agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quinta-feira, agosto 28, 2008

retiro de queixa ou nada a ver

25/08/2008

Não sabia o que fazer. Não havia o que fazer. Poderia fazer tanta coisa. Perdido. O tempo não me deixa terminar com as coisas. Encontro. As pessoas no palco. Parece que vamos fazer Shakespeare. Vou me trocar, disse Lica. E eu? Acompanhar o procedimento do outro. Esquivo, preguiçoso, desonesto! Acompanhar por opção é diferente de acompanhar por falta. “Faça o que fez em outro espaço”

Pessoas. Montar e desmontar na rua. Vamos lá. Construir e des- na rua. Cada gesto, cada palavra, na rua. Na caminhada uma pessoa montada por objetos. Aqui! Meu corpo se transforma. Quimono, camisa, calça, cueca, calcinha. Corpo, cabeça. Caminhada. Comentários. Povinho chato! Sinto falta do coletivo na rua. Qual a noção de coletivo do nosso agrupamento? Não sei responder.

Praça pública. Gente caminha, gente corre. O que fazer por queixar? Sou retirante, literal. Medo, frio, incerteza do retiro assombra. Em vários aspectos. Vou embora. Toda partida é sempre (de) verdade. O que fazer com o que ainda não foi? Dar. Vender. Mostrar. Despedir. Vou, quero ir. Fico, quero ficar. Aprendi demais no pouco tempo. Sede de mais. Cede de mais. Sede demais. Aprendi demais com as pessoas. Aprendi que há pouco risco no teatro de risco. Aprendi que execução não serve sempre na vida. Aprendi que pesquisa toma corpo. Aprendi que forma forma forma. Aprendi que propor machuca. Aprendi que escrita preserva o instante. Aprendi que caminho tem fortuna. Aprendi que o buraco é mais embaixo. Aprendi que censura muda o nome. Aprendi que saber é um estado. Aprendi que o alfinete atravessa a pele. Aprendi que o teatro anda chato. Aprendi que oferenda custa caro. Aprendi que se dá. Aprendi sobre sexo, amor, paciência, ansiedade, respeito, brabeza, preguiça, ligação, contorno, registro, encontro... Aprendi que não sei o que exatamente fazer. Nada a fazer hoje. Nada a ver.

Falei. Nasci para a fala, à noite, na rua. De cara com faróis, buzinas, motores. E agora? Agora digo. “Olha a calcinha!” “Olhe a calcinha!” Meu corpo disse antes de mim. O susto respirou. Surgiu no sinal, como surge o vermelho, o verde, o amarelo. Mas, na rua, ninguém obedece a calcinha. Carros atropelando. Não há átimo depois que o símbolo permite ir. Motores aceleram sob ordens do símbolo social. Se deixar, eu vou. Há de ser polido diante do símbolo. O símbolo é mais forte que eu. Todo símbolo é foda. O símbolo silencia, ele faz calar. O símbolo amadurece. O símbolo é o pai. Quero falar, deslocar o símbolo, signo. O símbolo ensina, molda, malha: professor! A fala corta, desvia, talha: profeta! Queria falar, cantar, dançar. Palavra, gesto, movimento. É muito! Atrevido! (risos)

“Olha a calcinha! Olhe a calcinha! Olhe pra calcinha! Olhe na calcinha! Olhe com calcinha! Olhe de calcinha! Para o tio! Para a tia! Olhe a calcinha! Tem nova! Tem usada!” Quem ri, olha. Quem vê, não compra. Quem quer, não manifesta. Mas a fala persegue sem descanso, sem ataque, sem revanche, ela atravessava e vai, em busca de outro lado das máquinas. Tentei catar cada palavra, cantar à transparência das calcinhas.

Nina me presenteou. “Diante da palavra”, Valère Novarina. Cheguei em casa e li assim na página dezenove. “A fala não se comunica como mercadoria, como bens, como dinheiro, ela se transforma, ela passa e se dá. Viva de um a outro, a fala é um fluido; ela passa entre nós como uma onda e se transforma por nos ter atravessado. É o dom de falar que se transmite; o dom de falar que recebemos e que deve ser dado. O dom de abrir por nossa boca uma passagem respirada na matéria. O dom de abrir por nossa boca uma passagem na morte”. Precisava ler isto. Não é coincidência. Ela sobre o que fez.

A morte novamente. A morte é o lugar comum. Toda arte tem um pouco disso e daquilo. Os seguranças da Liberdade se aproximaram:
O que é isso? Isso o quê? Você vende calcinha? O que você acha? É protesto? Qual sua intenção? Você estuda arte? Você estuda? Você fez faculdade? Você fez? Como é seu nome? Sua roupa é ritual? É seita? A calcinha é usada? Já disse demais. Querem entender. Posso fazer foto? Retorno à imagem. Querem capturar. Ídolos e mártires.

“Você conseguiu sua intenção: provocar interrogação”! (risos) Preciso continuar.

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