agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

sexta-feira, julho 12, 2013

Cadeiras: diários d'A Ocupação

No dia 07/07, o Obscena Agrupamento participou d´A Ocupação, evento "chamado" pelo GT de Cultura e Arte da Assembléia Popular Horizontal que, desde sábado, 29 de junho, ocupava a Câmara dos Vereadores da cidade de Belo Horizonte. Muitos artistas atenderam ao chamado e nós, do Obscena, realizamos duas intervenções: Lambe-Lambe e Cadeiras, com a participação especial do obscênico enrustido Admar Fernandes e da performer Carolina de Pinho.
Para Cadeiras, neste dia, optamos em trabalhar com leituras relacionadas diretamente ao nosso momento político, leituras para um "levante". Utilizamos poemas da antologia de poetas neo-barrocos, Vinagre, obras de Hakim Bey, Artaud e Nietzsche, além de notas da Assembléia à população de BH. Abaixo, foto-montagem (fotos de Wagner Alves de Souza) da ação, com alguns dos textos lidos nesse dia. 


OPUS OPERA  
Opusilânime  
O governador é membro  
da Opus Dei Cacetada,  
Opus Dei Spray de Pimenta,  
Opus Dei Tiro de Borracha e da  
Opus Dei Bomba de Gás Lacrimogêneo. 
Depois de seu impeachment  
ele poderia fundar  
a Opus Dei Motivo,  
Opus Dei chilique,  
Opus Dei Mole,  
ou Opus Dei Azar.  
De todo modo, você já  

Opus Deu, Chuchu.  
OpuSalmo  
É Opus Dando que se recebe  
OpuSamba  
chegou a hora dessa gente  
diferenciada vândala e  
cheiradora de vinagre  
mostrar seu valor  
Opusalada  
a pergunta que não quer calar:  
voce é Pimenta ou Vinagre?  
Opus Day  
Se hay gobierno, soy…. Impeachment!  
Já deu, picolé de chuchu.  
OpuScience  
agora é a PP “polícia pacífica” 
contra o VVV “violentos vândalos de vinagre” 
PP x VVV de que lado voce samba?  
Opu S. O. S.  
EXISTE PAVOR EM SP  
Opus Ó pus  
Geraldo Alckmin:  
pergunta aí como se diz impeachment em Francês. 
Haddad:  
larga o camembert e pega o avião! Aqui tá Russo, Mano.  
Opuscúlo  
Será que agora a mídia vai dar a cara a tapa? 
Olho por olho de jornalista: 
quem é vândalo, os manifestantes ou a polícia?  
*  
OpusCopa  
A Copa das Como fedem as ações       
Beatriz Azevedo (Vinagre)





Nota da Assembleia Popular Horizontal acerca dos recessos de serviços prestados pela Câmara
Belo Horizonte, 06 de julho de 2013.

Apesar do esforço dos ocupantes da Assembleia Popular Horizontal em conversar com a mesa da Câmara Municipal, como temos conversado com o poder público, não houve interesse por parte dos vereadores em dialogar. Deixamos claro que nossa relação com os funcionários e seguranças da Câmara é bastante cordial e cooperativa.
 Informamos que em 29 de junho, dia em que foi votada em regime extraordinário a isenção do ISS das empresas de ônibus, os vereadores decretaram recesso das suas atividades.  Pedimos o esclarecimento da Câmara de Vereadores sobre a razão da liberação de parte do poder técnico administrativo e de serviços básicos oferecidos, como o Restaurante Popular, emissão de carteiras de identidade e Internet Popular quando há a nítida possibilidade que câmara continue a trabalhar normalmente.Também pedimos a revisão rotineira do bebedouro, que está sem possibilidade utilização.
 Não houve resposta alguma por parte da mesa diretora, que se recusa a conversar com a Assembleia Popular de Belo Horizonte. Isso tudo reproduz o modo como os vereadores e instituições lidam com as demandas da população!

Assembleia Popular Horizontal de Belo Horizonte

Poder para o povo!    




Aquele que atinge seu ideal, por isso mesmo o ultrapassa. [...]     É desumano bendizer aquele que nos amaldiçoa. [...] Oh! Meio-dia da vida! Hora solene! Oh! jardim de verão! Felicidade inquieta, de pé na ansiedade e à espera; Espero meus amigos, pronto dia e noite. Onde estão meus amigos? Venham! É tempo, é hora! (Além do Bem e do Mal: Nietzsche)















A RRUA
absurdo
abmudo
abism'undo
tem hora que o silêncio é cheio de gritos.
tem hora que o grito maior é o silêncio.
é que a rua agora
tem perna
tem punho
tem pulso
e pulsa
e empunha
e marcha:
é a rua.
vira a esquina
bate com a cara num muro duro
escuro
que é falange
que é falácia
e tem sempre razão
uma razão que é fogo, ferro, canhão.
aparelho de manutenção
− ordem! moral! algema!,
golpeia!,
− protege!
silencia com relâmpago e trovão.



