agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

quarta-feira, março 19, 2008

Relatos Obscênicos de Erica Vilhena, a Nêga.

Relato(´rio) Obscênico – 17/03/2008
Hoje ela colocou um vestido preto com alças brancas. O tecido é trabalhado e debaixo dos seios ele se abre em cone, realça seus quadris e _sinto-me bem. Passa na Tupinambás, onde há muito tempo comprava ritualmente caixas de BIS, _naquela época ainda nem tinha o branco. Entra e seus _meus 14 anos se fazem naquelas prateiras, naquele cheiro doce misturado a tinta no papel dos enfeites de aniversário. Compra duas caixas de BIS, sendo que hoje ela pode pegar uma branca e uma preta. Sobe a Bahia novamente. Ao pé da escadaria há uma mulher, carrega sacos de lixo e arruma sua rua alargada pelos dias na rua. Há também um homem se ajeitando na escadaria, ambos se resguardam como podem _é, e será mais uma noite na rua. Ultrapassa o Palhaço das Artes e _me dá uma pipoca de um real. Ela sorri para aquela senhora que já tem poucos dentes na boca e pensa em como ela deve saborear sem garras afiadas. Saliva. A senhora coloca muito bacon, seu estômago fica feliz à ação da mulher com buracos no sorriso. Apanha do saquinho dá boa noite e sobe a Alameda feliz da vida. O vestido é longo e solto _ solto-me nessa roupa e nessa noite. Alcança as escadas. Entra no saguão e Crovito está encostado ao corre mão, está sério. _cansado? Lica, Moa e Cris sentados no chão, calor. Ela come e conversa.
‘_ são flores Nanã, são flores, são flores Nanã Buruque, são flores Nanã, são flores do seu filho Abaluaê. Nas horas de agonia quem é que vem me valer é seu filho Nanã é meu Pai ele é Abaluaê, é seu filho Nanã é meu Pai ele é Abaluaê.’
Entraram para sala de reunião. Sentaram-se e Lica já deposita na mesa a guloseimas a serem repartidas entre nossos paladares. Ela retira da bolsa a caixa do preto e oferece também o seu bocado. _é só falar no diabo e ele aponta o rabu... Saulo adentra a sala sorrindo, seus olhos brilham constantemente. Ele e Crovito trocam seus habituais lisonjeios e ela sente-se friccionada com a cena. Sorrisos no ar. Iza chega. Maroca (Boboca) também. Começaram a ler os relatórios. Ela já havia lido o de Moa pelo blog. Mas antes, Patrícia com seu sotaque paulistano e sua voz grave e tensa, fez a seguinte pergunta _e esta entrou em mim como uma lança me remexeu e por isso percebi seu valor e pertinência: _qual a razão de sairmos de nossa empreitada semanal para irmos assistir a abertura do ECUM? O que buscamos num grupo de dança quando nos dispomos a assisti-lo? De cara ela respondeu: _bem, Patrícia, meu objetivo é conhecer o grupo. Creio também que irmos a esse tipo de evento funciona como aditivo à nossa comunhão. Fortalecemos nossa imagem de agrupamento nesses agrupamentos. Enfim ela tem que pensar mais e mais nessas questões levantadas.
Crovito abre a sessão: pode o ator engajado suscitar tal ação no espectador? Para fundamentar tal questão recupera a imagem de Lica com a porta nas costas, uma experimentação do ano passado quando a Maldita ainda tinha essas mulheres em sua companhia. _ perderam, que pena! A mulher que não se desliga do doméstico? A mulher que mesmo exaurida não larga o lar a esmo. A mulher que vive a favor e em benefício do lar. Erica toma para si essa questão, mesmo porque hoje recebera um email do homem que a acompanhava até então dizendo-se muito incomodado em reembolsá-la os valores pertinentes à decoração+organização+fundamentação que promovera em sua residência. Nesse momento, Erica teve a extrema vontade de mandá-lo enfiar tudo pelo rabu, mas não. Ela simplesmente não mais reconhece esse lar. Esse lar de dois sozinhos. De dois que não agiram em comunhão.
