agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

terça-feira, abril 26, 2011

MOSTRA OBSCENA



Obscena realiza a 2ª mostra processual do projeto:

Corpos públicos, espaços privados ? invasões no corpo da cidade

Parceria com o CCUFMG,dentro do projeto Cena Aberta.

Quinta - 28 de abril

- KAZA KIANDA
- Classificação zoológica da mulher
Período da Tarde
Onde: Baixo Centro de Belo Horizonte.

- Conversa: 18h às 19h
Onde: Centro Cultural da UFMG- Sala 3 – Rua Santos Dumont, 174

Sexta - 29 de abril

Exposição de pesquisa:
-Práticas artísticas invasivas e coletivas
Horário: 19h às 21h
Onde: Centro Cultural da UFMG- Sala 3 – Rua Santos Dumont, 174



Sábado - 30 de abril

- Encontro Obscena e “Os Conectores”
Horário: 14h às 19h
Onde: Centro Cultural da UFMG- Sala 3 – Rua Santos Dumont, 174

quinta-feira, abril 21, 2011

paisagens sitiantes





espaço: canteiro central avenida santos dumond

tempo: derivativo

movimentação: andar calmamente para o canteiro. giros ao redor dos postes

sensação: tonteira, apreensão, calma, entrega

paisagem montagem: largas vias, espaços vazios entre postes, grandes grades separam os fluxos, um homem olha do outro lado de uma barraca de frutas, automóveis coloridos atravessam em velocidade

texto: "sabe que podemos enquadrar em poluição visual e pichação?" "estou fazendo uma intervenção artística" "bom dia" "vou retirar depois" "tenha um bom dia e um bom trabalho" "qual é o problema de fazer isso? é proibido?" "autorização?"



espaço: rua caetés

tempo: derivativo apreensivo, moribundo

movimentação: agachar, amarrar, olhar, ser olhado; ir até o espaço/ver/voltar para o local de origem

sensação: intimidação, perda de foco, hostilidade, medo

paisagem montagem: uma banca de roupas, uma grande fila espera ônibus, bueiros, carnes, carros e ônibus mal compartilham o espaço, um homem doa sua imagem de costas para o público à toa

texto: "com licença" "se não fosse ele estaria dentro da garrafa até hoje" "espera!" "dentista, orçamento é sem compromisso, dentista" "olha!" "deixa que eu vou"

terça-feira, abril 19, 2011

Da Arte de se perder uma carta...

Foto de Leandro Acácio


Sentir
Escrever
Dobrar.
Deixar
cair
Escorregar
da mão
até o chão.
Respirar...

Invadir
Esparramar
Afeto
no concreto.
Sujar de vida
a cidade bandida
Vendida
Rendida.

Uma carta
a se abandonar.
Será percebida
recolhida
e lida?
Ou pisoteada
rasgada
e varrida?

Uma folha que anda?
Ou como mais uma propaganda
será confundida?

Não há mais como saber.
É uma carta perdida...

sexta-feira, abril 15, 2011

Literatura e conversas no Parque Municipal

"Quando terminaram, e estavam a sacudir as migalhas para se pôr de pé, John pegou o bloco de vidro e olhou-o em silêncio. Charles também o olhou. Mas logo viu que não era uma pedra chata, e enchendo seu cachimbo, disse com a energia de quem afasta um rumo menos sério de pensamento: - voltando ao que eu estava dizendo...
Não viu, ou se visse provavelmente não o teria notado, que John, depois de fitar um momento o bloco, e como que hesitante, enfiou-o no bolso. Esse impulso, também, podia ter sido o impulso que leva uma criança a apanhar um seixo num caminho cheio deles, e a prometer-lhe uma vida de calor e segurança sobre a lareira do seu quarto, deliciando-se com a sensação de poder e benignidade que pressupõe um tal gesto, e acreditando que o coração da pedra pulsa de alegria ao sentir-se ela escolhida entre milhões de outras semelhantes, ao gozar dessa felicidade em lugar de uma existência fria e úmida sobre a estrada.