troveja
apavora
e a rua chora
e não é por vintém.
pode ser tristeza
pode ser horror
pode ser pimenta
pode ser ciência
com a ciência de que tudo é dor.
a rua chora,
mas oferece flor.
o muro para,
mas o mundo cai.
o mudo cai:
a rua dá seu grito
− de guerra!,
não , não é.
o grito da rua
só é de guerra quando a guerra
é o maior grito de paz.
Danielle Takase (Vinagre)



Dito isso, pode-se começar a extrair uma ideia da cultura, uma ideia que é antes de tudo um protesto. Protesto contra o estreitamento insensato que se impõe à ideia da cultura ao se reduzi-la a uma espécie de inconcebível Panteão - o que resulta numa idolatria da cultura, assim como as religiões idólatras põem os deuses em seus Panteões.
Protesto contra a ideia separada que se faz da cultura, como se de um lado estivesse a cultura e do outro a vida; e como se a verdadeira cultura não fosse um meio refinado de compreender e de exercer a vida. Pode-se queimar a biblioteca de Alexandria. Acima e além dos papiros, existem forças: a faculdade de reencontrá-las nos será tirada por algum tempo, mas não se suprimirá a energia delas. (O Teatro e seu Duplo: Artaud)







No Oriente, às vezes, os poetas são presos - uma espécie de elogio, já que sugere que o autor fez algo tão real quanto um roubo, um estupro ou uma revolução. Aqui, os poetas podem publicar qualquer coisa que quiserem - o que em sim mesmo é uma espécie de punição, uma prisão sem paredes, sem eco, sem existência palpável - reino de sombras do mundo impresso, ou do pensamento abstrato - um mundo sem risco ou eros.
A poesia está morta novamente - e mesmo que a múmia do seu cadáver possua algumas de suas propriedades medicinais, a auto-ressurreição não é uma delas.
Se os legisladores se recusam a considerar poemas como crimes, então alguém precisa cometer os crimes que funcionem como poesia, ou textos que possuam a ressonância do terrorismo. Reconectar a poesia ao corpo a qualquer preço. Não crimes contra o corpo, mas contra Ideias (e Ideias-dentro-das-coisas) que sejam letais e asfixiantes. Não libertinagem estúpidas mas crimes exemplares, estéticos, crimes por amor.
(CAOS - terrorismo poético: Hakim Bey).


Se a História É "Tempo", como declara ser, então um levante é um momento que surge acima e além do Tempo, viola a "lei" da História. Se o Estado É História, como declara ser, então o levante é o momento proibido, uma imperdoável negação da dialética como dançar sobre um poste e escapar por uma fresta, uma manobra xamanística realizada num "ângulo impossível" em relação ao universo. A História diz que uma Revolução conquista "permanência", ou pelo menos alguma duração, enquanto o levante é "temporário". Nesse sentido, um levante é uma "experiência de pico" se comparada ao padrão "normal" de consciência e experiência. Como os festivais, os levantes não podem acontecer todos os dias - ou não seriam "extraordinários". Mas tais momentos de intensidade moldam e dão sentido a toda uma vida. O xamã retorna - uma pessoa não pode Ficar no telhado para sempre - mas algo mudou, trocas e integrações ocorreram - foi feita uma diferença. (TAZ: Hakim Bey).




COMEÇO DO MUNDO
O que pode um corpo
morto que se
descobre vivo?
Como se dobra
o sufoco? Como
se alça o asfalto?
Tudo está à flor
da pele e
subterrâneo.
Rua, começo do mundo.
O que pode um corpo?
O que pode um povo?
Nenhuma tropa
de choque esmaga
a resposta que somos.    
Eduardo Sterzi (Vinagre)



LEMBRETE
Havia um homem antes da farda:
depois, difícil dizer
visto deste ângulo
a vista turva de gás
confunde a espingarda às mãos, braços, corpo cabeça.
Havia um homem antes da farda:
depois, difícil  
o amor à ordem,
ainda que caduque e obrigue
a esquecer como basta
o menor dos impulsos para pedra, faca, estilhaço
rasgar-lhe a garganta.
Havia um homem antes da farda:
depois,
caos, um nada,
anterior talvez à farda
à espera que, de ordem, uma palavra
o preencha,
havia um homem ––
esse verso impossível de lembrar,
se a hora não é de poemas, falhando a voz,
o coturno abafando a garganta, ódio
trêmulo na fumaça dos detritos.    
Adriano Scandolara (Vinagre)

