda: fui garoto de programa durante um bom tempo. Bom porque não dava muito trabalho e tinha dinheiro para o aluguel. Prostituir com alunos é bem mais caro e pagam muito menos.
Nunca havia contado isso antes. Por que nunca ocorreu? Fim do porão. Palco novamente. Assumimos nosso lugar. Sentamos no alto e o público nas cadeiras. Retorno à forma clássica. O clássico é eterno, li numa camiseta.
Discussão: desastre de imposições ideológicas. Ouvir, ouvir, ouvir. Quase tudo que tínhamos a fazer era saber ouvir. Os ânimos não deixaram. O gay deve calar-se diante do desejo. A mulher constrói e domina o homem. A maioria deve prevalecer e a maioria é heterossexual. A mulher é culpada pela sua própria subordinação. Ser homem-sexual é opção. Todas bobagens que devem servir como material. Mais de uma hora pra dizer o que queria. Sinal de que não dissemos o suficiente.
Impressão sobre o debate: vamos catequizar os índios!



Segundo encontro com o povo: 14/04/2008
Procedimentos: William, Marcelo, Idelino, Clóvis, Moacir

Sete e algum atraso. Vitrine. Manequins esperando o desejo feminino. Instalação no meio urbano. Manipulação de corpos masculinos. Pega indireta, dubiedade intencional. O que é isso? (platéia) O que estou fazendo? (agentes) O vidro que nos separa. A música que nos motiva (influência de Marcelo). Somos clássicos, barrocos, românticos e ridículos. Sob o som que nos protege. Atrás da vitrine que nos impele e impede. Mercadorias à disposição, imagens ao deleite. A sociedade já existe e é mais forte do que eu. Palavras para a proposta: dinheiro, sexo, corpo, desejo, passividade, estranhamento, imagem, instalação.
Sexo na vitrine. Atração imediata. Passagem: do estranhamento ao reconhecimento ao estranhamento. Volta ao desejo. Bunda na vitrine. Acanhamento.
Porão com cacos, champanhe, cachaça, vinho, cerveja, cigarro, chocolate, tecido, água, máscara do diabo e um sujeito. Pomba-gira. Silêncio longo: incômodo. Cômodo de trocas: o espelho atrás do homem. Caminhada sobre o vidro. Aflição. Técnica ou coragem?
Passagem pela Iza invisível. Respeitemos os tempos. Palco. Vazio. Seleção de pessoas aparentemente ao leo. Alguns do agrupamento, uma senhora. Pensei, chame um daqueles marginais ali de boné! Não falei, marquei o tempo. Não interpretem, dizia Clóvis. Ajam, não interpretem, repetia. Quase que único comando. Incômodo. Desconfio, gostamos de ser mandados. Alguém precisa sempre delimitar, explicar, comandar, regular, instruir nossas ações? A boneca. Despachem a boneca em algum lugar próximo daqui. A senhora apaixonada e apaixonante despachou a neta, por perto, porque queria a menina novamente.
Porão de novo. O inferno nos persegue. Engasgar órgãos e vomitar pessoas físicas. Poesia corporal com ânsia de fezes. Garganta profunda e Gangântua carnavalesca. Popularidade da carne. Bruxas e macumbas. Mistura de rito e mito. Ânsia, repugnância, excrementos e sangue.

Discussão madura. Relações e relações com a vida ordinária. Hábitos acadêmicos. Observações pertinentes, observações arrogantes. Comentários. Ouvidos. Não temos respostas, acho. Quando tivermos, acabou o processo. Obscena continua na dúvida para o próximo dia. O indefinido é um lugar. O movediço se instala aí.

Marca: “Isso não parece processo. Isso é um espetáculo”.



Terceiro encontro com o povo: 15/04/2008
Procedimentos: Didi, Nina e Lica, William, Patrícia, Moacir e Saulo