PODERIA TER SIDO QUALQUER OUTRA ENTRE OS MILHÕES DE PEDRAS, MAS FUI EU, EU, EU!"
(Objetos Sólidos - conto de Virgínia Woolf)

Presente de Matheus para mim e para o Davi, que foi oferecido e degustado numa tarde de encontro e leitura no Parque Municipal de Belo Horizonte. Uma inspiração poética e literária para minha coleta de papéis abandonados nas ruas da cidade. Papéis privados que se tornaram públicos e agora voltam a fazer parte de um inventário particular. Estão guardados e esperam o momento de retornarem à publico através de alguma criação artística.



domingo, abril 10, 2011

A criação de Corpografias Urbanas de Resistência

Na última reunião de quinta, discutimos o texto "Corpografias Urbanas: A Memória da cidade no corpo" da Paola Berenstein Jacques. Um texto que discute as relações entre o corpo cotidiano e ordinário das pessoas com o corpo espetacular da cidade.

A autora descreve a existência de uma cartografia da cidade, que seria como um mapa, o projeto arquitetônico, o espaço planificado e organizado. Nesta cartografia acontecem as coreografias dos passantes e transeuntes, que pela movimentação corporal executam e dançam os passos guiados pelo projeto arquitetônico. Podemos pensar, por exemplo, na dinâmica das ruas: carros e pedestres coreografam o tempo todo: são paradas, fluxos, interrupções, temporalidades, tudo isso controlado e calculado de forma que a cidade funcione. Só que nas coreografias, nossos corpos apenas obedecem às ordens dadas e se repetem numa dança maquinal e numa relação funcional com o corpo urbano.

Mas a autora sugere a possibilidade de uma CORPOGRAFIA: uma experiência de dentro da cidade, uma vivência no corpo urbano, numa movimentação e relação mais singular e afetiva. Uma ideia de inscrição de uma memória no corpo. Uma interação entre corpo e cidade. Abrindo frestas de percepção, podemos experimentar diferentes corpografias no contato com a cidade: medos, afetos, bem-estar, hostilidades etc. Essa escrita (grafia) acontece no corpo e a partir do corpo.

Os estudos corpográficos podem ser realizados a partir de errâncias sobre a cidade. Estas seriam ações de se perder para poder se encontrar com uma "cidade outra", ou melhor, uma cidade que atravessa a corporeidade de quem nela vive. Nestas errâncias o corpo pode experimentar lentidões, acasos, encontros etc. Pode se desorientar para se reorientar sob novas bases ou fluxos de percepção. Haveria aí, de fato, uma incorporação da cidade.

As invasões do Obscena sobre o corpo da cidade têm nos ajudado a perceber isso: a "cidade-dentro" e não mais "a cidade de cima", uma cidade outdoor, asséptica e desencarnada. Mas em nossas vivências temos tocado na pele, no corpo, sentido o cheiro da cidade, sua carne viva e pulsante. As experiências de deriva propostas por Davi, o recolhimento de objetos abandonados nas ruas possibilitando a criação de uma casa nômade e aberta debaixo de uma marquise, por Saulo e Leandro, o garimpo de papéis escritos por gente anônima no chão das ruas da cidade realizado por mim etc.

Leandro questionou algo que me marcou: é possível ser um estrangeiro numa cidade totalmente planificada? Mateus e Davi questionaram se o "se perder" seria apenas espacial ou poderia ser um estado de se perder nas intenções, fluxos temporais ou até mesmo nos espaços já conhecidos?

Uma lembrança: saímos numa deriva, eu, Davi e Leandro. Num determinado momento, Davi pára e sente o vento que passa. Abre os braços e dá forma ao vento. Incorpora uma sensação. As pessoas também páram e olham o gesto estranho de Davi.

São as CORPOGRAFIAS vivenciadas a partir das sensações e afetos individuais que podem de alguma forma romper com as COREOGRAFIAS coletivas organizadas e atualizadas nas CARTOGRAFIAS da cidade.