quinta-feira, julho 11, 2013

A OCUPAÇÃO: "many FESTA-ações" na cidade


O evento A Ocupação com a criação de um corredor cultural no Viaduto de Santa Tereza, no último domingo, dia 07 de julho, revelou os belos horizontes de uma cidade que todos nós reivindicamos. Manifestação popular e artística, a cidade foi de fato praticada e o melhor: ocupada. Reunião de desejos, encontros, conversas, comidas, músicas, brincadeiras e solidariedades - tudo se congregou de forma coletiva, lúdica e alegre. Um mar de gente. O corpo da cidade em festa.
Um carnaval livre e instituído fora dos calendários oficiais como uma taz, zona autônoma temporária, muitas festas aconteceram simultaneamente, uma legião de micro-eventos. A possibilidade de mistura, diversidade e mobilidade de ideias, corpos e expressões. Espaço heterogêneo. Heterotopias com o surgimento e uso de lugares reinventados: pequenas praças, boates na rua, varais de poesia, galerias abertas, hortas comunitárias, bazares coloridos, salas de estar, cozinhas fartas, cinemas gratuitos, playgrounds etc.
E nós do Obscena participamos com duas ações: “Cadeiras: leituras para um levante” e “Irmãos Lambe-Lambe: registros fotográficos de um levante”. Delícia de se corpofestejar a cidade, espaço que nós habitantes às vezes mais evitamos do que frequentamos. Nós do Obscena somos fiéis amantes das ruas e não podíamos faltar a essa festa.
Encenar/ensinar CIDADANIA: corpos em manifesto
Em “Irmãos Lambe-Lambe” eu e Leandro Acácio sempre trazemos uma questão para ser debatida com os transeuntes na cidade. Dessa vez nossa pergunta foi: “qual é a tua manifestação para esta Ocupação?” As pessoas então escreviam seu manifesto pessoal e depois eram fotografadas por nós. A participação exigia maior comprometimento das pessoas.
Os curiosos se aproximavam:
- O que é isso?
- Essa cadeira é um ESPAÇO PÚBLICO DESOCUPADO. Quer ocupar?
- Mas como?
- Basta você se manifestar por escrito e depois te fotografamos. E depois enviamos a imagem revelada pelos correios.
E juntavam-se muitas pessoas: jovens, crianças, famílias etc. Tínhamos assim dois tempos de provocação e criação para os cidadãos: primeiro, o produzir o cartaz e depois o se sentar na cadeira para ser registrado. E também surgiram dois espaços que se retroalimentavam: “a praça da escrita” – com várias pessoas sentadas no chão pensando e escrevendo seus poemas amorosos e revoltosos; e à frente: “o ponto de encontro” – espaço da cadeira para a fotografia. Espaços ocupados.



 Imagens de Whesney Siqueira

Sentimos pulsar nas pessoas que participavam uma alegria de estarem ali e também um sentimento de pertencimento ao levante popular nesse momento histórico de nosso país e cidade. Juntos encenávamos, ensinávamos e aprendíamos, o esquecido exercício da cidadania. Para nós, os Lambes, era a oportunidade dessa nossa experimentação artística, dialogar com as manifestações, protestos e marchas urbanas. Arte e contexto. ContextARTE. Contestar.
Foram duas horas intensas de escuta, escrita, expressa e manifesta. Ao final de nossa ação tínhamos colecionado um “muro de manifestações”. Chega de lamentações! Em breve vamos sair pela cidade e colar os cartazes produzidos em postes, muros e lixeiras, como uma exposição e composição públicas desse trabalho. Procuro-me e encontro-te tatuado na cidade.
Vejo as fotografias e os manifestos como documentos de mais uma assembleia acontecida naquela tarde debaixo do Viaduto Santa.
O evento foi mais que um corredor: foi uma arena de lazer e prazer coletivos, sem centro e margem, sem alto e baixo, sem grande e pequeno, sem protagonista e coadjuvante. Aglomeração. Rizoma. Mutirão. Multidão. Multi-pão. Alimento para sensibilidades. Sem palco e plateia, fomos todos atuantes. Fizemos amor com BH e melhor não há!
A OCUPAÇÃO: celebração de um belo HORIZONTE: o povo na rua com passe livre para vivenciar a cidade.






sábado, julho 06, 2013

Obscena amanhã na OCUPAÇÃO

O povo se manifesta, reivindica, resiste, ocupa e produz arte. Na tarde deste domingo, 07, venha ocupar o Viaduto Santa Tereza conosco. Vamos realizar duas ações: "CADEIRAS: leituras para um levante" e "IRMÃOS LAMBE-LAMBE: registros fotográficos de um levante".

O CORREDOR CULTURAL JÁ EXISTE!!!

 A OCUPAÇÃO!



 

quarta-feira, julho 03, 2013

POSTEBOOK: intervenções na paisagem

Intervenções na paisagem urbana. Escritas no corpo da cidade. Rasuras nos discursos instituídos. Intervenção do tempo. Obras efêmeras. Postagens marginais. Anúncios anônimos. Desenhos e grafias singulares. Desejos manifestos. Poesia. Cartazes. Subversões. Tatuagens. Catarses. Protestos. Um Postebook coletivo. Não a face (ou o facebook) de uma cidade, mas os corpos misturados compondo, ferindo e gritando humanidades.

O poste é suporte. O suporte é parede. A parede é chão. Alto, baixo, duro e liso. APOSTE: o poste é corpo!

Não é a exposição de uma bela face da cidade, mas a publicação de um corpo urbano infiltrado por pequenas ações, contaminado de interferências e esbanjando saúde e vitalidade pelo encontro de diferentes afetos.









imagens: retratos, registros e rastros de minha caminhada pela cidade...

sábado, junho 29, 2013

Eu quero o fim da baderna no Brasil!


Eu quero o fim da baderna!!!

Eu quero o fim da baderna no Brasil!
Não aguento mais tanto descaso na Saúde, Educação e Transporte Urbano!
Não aguento mais a falta de transparência do Poder Público!
Não aguento mais a privatização dos espaços da cidade!
Não aguento mais a corrupção de nossos representantes políticos!
Não aguento mais essa polícia que mata!