Não vi Didi.
Vitrine: narrativas dos objetos. Objetos que, servidos por mulheres, encenam suas histórias. Movimentos significantes com narrativa fragmentada. Objetos que dão vida aos corpos co-dependentes. Prisão. Textos impactantes sobre o vidro transparente. Imposição de leituras.
Vitrine de manequins. Mais vida, vivência, vontade. Novas mulheres. O bêbado invade, sem pedir licença. Fazer o quê? Não sabemos. Lica deu a cena para ele. E agora o que farei com ela? Cambaleava o tonto. Dançou torto, bêbado, pornográfico, gostoso, dissimulado, baixo, grotesco, tosco. Quem vai chupar meu pau? Quem vai abotoar minha calça? Viado eu não como mais. Ele dizia cheio de amor pra dar. Assisti a dança, encostado na pilastra. Não dancei. Minha dona não quis. Nem eu. A vida é pesada, cômica e fálica.
Vozes com narrativas pessoais. Dança em cena. Insegurança e incerteza. Fiquei escondido mesmo. Por medo, dancei lá em cima. Não desci.
Porão. Na segunda vez não tem graça, ouvi um dos marginais do dia anterior dizendo.
Um travesti desesperado. Grotesco fim de noite. Medo de perder a virgindade com pau nojento. Improvisação. Risco, talvez. Solidão falante, caricatura, sofrimento. Receio de não falar tudo e morrer calada. A cerveja na testa. A vagina na testa. Pau na cabeça e cabeça de pau. Vida dura, rola dura e quase nenhuma opção pra sofrer.

Questões do debate:
Com exceção da vitrine, qual relação com os espaços?
Quais as concepções do feminino?
Como foi a construção dos vários femininos?
Onde está a doçura (irritante) da mulher?
O não-representacional era representacional.
Cadê o ator rapsodo?
Como pesquisar o épico?
Passamos da instalação lá fora para a cena teatral aqui dentro?



Questões e sugestões:
Por que não é um espetáculo? Queremos ou não que seja? Se não, o que faremos com o tempo e o espaço?
Construímos algo? Desconstruímos algo?
Debruçarmos no Barrio.

segunda-feira, maio 05, 2008

Representar e não representar

Nesse encontro dicutimos a análise de Marle Ivone Barriga sobre as Ações de Artur Barrio: um modelo não representacional para o ator contemporâneo. Começamos a dicutir sobre o conceito de materialidade dentro das percepções artíticas de Barrio, em que ele opta por uma obra, desprendida de qualquer tipo de representação. A obra não deve ser fechada ( deve-se valorizar o processo, e só através dessa lógica é que daremos margens aos questionamentos, críticas. Fizemos uma ponte dos conceitos de Artur Barrio com o teatro pós-moderno e levantamos algumas considerações sobre como tirar o caráter hegemônico da narrativa (modelo aristotélico) e igualá-lo e dialogá-lo com outros elementos constituintes do fazer teatral? Como seria estabelecer uma relação entre ator versus platéia, criando signos e quebrando paradigmas? E o espaço, como torná-lo elemento imprescindível para a composição da obra artística, ou seja o espaço como sendo um produtor de sentidos?Pensamos em muitas respostas, mas ainda estamos "crus" nesse assunto sobre o que é representar e o que é não representar! Como, a partir de uma ação, causar reações no especatdor? Como tirar a passividade do objeto e elevá-lo, transgredi-lo, sem atribuí-lo sentido ilustrativo? Qual vai ser o suporte para se fazer uma ação teatral não representacional? Expontaneidade exacerbada, talvez! Mas como? Eis o caminho: buscar dialogar todos os elementos que constituem a teatralidade, no sentido de perceber a consequência dessas ações, e, a partir daí, analisar os signos criados e ver seus possíveis dialogos na relação de ator/espectador. Vários foram as hipótese e questionamentos... eles não se esgotam por aqui. Tem muito pano para manga...

didi

domingo, maio 04, 2008

Encontro Prometeu em flor e mar

06/04/2008

Cheirei as flores de lá e me afoguei no mar de perfume.

Adoro sacos cafonas.

