Se para Artaud, o teatro é o espaço do rito em sua esfera metafísica, a ação ritual, portanto, seria aquela capaz de resgatar o mito enquanto executada; considerando-se o ritual como o momento de manifestação do mito a partir de ações físicas codificadas para tal feito.
Assim, o teatro ritual surge como possibilidade de reconexão com as potências vitais, aproximando-nos, ao mesmo tempo, da instabilidade ameaçadora, do risco; atribuindo um outro sentido a palavras como “realidade”, “verdade”, “real”, “vida”, “representação”...
A escola durkheimeana deu grande ênfase à categoria de “representação”, utilizando-a na interpretação de diversos fenômenos ligados à religião, aos ritos e ás cerimônias de diversas espécies. As “representações” são entendidas como categorias que estruturam nosso funcionamento mental. Durkheim dizia que elas são a “ossatura da inteligência”, responsáveis pela estruturação das significações que damos às nossas experiências. A experiência enquanto fato bruto só adquirirá sentido para os indivíduos e para a coletividade na medida em que se articula como representação mental.
Durkheim entendia as representações como construções sociais.
A razão que as produz não é individual, mas social: trata-se do trabalho acumulado de muitas gerações, que cria uma espécie de capital intelectual, transmitido pela tradição. Nesse sentido, a idéia durkheimeana de representação coletiva tem certa proximidade da concepção peirceana de “símbolo”, como signo ligado à generalidade das leis, hábitos, costumes e convenções.
As pesquisas realizadas pelo Núcleo Obscena envolvem asseguradamente uma temática de cunho social: a mulher em seu universo marginal. E a utilização de um modelo “não-representacional” como vértice prático de tais pesquisas, sugere, de certa forma, uma busca por uma outra forma de representação, deslocada do sentido convencional. O signo social aparece embutido como alfabeto na tessitura de um código da cultura da margem, privilegiando a construção simbólica da temática cujas imagens deveriam denunciar a representação como um duplo codificado do real, e não a realidade itself, como ela é.
Sendo assim, penso no vômito.
O vômito é a expulsão forçada da porção inicial do intestino ou da boca do estômago.
Uma pessoa ao vomitar, pode eliminar alimentos digeridos ou não digeridos pelo organismo e também saliva, suco gástrico, bile e suco pancreático.
O vômito pode ser provocado por enjôos ou pela gravidez, infartos, remédios com efeitos colaterais, como os remédios utilizados na quimioterapia, infecções alimentares e gastroenterites agudas.
O vômito como ação surgiu como parte de minha investigação durante uma prática realizada no dia 25 de Março: o primeiro trabalho prático do ano para o Núcleo. A ânsia era provocada por membros de uma bonequinha de plástico mutilada dentro de um prato de metal. A isso adicionei groselha, no decorrer das práticas, que é um elemento que vem sendo utilizado por mim desde o ano passado.
Em suma, trata-se de um devorador de mulheres, um pregador acometido pelo pecado da gula.... e por que não: Cronos?
É possível fazer uma aproximação de conteúdo simbólico entre estas imagens. E é justamente a ação que me resgata o mito. Cronos come os filhos e depois os vomita.
Este homem mastiga membros femininos e tenta engoli-los até o momento da ânsia. Por enquanto, ainda não vomitou, mas talvez não demore muito. Está empenhado.
E, obviamente, as ações não estão sozinhas nesta aproximação.
É evidente que a relação de Cronos com seus filhos é diretamente proporcional ao papel social do homem diante da mulher. Mulheres representam uma ameaça numa sociedade predominantemente machista. Precisam ser engolidas.
Afinal, 52% da população mundial são mulheres, os outros 48% são seus maridos e filhos.
A ânsia é o vômito iminente. E não escapa da possibilidade da representação mítica de um costume transmitido por gerações: os homens devem se sobressair às mulheres, sempre. E se a sociedade contemporânea os coloca diante de uma realidade inesperada, a de que as mulheres estão virando o jogo, uma atitude precisa ser tomada.
É necessário mutilá-las, massacrá-las e engolí-las. Reduzindo-as ao seu lugar de bolo alimentar da cultura machista.
2 comentários:
Puta que pariu , essa foto tá foda! Estou pensando duas vezes antes de abrir o blog. Estou perdendo até a vontade. Só podia ser você mesmo, né Moa , pra colocar essa foto bizarra e nojenta...Beijo sem vômito.
Fica brava não, meu bem. Uma boa imagem pode ser mais potente que qualquer alfabeto... sua reação é prova disso. Fico feliz, está reagindo... Grandes beijos.
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