Eu quero o fim da baderna no Brasil!
Não aguento mais a depredação dos Direitos Públicos!
Não aguento mais o massacre dos pobres, negros e indígenas!
Não aguento mais os preconceitos contra mulheres, gays e idosos!
Não aguento mais a violência nossa de cada dia!
Não aguento mais os saques e roubos da nossa cidadania!

Vejam, aquele baderneiro acaba de votar uma lei na calada da noite!
Olhem aquele mascarado falando que somos o país do futebol!
E aquele vândalo logo ali, colocando fogo em nossos direitos!!!

Eu quero o fim da baderna no Brasil!

Manifestantes das ruas
Sindicatos
Cidadãos revoltados
Jovens e estudantes politizados
OBRIGADO POR LUTAREM PARA RESTABELECER A ORDEM
E ACABAR COM ESSA BADERNA QUE JÁ DURA 500 ANOS!


quarta-feira, junho 26, 2013

Mapas subjetivos: por uma geografia da percepção

Comecei um estudo e pesquisa sobre Mapeamento a partir do contato com uma oficina realizada no Cras Santa Rita de Cássia com um coletivo juvenil do Programa Projovem Adolescente. Junto aos jovens criei meu primeiro mapa subjetivo daquele lugar e pude cartografar meu percurso ali, meus espaços de afeto e mobilidade, caminhos que meu corpo faz e como "leio" aquela comunidade.

A criação desse mapa se opõe aos mapas objetivos, impessoais e oficiais e na realização plástica ( com cores, cartolinas e dobraduras) dessa ação se configuram as naturezas dos espaços: lugares de medo, lugares históricos, lugares sagrados etc. Também podem ser lidos como mapas mentais. Esses mapas deixam claros nossos passos e apontam nossa "corpografia urbana" ( ver BERENSTEIN).

Eles podem revelar por exemplo nossa relação com a cidade: espaços que frequentamos, espaços de exclusão, dificuldades de acesso, espaços vazios e invisíveis, não-lugares etc. E a forma de criá-los é livre.




Vou continuar estudando sobre tal prática: mapas colaborativos, topografias variadas, mapas da violência etc. Isso me lembrou o mapeamento afetivo que criamos na ação PROCURO-ME dos Irmãos Lambe-Lambe, pesquisa realizada no Obcena por mim e por Leandro. Um mapeamento verbal, uma conversa, um ponto de encontro, uma poética e política de PROXIMIDADE com o habitante da cidade.

Importante frisar que mapeamos aquilo que faz sentido para nós. O que não aparece reconhecido em nosso mapa subjetivo pode demonstrar um lugar negligenciado por nossa percepção (não faz parte de nossa corpografia ou memória urbana) ou educado para esse fim (dentro do projeto cartográfico e coreográfico dos urbanistas. Ver BERENSTEIN).

No livro Modernidade Líquida, BAUMAN (2001: 121, 122) afirma: " A cidade, como outras cidades, tem muitos habitantes, cada um com um mapa da cidade em sua cabeça. Cada mapa tem seus espaços vazios, ainda que em mapas diferentes eles se localizem em lugares diferentes. Os mapas que orientam os movimentos das várias categorias de habitantes não se superpõem, mas, para que qualquer mapa faça sentido, algumas áreas da cidade devem permanecer sem sentido. Excluir tais lugares permite que o resto brilhe e se encha de significado".

quinta-feira, junho 20, 2013

Que sensacional! O povo está na rua e nem é carnaval!!!






Praça Sete, ontem à noite. Fiz essas imagens durante o protesto que reuniu quase 10.000 pessoas no centro da cidade. Manifestei junto e senti a pulsação dos corpos nas ruas. Trata-se de uma conjunção de manifestações, causas e insatisfações. Espaço heterogêneo e militâncias diferenciadas. Manifestação horizontalizada e repleta de teatralidades e performatividades. Mas o elemento político me pareceu realmente ser o foco...

Me chamou a atenção os corpos-instalação dos manifestantes, seus cartazes e seus gritos e slogans.

O que me interessa nesse movimento nacional é o desejo da população de recuperar o ESPAÇO PÚBLICO, tanto geograficamente (questões de mobilidade urbana, por exemplo) quanto politicamente numa dimensão de um  espaço de discussão e decisões coletivas. O direito à cidade de fato. UM BASTA À UMA CIDADE AUTORITÁRIA E EXCLUDENTE! Cidade outdoor, planejada para os grandes eventos como a COPA DO MUNDO e sucateada cotidianamente nas esferas da Educação, Saúde e Transporte Público.

Um basta também a essa política higienista das prefeituras de quase todas as cidades brasileiras,  com seus projetos de uma arquitetura asséptica e privatizada, suas corrupções e seus decretos autoritários decididos na clandestinidade e sem a opinião pública consultada.