Um convite a investirmos em corpografias urbanas de resistência.
Quais memórias ficaram ou ficam em nossos corpos da relação com os espaços da cidade? Em quais lugares de Belo Horizonte tivemos experiências significativas?

sexta-feira, abril 08, 2011

Cidade dos Afetos

Hoje de manhã caminhei vasculhando o chão - corpo sujo - da cidade.
Encontrei uma folha de caderno dobrada.
Pensei: tem algo escrito ali. Abri. Que nada!
Folha em branco...
Acho que é a cidade que deseja receber uma carta escrita por mim.

Vou invadir o corpo da cidade com minhas cartas.
Escrever cartas e perdê-las pelas ruas, pontos de ônibus, espaços públicos.
Cartas de carne, de gente, de vida.

Uma invasão silenciosa e discreta.
Incorporação de uma cidade vivida.
Escrever, endereçar e abandonar.
Quem sabe alguém recebe minhas palavras?

Convidar mais pessoas para esta invasão poética: sujar a cidade de palavras e sentimentos humanos.
Em meio a uma cidade de pedra, pode-se, ainda que muito molecularmente e momentaneamente, se experimentar uma Cidade de AFETOS.

sexta-feira, abril 01, 2011

"Cartas perdidas" - Escrita humana no corpo urbano

Na última quinta continuamos a pesquisa psicogeográfica proposta por Davi aos integrantes do Obscena.
Desta vez saí junto à Davi e Leandro. Se há uma proposta de se aliar acaso e intenção, num primeiro momento desejava remover coisas e restos de um lugar para o outro... Trabalhar com os vestígios materiais abandonados na cidade era para mim resgatar um pouco a questão do Barrio. Eu queria recolher coisas (intenção), não sabia o quê e nem onde (acaso) e achava que iria criar uma instalação de objetos recolhidos nas ruas e abandoná-la em algum lugar da cidade.

Saímos e aos poucos fomos entrando no fluxo da cidade. De repente começo a buscar papéis pelo chão e margens da Av. Santos Dumont. Percebo que são sempre folhetos de propagandas amassados e abandonados. Até que encontro um cartão de uma loja com um nome de mulher escrito a mão, letra humana. E me desafio a procurar escritas humanas pelo corpo sujo da cidade. E o mais interessante: começo a achar papéis abandonados com listas de compras, números de telefone, desenhos etc. Transforma -se numa obsessão encontrar escrita humana.

Olhando o chão, vejo que uma moça de uma lanchonete me observa estranhamente. Vou até ela e pergunto onde eu poderia achar letra de gente. Ela se assusta, não entende o que pergunto. Diz que não sabe. Depois pergunto a um camelô que diz que devo procurar nos livros, mas eu insisto que busco apenas escritas e rabiscos humanos. Ele me despreza e vira as costas.

Minhas mãos vão ficando imundas e cheiram mal. Encontro uma pasta de plástico transparente e nela começo a guardar os papéis escritos. A rua é sempre generosa e nos oferece o que precisamos. Nisso vem à minha cabeça: "são cartas perdidas". Fico sem entender e continuo garimpando todo tipo de papel que encontro. Abrindo-os, rasgando-os, tentando encontrar algo.

Agora revejo minha coleção, meu inventário de papéis encontrados na Av. Santos Dumont e um pedaço da Paraná. Ainda não sei porque os chamo de cartas. Talvez porque eu adore escrever cartas à mão. Fiquei pensando: que preciosidade em meio a tantas publicidades impressas que sujam o espaço, eu ainda achar "letras-vestígios" de vida humana. E cartas porque posso achar que elas se endereçam a mim. O fato é que se abre uma possibilidade de uma produção plástica e até dramatúrgica.

Quem sabe um dia eu não encontre de fato uma carta perdida na cidade? Ou talvez escreva cartas e as "perca" em variados lugares, tatuando na pele da cidade uma escrita e uma experiência humanas?