Uma corrida na chuva atrasa alguns. O metrô pára para passar pessoas correndo molhadas faixa amarela afora. Nove e pouco, chego lá. Abraço, café, prosa, Patrícia. Sem sofrimentos nem mau humor. Descemos pra caverna de trabalho, um pouco mais tarde. Ficaríamos acorrentados ou soltaríamos Prometeu? Aquecimentos, alongamentos. Teoria em roda e sem café. O eixo em mim, depois no centro do círculo. A coluna escorrega pra baixo numa parede imaginária. Depois sobe colocada no lugar que seu corpo entende por correto. O corpo comanda, não a idéia nem a imagem. Repetição de vozes. Dividimo-nos pelo espaço. Mover neste espaço espreguiçando, rodando, saltando com a sensação de mola, não necessariamente nesta ordem.
No início, tentei livrar-me dos movimentos codificados e seguros. Não sei se consegui. Por alguns instantes, senti-me completamente imerso no jogo. Não cego, ou em transe absoluto. O corpo queria dizer algo que eu não pensava; tomou seu caminho e foi. Não buscava nada, não tentava descobrir, não havia estratégia. Movimento, movimento, movimento. Somente corpo no espaço, sem interação, mas com inteireza, sem projeção no outro, mas com percepção expandida. Senti meu corpo em negativo, como enxerga o cego. Ouvi meu corpo dizer: não finja, não fuja, não siga, não copie, não arme, não apronte, não erga a cabeça por vontade, não abaixe com permissão, não pense antes de mim, não sorria por vergonha, não abandone o acaso, não reclame por preguiça, não duvide antes do teste, não pare antes de mim. Movia. Antes de mim movia meu corpo, sem autorização, sem licença. Partes distintas guiavam o restante. Como escolher a parte do corpo sem pensar? Primeiro resquício de memória? Início, cabeça. Tonteei, estomago embrulhou, quase vômito. Inveja dos bêbados. Conseguem se limpar por dentro com mais facilidade. Depois, pés. Firmeza sobre o chão, consciência do deslocamento. Pé gordinho, disse Mariana rindo no final.
Não sei o que preciso saber, nem o que escrever depois dessa experiência. Gostaria de dizer exatamente aquilo que escapa, aquilo que a palavra não consegue pegar. Algo contraditório se estabelece aqui na minha cabecinha. Lá, eu movo sem pensar; aqui, eu penso pra mover. As palavras que registram na página não alcançam as dimensões atingidas com flor e mar. Elas, sequer, lembram o que experimentou meu corpo. Registram uma existência, mas sempre de maneira distanciada, simbólica, diriam os psicanalistas e os semiólogos.
Soltei meu corpo, naquele dia. Minha coluna respirou depois de dias. Senti liberdade naqueles cômodos. Nem lembrei de dinheiro. Não quis adquirir imagem de nada. Não reclamei de dívida. Não ouvi rádio. Não vi televisão. Não conectei na internet. Não fiz compras. Não paguei ninguém. Não fui pra escola. Não voltei do trabalho. Não passei na roleta. Não atravessei a rua. Não liguei o som. Não salvei. Não deletei. Exercícios de liberdade?
A roda. Ficamos em roda. Apresentar ou experimentar? Sentir ou pensar? Fazer movimento ou desenhá-lo no espaço? Aquilo que convencionamos como platéia modifica. Exercício de exposição do ego. Mistura de lembrança e abismo. A solidão no centro do círculo encena vivências ao redor. Quem se delicia com o alongamento de um, sofre com o ranger de osso do outro. A platéia acompanha. Ganha e perde. Escorrega e equilibra. Lembrava da platéia e lembrava de mim. Eu tenho que ser bom, pensava com ódio de pensar. Esquecia a platéia e regozijava com o desconhecido. Talvez seja isso: des-conhecer. A roda foi mais forte. Não há como fingir lá, nem fugir de lá. Inútil resistir, inútil fugir, inútil fingir, inútil tudo! Todos foram. Havia obrigação sem saber? Todos queriam mesmo ir?
Cozinha, oba! Comida, oba! Lasanha, oba! Coca-cola, oba! Música boa! Muita coisa ao mesmo tempo. Empolgação do cacete! Falamos, discutimos. Cena 11 esteve no nosso debate. O que significa cair de frente sem apoio das mãos? Significa isso mesmo. Talvez, só isso. Risco de arrebentar o corpo. Nega (Erica, sem acento. Ela mata você, disse Alexandre) Nega disse algo mais ou menos assim: Acho legal o trabalho do Cena 11, mas temos que tomar o cuidado pra não cair no equívoco de pensar que só é possível fazer arte daquela forma. Falamos, comemos, falamos, comemos. Como somos grotescos! Meia hora pra cochilar a bulimia. Ninguém dormiu. Falamos, falamos, falamos. Nega e Mariana falaram sobre homem. Dez mil reais pra quem adivinhar se elas falaram bem ou mal! Mariana falou sobre casamento. Tentei gravar músicas. Queimei um DVD à toa. Que porra!
Voltamos para o segundo tempo. Esquentamos. Bola no centro, juiz com apito na boca. Cada um na sua posição. Começo de jogo: aquecer, alongar, espreguiçar, rodar, circular, etc. e tal. Duplas. Parte do corpo guia o movimento. Espelho. A imagem do outro guia meu movimento. Externo fala, comanda. Roda, breves comentários. Vamos embora. Obrigado, Patrícia. Foi do caralho! Topam de novo em breve?