Caminhando pelas ruas ontem, numa grande performance social e civil, me voltaram de alguma forma a lembrança de uma série de ações performáticas e de intervenção urbana artística que já realizamos na cidade, tanto no OBSCENA, quanto nos diálogos com outros coletivos como, OS CONECTORES
( "PESCA NO ARRUDAS"), com eventos como do Galpão Cine Horto : OCUPE A CIDADE, no qual realizamos "CORPOS PROIBIDOS", " A PRAÇA É NOSSA?" , com o Movimento Fora Lacerda: "HUMANIZE UMA PEDRA", entre outros. Também me lembrei da PRAIA DA ESTAÇÃO e do evento MUROS: Territórios Compartilhados.

Foi sensacional ver e estar com todos os cidadãos na rua e essa reação popular já estava mais do que na hora de explodir!!!

segunda-feira, junho 17, 2013

Protestos coletivos: corpos indignados na cidade







"Você não vai poder ficar em casa, irmão.
Você não vai poder sentar, ligar e dar o fora.
Você não vai poder se perder na troca de canais.
Ou sair e pegar cerveja nos comerciais
porque a revolução não será televisionada.
A revolução não será televisionada, não será televisionada, não será televisionada a revolução,
não será televisionada.

A revolução não terá reprises, irmãos.
A REVOLUÇÃO SERÁ AO VIVO."

Gil Scott-Heron (1970).



Foto de Whesney Siqueira
Praça Sete. BH/MG
Protestos hoje e que duram até a noite.

quarta-feira, junho 12, 2013

Zonas Autônomas Temporárias


Há um tempo atrás, em uma conversa telefônica, eu e Clóvis tínhamos decidido nos encontrar em algumas terças – provavelmente encontros quinzenais – para discutirmos alguns textos e dar seguimento a alguns aspectos, digamos, “temáticos” de nossa pesquisa, junto ao Obscena, que tem nos inquietado. A questão da cidade, ainda bastante presente. Também do artivismo. E algumas experiências que temos feito/passado por elas e queríamos compartilhar um com o outro.
Na última reunião do Obscena, estendi o convite a outr@s e, então, ontem nos encontramos, eu, Clóvis, Joyce e Lissandra, para discutirmos o texto TAZ, de Hakim Bey. No melhor espírito festivo das TAZ, escolhemos um boteco sossegado na região do Horto.
A conversa foi bastante produtiva, lançando pontes para vários lugares. Em questão, as noções de revolução, levante, mapa psicogeográfico, fendas e invisibilidades, redes e festas. Movimentos sociais e internet. Ações passadas e futuras do Obscena. E seus modos de funcionamento.  Ficou o desejo de experimentar algumas cartografias do afeto/linhas de fuga.
Abaixo, seguem algumas notas do texto de Hakim Bey, que me alimentaram para essa conversa e que giram em torno de aspectos que desejo aprofundar mais.

DO CAPÍTULO: ESPERANDO PELA REVOLUÇÃO.
A TAZ é uma espécie de rebelião que não confronta o Estado diretamente, uma operação de guerrilha que libera uma área (de terra, de tempo, de imaginação) e se dissolve para se re-fazer em outro lugar e outro momento, antes que o Estado possa esmagá-la. Uma vez que o Estado se preocupa primordialmente com a Simulação, e não com a substância, a TAZ pode, em relativa paz e por um bom tempo, "ocupar" clandestinamente essas áreas e realizar seus propósitos festivos. (...)
Assim que a TAZ é nomeada (representada, mediada), ela deve desaparecer, ela vai desaparecer, deixando para trás um invólucro vazio, e brotará novamente em outro lugar, novamente invisível, porque é indefinível pelos termos do Espetáculo. Assim sendo, a TAZ é uma tática perfeita para uma época em que o Estado é onipresente e todo-poderoso mas, ao mesmo tempo, repleto de rachaduras e fendas. (...)
Em suma, uma postura realista exige não apenas que desistamos de esperar pela "Revolução", mas também que desistamos de desejá-la. "Levantes", sim - sempre que possível, até mesmo com o risco de violência. Os espasmos do Estado Simulado serão "espetaculares", mas na maioria dos casos a tática mais radical será a recusa de participar da violência espetacular, retirar-se da área de simulação, desaparecer.
A TAZ é um acampamento de guerrilheiros ontologistas: ataque e fuja. Continue movendo a tribo inteira, mesmo que ela seja apenas dados na web. A TAZ deve ser capaz de se defender; mas, se possível, tanto o "ataque" quanto a "defesa" devem evadir a violência do Estado, que já não é uma violência com sentido. O ataque é feito às estruturas de controle, essencialmente às ideias. As táticas de defesa são a "invisibilidade", que é uma arte marcial, e a "invulnerabilidade", uma arte "oculta" dentro das artes marciais. A "máquina de guerra nômade" conquista sem ser notada e se move antes do mapa ser retificado. Quanto ao futuro, apenas o autônomo pode planejar a autonomia, organizar-se para ela, criá-la. E uma ação conduzida por esforço próprio. O primeiro passo se assemelha a um satori - a constatação de que a TAZ começa com um simples ato de percepção.

