agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quinta-feira, maio 05, 2011

Mostra Obscênica: da agressão ao afago

A mostra do Obscena na semana passada foi muito interessante. Uma oportunidade de vivenciarmos as pesquisas de cada artista ou de pequenas parcerias dentro do Agrupamento e assim podermos trocar impressões, criar provocações e apontar as potências e as fragilidades de cada proposta.

Na quinta habitamos a Kasa de Saulo e Leandro e pude observar o impacto e estranheza sentidos pelas pessoas que se deparavam com uma moradia em pleno passeio público da Av. Santos Dumont. Lá sentamos, conversamos, comemos e por alguns momentos interagimos com pessoas que paravam para tentar entender o significado daquele espaço. Afinal, foi uma instalação que confundiu um pouco as pessoas, isso porque ficou "entre" um lugar de moradores de rua ao mesmo tempo que era habitado por jovens belos e bem vestidos...

Ficamos algumas horas na Kasa dos meninos e para mim os melhores momentos foram a montagem da casa, a visita de um casal de Ibirité que parou e se sentou para tomar um café e acabaram contando um pouco da vida deles. Pensei na importância da GENTILEZA URBANA.

Mas acho que alguns lugares e usos da kasa não foram experimentados. Pedi para sentar numa poltrona e colocarem o mosquiteiro e além de ser uma delícia ficar ali e olhar a cidade com um véu, acabou por puxar ainda mais o olhar das pessoas... Se Saulo e Leandro inclusive fizeram lindas fotos deste "canto" da casa, que eles mesmos já haviam vivenciado, por quê não nos convidaram para ocupar ali? Nina falou que seria interessante ter momentos de RUPTURA no cotidiano da instalação. E mais: como seria esta kasa na Savassi, região nobre e burguesa da cidade? Será que os meninos conseguiriam instalar a kasa nesse lugar tão fashion? Se o nome do trabalho é KASA KIANDA, temos aí uma bela provocação...

Depois acompanhamos a ação de Nina e Lica com as classificações zoológicas da mulher na atualidade. Que trabalho provocativo! Fui seguindo a dupla e pude perceber algumas coisas. Depois de uma hora testemunhando a força da intervenção, me sentei num ponto de ônibus e escrevi:

" Estou num ponto de ônibus na av. Santos Dumont. Sentado. Nina e Lica acabam de sair daqui. O que percebo? Constrangimento, confronto com o espaço e com as pessoas, jogo das performers com o que acontece e com as reações inesperadas, qualidade de presença delas a incomodar o espaço dando-lhe um tônus diferenciado, desconcerto, traz discussões e incomoda mesmo... Mulher vaca, cachorra, e o que mais? Um certo mal estar nas pessoas, reafirma o veiculado, mas de uma forma crítica e agressiva. A presença delas incomoda porque destaca o espaço, esse se transforma num lugar cênico, e as reações das pessoas são observadas por todos. QUEM OLHA É TAMBÉM OLHADO!"

Logo depois, já quase perto da Rodoviária, um rapaz, um macho enlouquecido, rasga a placa de Nina e aí um acontecimento se cria. A ação interrompida se transforma numa ação de protesto e o rapaz passa a ser perseguido pelos integrantes do Obscena. Muitos gritos, palavrões, acusações, fazemos um grande barulho e o moço se assusta com tamanha repercussão... Uma prova (meio assustadora) de que a ação afeta de verdade e que traz riscos, já que estamos na rua e temos que lidar com todo tipo de gente... O macho enfurecido, agora constrangido e perseguido, entra num shopping popular e desaparece. Nós voltamos exaltados com a agressão talvez desejada, mas não bem recebida por nós... Nessa volta, quando não mais focamos na ação, outra ação acontece, já que essa caminhada é estranha, quem volta é uma mulher deformada por enchimentos de borracha, não mais uma mulher animal...

Na sexta, na sala 3 do Centro Cultural da UFMG, a noite, expus um pouco da minha pesquisa sobre as práticas de intervenção coletiva e de invasão na cidade. Relatei, analisei e mostrei imagens de duas ações coletivas que propus nos últimos meses: 'Somos cores e formas na cidade" e "Cidade dos Afetos". Também trouxe reflexões e diálogos com teóricos e estudiosos como Michel de Certeau e Marc Augé. Foi mais uma possibilidade de trocas e impressões.

No sábado, último dia da mostra, tivemos a presença do coletivo OS CONECTORES com o Rogério, André e Cris e juntos realizamos duas ações interventivas: "Pescaria no Arrudas" (proposta por eles) e "Cidade dos Afetos" ( a escrita e abandono das cartas, proposta minha e do Obscena). Conhecer o trabalho dos Conectores foi muito bom, principalmente um pouco do processo criativo deles. Há uma crítica muito forte deles à sociedade de consumo. E a pescaria no Arrudas foi um evento bárbaro, pura provocação à cidade, tem humor, inteligência num convite de pesca num rio contaminado e cada vez mais "escondido" pelo Poder Público.

Perder as cartas decoradas, pintadas e escritas por tantas mãos, foi mais uma aventura. Lugares onde a ação ocorreu: avenidas, passeios, rodoviária, telefones públicos, bares, parabrisas de carros, praças etc. Foi um derramar afetividades numa cidade às vezes tão árida. Breve pretendo relatar mais detalhes dessa grande ação e corrente coletiva. Uma intervenção frágil, singela, transformadora, que deseja comunicar sentimentos humanos e afagar as pessoas e os espaços.

E assim, entre agressões e carícias, invadimos a cidade....com desejo de mais vida, cores, formas, provocações, mais pulsações, mais encontros públicos, privados e humanizados.

2 comentários:

Nina Caetano disse...

ai que bom, clóvis! estava sentindo falta de um olhar sobre a mostra, de alguém que acompanhou tudo... bacana demais, valeu!

Saulo Salomão disse...

clóvis, fico vendo o quanto estamos trabalhando, como as coisas tem girado, essas cartas, percorrendo tantas mãos, de lugares diferentes e com destinos incertos, cada letra uma vida, cada palavra um aprendizado, cada desenho um desabafo, flores.