agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

sexta-feira, setembro 19, 2008


Estado OBSCÊNICO dia 18 de setembro de 2008 (9910-181-91-10-1).

Hoje, uma quinta-feira chuvosa e fria, após o trabalho chego em casa. Um chá para aliviar um estômago cansado. Um convite para ver um documentário: ‘Meninas’, de Sandra Werneck. Quatro meninas do morro dos macacos na rocinha. De 13 a 15 todas estão grávidas. Os pais: um traficante; um estudante; um ex-avião, pai de dois por sinal. Escola? Lazer? Trabalho? Nada. As meninas são responsáveis pela casa e pelos irmãos mais novos. Os rapazes ou estão no crime ou estão em subempregos. Não há perspectiva. É o ‘mercado da buceta’ imperando seu ‘modo operante’ – fabricação de mão de obra barata, alienada e que permanece em faixa etária ideal para a manutenção do mercado. Rapazes morrem cedo, as meninas produzem filhos anualmente e muitas vezes de pais diferentes. A mais nova das entrevistadas é viúva aos trezes anos. Não que nesta idade minhas avós já não estivessem de mãos entregues a rapazes para se casarem em breve e minha bisavó com esta mesma idade já estava a um ano de se casar com um primo de segundo grau com 23 anos. Mas, o que se passa é mais delicado. São meninas que desejam ter filhos para serem reconhecidas como seres humanos. Elas desejam ser mães para terem uma cama para si e o filho, para terem comida a mais, para terem o título de mãe. Elas não têm condições de escolher uma profissão, logo querem ser mães. Esta realidade existe a alguns quarteirões da minha casa. Passo de ônibus e vejo meninas a andar com crianças pelas mãos, no colo, no ventre. Não brincadeira mais, elas não têm o direito de sonhar e ser alguém, alguém que realiza algo mais que cuidar e procriar. Imagem estagnada da mulher. Da função e do exercício pertinente a entidade social feminina. Daquilo que o sistema reserva a mulher. Enfim, a mediocrização da mulher ao longo de séculos. E agora deparamo-nos que esta realidade.
Sinto-me revirada por dentro. Três partos são filmados. Um uma violência. Sinceramente, é uma violência. Três cesáreas e um parto normal. Meu ventre chega a doer. Doer. Reviro-me no sofá. É triste vê-las sair do hospital cansadas, felizes e sem a menor idéia do que as espera. Os pais tensos, sem dinheiro. Casas apertadas. As irmãs mais novas seguem o mesmo caminho e treinam sem cessar ao longo do dia: imitam os cuidos com as bonecas. O gesto se prolifera. A função se apresenta e se representa na brincadeira. A imagem se estagna, ao longo de anos ela é repetida às meninas mais novas e por estas assimiladas. O que fazer? Quando percebo no procedimento mesmo da ‘brincadeira de casinha’ os corpos são dóceis aos objetos, nos os acatamos com nossos gestos. Claro, somos mulheres conscientes e em exercício de nossa feminilidade e mesmo assim somos dóceis.
Ozana já nos falara dessa realidade quando nos encontramos no início do ano. E hoje sinto o mesmo engasgo, ou hoje sinto mais? Sim. Eu sinto mais. Isto é mais real. Percebo mais claramente o que é programado em mim e tendo lidar com isso todos os dias. Este é meu exercício performático: escapar do ‘mercado da buceta’. Reconhecendo diariamente os meus gestos repetitivos, minhas ações programadas, meus momentos de ausência, de displicência diante de mim e da minha feminilidade. Puxo o períneo respiro fundo e sigo em frente. Sempre adiante.
.SARAVÁ.

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