DO CAPÍTULO: A PSICOTOPOLOGIA DA VIDA COTIDIANA
O mapa está fechado, mas a zona autônoma está aberta. Metaforicamente, ela se desdobra por dentro das dimensões fractais invisíveis à cartografia do Controle. E aqui podemos apresentar o conceito de psicotopologia (e psicotopografia) como uma "ciência" alternativa àquela da pesquisa e criação de mapas e "imperialismo psíquico" do Estado.
Estamos à procura de "espaços" (geográficos, sociais, culturais, imaginários) com potencial de florescer como zonas autônomas - dos momentos em que estejam relativamente abertos, seja por negligência do Estado ou pelo fato de terem passado despercebidos pelos cartógrafos, ou por qualquer outra razão. A psicotopologia é a arte de submergir em busca de potenciais TAZs.
O fim da Revolução e o fechamento do mapa são, no entanto, apenas as fontes negativas da TAZ: ainda há muito a dizer sobre as suas inspirações positivas. Reação somente não pode gerar a energia necessária para "manifestar" uma TAZ. Um levante também precisa ser a favor de alguma coisa.
-  Se a família nuclear é gerada pela escassez (e resulta em avareza), o bando é gerado pela abundância (e produz prodigalidade). A família é fechada, geneticamente, pela posse masculina sobre as mulheres e crianças, pela totalidade hierárquica da sociedade agrícola/industrial. Por outro lado, o bando é aberto - não para todos, é claro, mas para um grupo que divide afinidades, os iniciados que juram sobre um laço de amor. O bando não pertence a uma hierarquia maior, ele é parte de um padrão horizontalizado de costumes, parentescos, contratos e alianças, afinidades espirituais etc.
- A TAZ como um festival. Stephen Pearl Andrews certa vez elaborou uma imagem da sociedade anarquista como um jantar, no qual todas as estruturas de autoridade se dissolvem no convívio e na celebração (veja o apêndice C). Aqui poderíamos também invocar Fourier e seu conceito dos sentidos como base de transformação social - "toque do cio" e "gastrosofia", e seu louvor às negligenciadas implicações do olfato e do paladar. Os antigos conceitos de jubileu e bacanal se originaram a partir da intuição de que certos eventos existem fora do "tempo profano", a unidade de medida da História e do Estado. Essas ocasiões literalmente ocupavam espaços vazios no calendário – intervalos intercalados. [...]Os que participam de levantes invariavelmente notam seus aspectos festivos, mesmo em meioàluta armada, perigo e risco. O levante é como um bacanal que escapou (ou foi forçado a desaparecer) de seu intervalo intercalado e agora está livre para aparecer em qualquer lugar ou a qualquer hora. Liberto do tempo e do espaço, ele, no entanto, possui bom faro para o amadurecimento dos eventos e afinidade com o genius loci. A ciência da psicotopologia indica "fluxos de força" e "pontos de poder" (para usar metáforas ocultistas) que localizam a TAZ num espaço-temporal, ou que, pelo menos, ajudam a definir sua relação com um determinado momento e local. [...]Seja ela apenas para poucos amigos, como é o caso de um jantar, ou para milhares de pessoas, como um carnaval de rua, a festa é sempre "aberta" porque não é "ordenada". Ela pode até ser planejada, mas se ela não acontece é um fracasso. A espontaneidade é crucial.
-  O conceito de nomadismo psíquico (ou, como o chamamos por brincadeira, "cosmopolitismo desenraizado") é vital para a formação da realidade da TAZ. Aspectos desse fenômeno foram discutidos por Deleuze e Guattari em Tratado de Nomadologia: a máquina de guerra, por Lyotard em Driftworks e por vários autores na edição "Oásis" da Semiotext(e). Preferimos o termo "nomadismo psíquico" a "nomadismo urbano" ou "nomadologia", "ações à deriva" etc., simplesmente para poder juntar todos esses conceitos num único sistema complexo que será estudado à luz da emergência da TAZ.
(...) cria "ciganos", viajantes psíquicos guiados pelo desejo ou pela curiosidade, errantes com laços de lealdade frouxos (na verdade, desleais ao "projeto europeu", que perdeu todo o seu charme e vitalidade), desligados de qualquer local ou tempo determinado, em busca de diversidade e aventura...


AVENTUREMO-NOS!

terça-feira, junho 11, 2013

sonoridades obscênicas, recortes


com amor,

recortes do Sonoridades Obscênicas,
acontecido no Centro Cultural São Geraldo - BH em 2012

olhasdelícia!


sexta-feira, maio 24, 2013

Publicando o produzido.

Efêmeros atos
de obscenizar o dia
um fazer diferente,
vida.

Dois em passo de um
gaiolas de n[o]s
livres...

Presos em sorriso
presos em imagens
prisão?