“Computadores avançam. Artistas pegam carona”. Patrícia trouxe um monte de nego de volta até a rodoviária. Trânsito infernal. Chuva e farol. Cinematográfico. Prometeu retorna à caverna abandonada há horas somente. Clóvis e Mariana sumiram lá pra dentro. Debaixo da marquise que estava debaixo da chuva, eu esperava. Será que fugiram de ônibus?

Insustentável coragem de ser

31/03/2008
Relato vergonhoso. Miséria de tempo.
“Computadores fazem arte. Artistas fazem dinheiro. Computadores avançam. Artistas pegam carona”.
Aquecimentos, alongamentos, planos, plenos. Narrativa com objetos. Os objetos dizem independentemente de nós. Eu preciso dele ou ele precisa de mim? Pra que sacanear com eles?
Descobrir o corpo do outro sem violentar o meu. Subir no outro sem descer de mim. Encontrar o outro sem me perder.
Sinto-me fraco, impotente.
Atuar, agir, não representar. Não há personagem. Então, há desespero. Eu quero um personagem. Não dou conta de ser eu mesmo. Insustentável! Mas por quê? Não me suporto por muito tempo. Não tenho dado conta de esquecer meus personagens, nem de relatar meu fracasso.

sábado, maio 03, 2008

Pós-Marcha

10/03/2008
Mulheres fortes com
Necessidades infindas
Cristiane e Iza
Sejam bem vindas

Sorteio pra casório
Que a mulher não tenha pane
Sejam bem vindas
Iza e Cristiane

A parede da sala de reuniões me avisa todos os dias que é proibido fumar.
Emoções nos relatos lidos: Lica, Nega e Nina.
Lica e Nega (Lissandra e Érica) participaram da Marcha Mundial das Mulheres, ou seja, tornaram prática nossa masturbação teórica.
Cada um leu dois relatórios anteriores. Tenho a impressão de compromisso crescente no decorrer dos encontros. Modificamos o programa previsto; prova de flexibilidade. Ao invés de discutir os textos, conhecemos os espaços do Marília. Nós criamos as normas, portanto parece mesmo sensato que nós as transformemos em nosso favor, que não deixemos as danadinhas nos prender. Regra é um troço fedorento. A gente cria e depois, se não ficar de olho em pé, acaba imóvel e atado com a própria invenção.
Nina demonstrou na prática a importância efetiva dos relatos. Recorreu ao dia 24 de maio de 2007 para recordar como ocorriam os procedimentos artísticos.
Os relatórios mensais. Fevereiro para Moacir. Março pra Saulo e William. Abril com Idelino e Didi. Maio de Mariana. Junho com Érica. Julho para Lica. Agosto de Nina. Setembro para Cristiane e Marcelo. Outubro fica com Patrícia. Novembro, Clóvis e Iza.
Algumas palavras, expressões e frases recorrentes que me atravessaram: brechó de memórias, labirinto temporal, fragmentação do texto, capacidade narrativa, somos irreversíveis e incontornáveis, desejos despertados, o mundo às costas das mulheres, modelo não representacional, dança pura, dança criativa.
Alguém sugeriu outra modificação do organograma. Vamos para um procedimento no próximo encontro. Patrícia guiará o trabalho corporal, com pés descalços, como ela disse. Depois, Érica conduzirá a prática. Para isso, devemos levar uma narrativa, preferencialmente, decorada, para tecê-la a partir dos objetos. Sei que haverá uma caixa e objetos. “Pandora narrativa”, me vem à cabeça esse nome acerca do exercício que Nega proporá. Agora, não sei mais. Recebi um email do Marcelo dizendo que conseguiu convites para a abertura do ECUM. O que faremos na segunda?
Haverá ou não uma pasta-arquivo coletiva?
Procedimento é diferente de experimentação, lembra Nina com tom professoral.
Tema ou forma, em qual dos dois vamos centrar nossas discussões?
Conseguimos uma data para o trabalho proposto por Patrícia: dia 06 de abril de 2008, de nove às dezessete horas, na casa da Érica. Patrícia explicou do que se trata a técnica. Seguem algumas palavras ditas por ela:
O estímulo para o movimento é o próprio movimento. Capacidade do sinestésico. Corpo e movimento como sujeito e como grupo. Trabalho expressivo através de improvisação. Atenção com a participação criadora. Tudo surge do movimento. Ação sem idéia, ou seja, fazer sem pensar antes. Tais falas me lembram o prefácio do livro de José Gil, Movimento Total. Talvez, fique aqui uma sugestão de leitura sobre o tema. Um trechinho do livro: “Só o silêncio ou o vazio permite a concentração mais extrema de energia, energia não-codificada, preparando-a, todavia, para escorrer-se nos fluxos corporais” (GIL, 2005, p.16).
Ah, no finalzinho do encontro, demos risadas com O Manifesto Masculinista.