Idê pega a bola e desencadeia suas idéias e apontamentos. Ele gosta dos textos de Erica. Acho que é porque ela é de Iansa, ele tem uma queda. Seus relatos são também exercício de narrativa, mas uma narrativa que não dispensa informações precisas de quem conta e não se esquece de ‘dar o ponto sem nó’.
Patrícia. _Ufa! Erica sente-se aliviada, pois sente o aliviamento dessa mulher. Primeiro se envergonha do tamanho de seu texto. Deseja selecionar o que seria compartilhado com os demais. _lê tudo. Permita-me comungar de si, da sua feminilidade!?
VERGONHA+TEMPO+MÉDICOS+FILHASGÊMEAS+BARTIRANECESSITADEMIM+ EUNECESSITODEMIM+OBSCENANECESSITADEMIM=CULPA POR NÃO SER MULTIPLICÁVEL. UMA MULHER ONIPRESENTE E ONISCIENTE. ‘VERGONHA, ESCONDERIJO DA CULPA’!
Saulo trabalhou concisa e objetivamente. Apontou verbos e adjetivos que nos nomeiam. Erica acha Saulo um menino bonito, jovem e disponível. Mas reconhece sua pertinente ansiedade. _acho que ele se chateou comigo. Peço desculpas mas digo que sou e sempre serei muito sincera, por favor responda-me sempre à altura da minha chatura.
Maroca me fez brotar água nos olhos. Sua descoberta diária de estar grávida e seu exercício de se tornar mãe. Esse reconhecimento ainda vem mais do outro que de si. Sua barriga ainda forma-se. Aluísio é o pai pata choca. Maroca tem jogo de cintura. Ganhou roupinhas pro bebê. _Peço que esse novo ‘ser’ venha com muita saúde. É uma dádiva vê-lo se formando em minha querida companheira de existência feminina.
Cris questiona e solicita os meios e comos que podemos criar para nos COMUNICARMOS com aqueles que irão receber nossas ações.
Iza não se colocou. Erica foi mais uma vez cruel em seu comentário: _amanhã a senhorita pode não estar viva viu!?
Bem, é um fato possível uma vez que todos irão morrer. Mas ela disse isso no intuito de dizer: _faça hoje porque amanhã é ainda depois de hoje, há tempo e ele deve ser utilizado em prol de nosso crescimento.
Lica reverbera emoções ações da Marcha. Estão inquieta. Quer sair da sala de reunião. Esse formato que formata. Enquadra e assenta. Devemos ir para a prática.
Fica marcado então na segunda-feira, dia 24, às 19h no Marília o trabalho de Patrícia – aquecimento – e Erica – procedimento.
Salve nossas forças.

2 comentários:

Clóvis Domingos disse...

érica, como vejo você entregue e engajada nessa escrita!!!!! é simplesmente maravilhoso!!!!!!é isso aí: se colocar, deixar bater e reverberar e produzir dentro da nossa singularidade e verdade....
A impressão que você me passa é de uma mulher descobrindo o que é ser mesmo uma MULHER, com tudo o que isso acarreta. Vejo-te corajosa, se revendo, se expondo, se buscando, se individuando a partir de um coletivo criador que é o OBSCENA.
Érica, não nos enganemos: é obscenidade demais se procurar, se questionar, deixar doer, pra nascer aquilo que é só nosso....Tenho orgulho da mulher que você é, deseja ser e a cada dia será......

Erica, a Nêga Regina. disse...

Obrigada Amigo Querido! De fato é extremamente doloroso enfrentar minhas/nossas feminilidades...Mas, creio que não evolução sem rompimentos, não há transformação sem feridas... é a vida. e é bunita é bunita, viver e não ter a vergonha de ser que você é!
Força e fé a nós OBSCÊNICOS!