EngaioLados


(MultipliCidades Obscênicas: Um Programa Obscênico)

EngaioLados
Performers: Joyce Malta e Matheus Silva
Filmagem e edição
FRida

https://www.youtube.com/watch?v=Lu2EnLQFh_M

quinta-feira, maio 23, 2013

dançafeto: da porta da rua pra fora.

dança das afetações. deriva. psicogeografia de luz e sombra. próteses anexos e extensões. paisagens urbanas. blocos de cor. feminino.


 
lica orienta o trabalho corporal. equilíbrio. encaixe. desequilíbrio. meu corpo e do outro. ela nos ativa. nos bota a dois. os panos nuvem. a cidade. a dança com a cidade. botar o bloco na rua.
de par grudamos eu e joyce. e nosso pano nuvem. saltos vermelhos. presa entre panos. inevitável feminino(ismo).


saltos e música. estou coberta por carne quente. a gruta.
saimos porta a fora e tudo que sai da minha boca soa falso.
a gente vai ficar lindo na parede de grafitte. (e na coreografia do sinal)
tira foto pra botar no facebook.

eu vou curtir.
e eu, vou compartilhar.
 ei! ai.
deu até samba:  "essa aí vai dá uma foto...
                          essa aí vai dar..."

p.s. bom mesmo foi a moça que enrolamos e as duas menininhas que seguimos, entre medos e risos.
p.s.2: fotos de admar fernandes.

sábado, maio 04, 2013

Engaiolada de sorriso preso

AdivinhaaDiva: pós-gênero?


Foto: Frederico Caiafa

No dia 05 de abril de 2013, aconteceu, durante o Festival Roda de Rock, AdivinhaaDiva, com as presenças de Carolina Botura, Flávia Fantini, Leandro Acácio e eu. Realizamos, durante nossos encontros anteriores, leituras de alguns trechos do livro de Daniel Paul Schereber, "Memoirs", de 1903. Nele, o autor, toma notas a respeito de seu estado mental e físico, e também das muitas experiências interiores estranhas que tivera. Em seu sistema delirante, tal como se revela nas "Memoirs", Schereber:
 -Sentia que tinha a missão de redimir o mundo e reconduzi-lo a seu estado de bem aventurança.
-Tal missão deveria ser precedida da destruição do mundo e pela transformação de sua pessoa em mulher.
-Já transformado em mulher, Schreber seria a companheira de Deus, e desta união surgiria uma raça melhor e mais saudável de homens.
Flávia sugeriu textos de Beatriz Preciado, que é uma participante ativa do atual debate sobre os modos de subjetivação e identidade, não somente na Espanha, como também em distintos debates internacionais. Seu livro “Manifiesto Contrasexual” (Barcelona: Opera Prima, 2002) tornou-se uma referência indispensável à teorização queer contemporânea. Carolina Botura sugeriu, para pensar mais sobre o corpo híbrido, um vídeo:http://www.youtube.com/watch?v=NYTJpHeVVeQ.
Leandro quis explorar máscaras gigantescas, desenhadas por ele, para um "devir-pintor". E aconteceu, conforme Guimarães Rosa, no conto Substância, do livro "Primeiras Estórias", "o não-fato, o não tempo, silêncio em sua imaginação. Só o um-e-outra, em em-si-juntos, o viver em ponto sem parar, coraçãomente: pensamento, pensamor." Amanhã nos encontraremos para conversar e ver as imagens, trocar os perceptos,  comentar os afetos, pesquisar.






quarta-feira, maio 01, 2013

dancemos, dancemos tod@s, senão estaremos perdid@s!

é engraçado que, ao parafrasear pina para fazer meu título e falar de uma condição hoje vital para mim, defrontei-me também com a marcação de gênero. e com a percepção do modo como estas duas questões - a dança e o feminismo - estão, a meu ver, em muitos momentos do meu trabalho, misturadas... explico.
sábado, dia 27 de abril, participei da performance de rua "dançar é uma revolução!". essa ação, organizada por um coletivo (não-organizado) de mulheres, pretende-se mensal e itinerante. a idéia é que, no último sábado de cada mês, mulheres se reúnam, em alguma praça de belo horizonte, para dançar contra a violência.
na primeira vez que fizemos, foi como uma resposta ao convite do one billion rising, evento de ordem mundial que tem a seguinte chamada (aqui em versão livre): "uma em cada três mulheres será agredida durante toda a sua vida. 1 bilhão de mulheres agredidas é uma atrocidade. 1 bilhão de mulheres dançando é uma revolução". lembro-me que o dia marcado para acontecer a ação, no mundo, havia sido 14 de fevereiro. no entanto, em várias cidades do brasil a coisa estaria acontecendo no sábado, dia16.
foi legal observar isso porque, ao receber um convite de uma amiga de londrina, pelo face, para participar da ação no dia 14, ou seja, para dançar em qualquer lugar, em minha cidade, pensei que seria interessante fazer isso coletivamente (acredito muito que pelas experiências anteriores do obscena com a marcha mundial das mulheres e com outras performers feministas com quem dialogamos sempre, experiências sempre muito produtivas, do ponta de vista político e estético) e, como estava muito em cima da hora para fazer na quinta, acabei chamando esses grupo de mulheres parceiras, colaboradoras, a desenhar, para o sábado 16,  uma dança/ação coletiva na praça 7, lugar tradicional de protesto na cidade.
partimos de alguns elementos já desenvolvidos pelo obscena - como a idéia de dançar cada uma a sua música, com fones de ouvido, como na ação performática festa no metrô - e de outros, que surgiram de símbolos do movimento feminista, como a cor roxa para nos vestirmos; ou das ações individuais, como a escrita a giz no chão - que desenvolvo em minhas ações desde 2008 - ou o cartaz da resistência negra, empunhada por luana tolentino.