quinta-feira, maio 01, 2008

Narra(dor)

25/02/2008
Terceiro encontro.
Dias felizes, caras amáveis, corpos enferrujados, dúvidas, ansiedades.
Iniciamos com a leitura dos relatórios referentes ao encontro anterior. Envergonhado, por esquecer a minha opinião trancada na memória do computador, escutei relatos dos demais integrantes. Disciplina e revisão, alertou Lissandra, a Lica. Retorno, esperança, contentamento, manifestou Érica, a Nega. Clareza, desejo de abarcar o todo, descreveu Idelino. Concisão, surpreendeu-me Nina. Poesia, recitou Patrícia. Moacir, Didi, Mariana, etc. etc. etc.
Lidos os escritos, começamos a discutir o texto “O narrador”, de Benjamin. O narrador toma tempo, não quer deixar-se morrer, eu acho. Texto carregado de significações, dispõe-se a várias interpretações, como, de certo modo, a figura do próprio narrador. Houve, durante as conversas, mais questionamentos, observações e referências do que respostas. O que me parece mais interessante, pra usar um adjetivo respeitado. Sem preocupação autoral, seguem-se perguntas que vieram à tona:
• Como recuperar a narrativa?
• Onde no tempo encontra-se o narrador? Por onde anda essa figura?
• Seria singular o meu avô?
• Qual a relação entre fábula e mentira, ficção e realidade, real e imaginário?
• Como contar uma história? Pela “inteireza” de quem narra? Somente ela?
• Em qual medida o narrador interfere na história?
• Qual o lugar reservado ao ouvinte? Na encruzilhada?
• Como atravessar o ouvinte? Através da imagem opaca? Mas, como criá-la?
• E a experiência vivida, em quais lugares e níveis influencia a história e o narrador?

Referências surgiram e seguem aqui aleatoriamente:
“Peixe Grande”, “Hamlet Máquina”, “Uma Vida Iluminada”, “Jogo de Cena”, “Sonhos de Einstein”, “Meia-Noite e Um”, “Mais Estranho que a Ficção”, “Caos Dramaturgia”, “Chapeuzinho Vermelho”, “Branca de Neve”, “A Bela Adormecida”, “A Sociedade do Espetáculo”, “Muito Além do Espetáculo”, “História da Sexualidade”, “Quanto Vale ou é Por Quilo?”, “A Poética do Espaço”, sem a do devaneio, etc. Parece que precisamos, de alguma forma, organizar essas referências para dar seqüência na pesquisa. Alguém disse isso durante as conversas e eu concordo.
Sobre “O narrador”: uns aproximaram o narrador das vidas contemporâneas, através de escassas possibilidades narrativas, quase sempre memoradas; outros preferiram observá-lo de longe, com referências historicamente longínquas para, assim, deslizarmos sobre a escritura de Benjamin. Elevamos pontos do texto capazes de explicar camadas, fragmentos da nossa forma de organização em sociedade hoje.
Diante do anseio de vários integrantes decidimos discutir novamente, em outra oportunidade, o texto “Teatro pós-dramático e política”, de Lehmann.
Patrícia leu um texto bonito, que parecia atacar as idéias quando precedem ou acompanham as ações. Curioso é que o autor condena idéias através de idéias.
Saulo expôs sobre a visita no próximo encontro de representantes do movimento “Marcha Mundial das Mulheres”.
Todos falaram sobre anseios em relação à pesquisa. Confluências emergiram.
Trocas teóricas, desejos práticos. O barco desatracou, mas ainda não atingiu alto mar.
Esqueci algo importante?