e assim fizemos: de roxo e branco, cada uma com um set musical diferente, que escutava em seus fones de ouvido, dançamos juntas, na praça: eu, joyce malta, lissandra guimarães, clarissa alcantara, flavia fantini, debora fantini, hozana passos, luana tolentino, romênia reis, raquel medeiros, leticia castilho, thálita mota, kristoff silva, áurea carolina, scheylla bacelar... 
ah, foi bom. ver uma mulher que passou por ali, parar e dançar conosco, porque "já apanhou muito e agora não apanha mais. nunca mais".foi bom dialogar com a cidade a partir do corpo e do giz. misturar, à minha dança, e à dança das outras, palavras que falavam da gente e da situação contra a qual lutamos diariamente e em razão da qual estávamos ali.
daí, a partir desse dia, uma de nós, letícia castilho falou: não seria ótimo se a gente dançasse toda semana, até as pessoas começarem a falar "ó, ali estão aquelas mulheres que dançam contra a violência..."?

achei essa idéia tão linda. levei tão a sério, que resolvi propor um grupo no facebook para organizarmos essa ação. senão semanal, como se mostrou inviável, pelo menos mensal. e uma questão para mim era: como torná-la mais marcante, inclusive para nós?
no mês seguinte era março e resolvemos fazer a ação no dia internacional das mulheres. por um lado, foi muito interessante a integração à marcha e desenvolvê-la junto com o obscena. por outro, a ação, em si, perdeu a força, diluiu-se em uma massa que, por sua vez - o que foi ótimo! - ganhou força nessa junção coletiva, como também ganhou força os corpos que traziam representações individuais - do véu muçulmano ao corpo machucado - em performances que ocorriam a todo momento.

foto: Matheus Silva


agora, em abril, optamos em dançar na praça da rodoviária e dancei com o corpo escrito, dancei com várias palavras de ordem em meu corpo, desde "não é não" e "meu corpo, minhas regras" até "dançar é uma revolução", ou com dados concretos, como aquele da chamada: "1 a cada 3 mulheres será agredida" ou a estatística brasileira, "10 mulheres mortas por dia". e, para mim, a ação, feita assim, foi bem reveladora!

 Foto: Nina Caetano


a dança se revelando quando, com a escrita no corpo, as palavras também sugeriam movimentos, para serem vistas. para serem lidas. foi uma experiência bem interessante, principalmente ao pensar que ela vem de uma trajetória de ações investigadas dentro do obscena, de experimentos que lidam com aquilo que tenho chamado de escrita performada: a escrita no calor da ação performativa.
vejo isso desde baby dolls, com as primeiras escritas a giz no chão (na verdade, vejo antes: desde a vitrine dos corpos prostituídos, proposta por marcelo rocco, ainda no teatro marília, em 2008) até espaço disponível, anuncie aqui, intervenção realizada pelo obscena no evento corpolítico, em março de 2013, passando pelas mulheres painel, experimentadas em diálogo por lissandra guimarães e por mim junto a outras mulheres, como, por exemplo, na ação performática 25 de novembro... nela, é evidente também os rastros de ações lúdicas, como a já citada festa no metrô...
por outro lado, vem se intensificando, cada vez mais, a relação com a dança. dentro do processo das ondas, um material que vinha me instigando dizia respeito à jinny, talvez a personagem mais corpo de virginia, e eu já havia até brincado com a idéia de uma dança de palavras e de tecer um tango com elas - clarissa já havia até feito uma primeira versão musicada disso... e, recentemente, fred caiafa propôs trabalhar também a partir da dança, do que ele está chamando de uma dança de afetações.
com o interesse cada vez mais nítido de levar as ondas para as ruas, resolvemos, então, eu e ele, sair - e para isso chamamos joyce, em primeiro lugar, para dialogar conosco a partir de seus materiais sonoros e performáticos, e também todos os demais, incluindo clóvis, que não está nas ondas, mas está - para uma deriva dançada pelo centro da cidade. essa deriva tinha o intuito de traçar um mapa psico-geográfico-corporal, uma corpografia das luzes e sombras da cidade.
fomos eu, fred, joyce, clóvis e leandro. nos encontramos às sete, na praça da estação, e rumamos em direção ao viaduto de santa tereza, pela andradas. joyce, com o gravador, captava nossas vozes e os sons do centro nervoso. nós todos nos lançamos em distintas experiências.
eu parti em busca da sombra. e como era múltipla e tênue! como a cidade é iluminada! ou, como disse clóvis, ensolarada... além da sombra, uma frase me guiava: estou coberta por carne quente. como as palavras escritas no corpo, no outro dia, essas palavras inscritas na pele guiavam meu movimento. em diálogo com as sombras. e com as luzes que passavam.
quando chegamos embaixo do viaduto de santa tereza, a configuração do trabalho se alterou. se antes, o movimento era de ordem bem individual, ali ganhou uma dimensão mais coletiva. trabalhávamos em um mesmo fluxo de ações. recuperamos movimentos já improvisados nas ondas. ensaiamos dançar com a arquitetura e com os passantes. ações surgiam fugazes, como o prolongado aplauso aos usuários de um ônibus que parara no sinal fechado.
da próxima vez, quero experimentar o giz.


p.s. a primeira foto, com filtro roxo, é de davi madureira victral.