Sobre
a leitura do texto de Iliana Dieguez "Cenários Liminares - teatralidades, performance e política", proposto por Frederico:
Como escancarar e fazer ver aquilo que nos arrebata?
Como
praticar uma transdisciplinaridade em nossas ações artísticas? Como combater
as vozes solenes, moralizantes, ordeiras? Como fazer suspender nossos
automatismos e explorar nossos espaços liminares, em nós mesmos?
Penso
que, para isso, é importante questionar-se e fazer-se perguntas como: ainda não
estou centralizando o meu pensamento em torno do que faço? O que isso colabora
para a prática de um agrupamento? Será que preciso sempre dos exitosos para autenticar meu fazer?
Como
funciona uma pesquisa em um coletivo com diferentes funcionamentos e maneiras de produzir? Como explorar novos métodos, mais cartográficos, mais
rizomáticos?
Se
há método de pesquisa, trata-se de mergulhar nos afetos que permeiam os contextos
e as relações que o pesquisador almeja investigar, permitindo-lhe se inserir na
pesquisa e afetar-se com o objeto pesquisado, para produzir um traçado singular
do que se propõe a estudar. A cartografia tem como trabalho metodológico a
invenção e a implicação do pesquisador, uma vez que baseia-se no pressuposto de
que o conhecimento é processual e inseparável do próprio movimento da vida e
dos afetos que a acompanham. Na produção cartográfica, é preciso estar atento às
desestabilizações que, no processo de trabalho, acometem tanto o pesquisador
quanto seu objeto de estudo, seu campo de investigação. . Bem como trata Carmem Gadelha
Este não-método trai as dicotomias em favor da genealogia, busca o
descentramento, anseia pelas superfícies onde sujeito e objeto perdem unidade
porque as grandezas combinadas formam uma trama de indiferenciações, fugindo ao
quantificável e às hierarquias. O território é o da multiplicidade, sempre
desterritorializado e reterritorializado mais além ou aquém, em jogos com as
singularidades. As novas conexões impõem o intercâmbio entre o dentro e o fora
(...) e se negam à sobrecodificação, à determinação histórico-conceitual.
Há um resultado a ser obtido? Vou escrachar. Será que isso é assim ou assado? Melhor escrachar!
Como
combater as coordenações cínicas e tiranas da utilidade das coisas? Será que podemos ter menos expectativas? Será que o que enfraquece os encontros seriam os atrasos, ou seria a neurose da pontualidade? Um bom funcionamento depende do que? O que é comprometer-se? Será que estou comprometido porque chego no horário, não me atraso, não me ausento?
Escrachar, pôr em evidência.
Há
um regulamento? Há
de sempre ficar repisando o que já foi feito? Como
ultrapassar nossas auto-afirmações? Elas são necessárias? Será que vamos ficar
para sempre repassando o que é que se faz e deixa de ser feito? Quando é que
inventamos algo diferente? Vamos parar sempre nossos vôos para ficar falando que não estamos aprofundando? Não seria melhor aprofundar logo de uma vez, contagiar com seu naufrágio?
É
preciso ressaltar que esta cartografia é um investimento em uma jornada rumo ao
desconhecido. Uma abordagem sobre o corpo e suas potências produtivas, uma vez
que não se sabe o que realmente pode um corpo em processo, quais são os seus
limites inventivos. As linhas que o rizoma sugere faz fugir dualismos,
centralidades e binarismos. Trata-se de produzir na ordem da imprevisibilidade,
no risco de corpo que age; precisa-se partir da desnaturalização das leis da
normalidade; investir na potência de transformar e dar visibilidade a outros
encontros, outros modos de subjetivação que afirmem a vida e a arte em toda sua
adversidade. Vale ressaltar, conforme Gislei Lazzarotto,
Para experimentar vista-se de não senso. Abandone a cronologia e
habite o tempo que flui no movimento de pensar. Opte por seguir pelas passagens
de novos sentidos e faça do absurdo a matéria do pensamento. Crie palavras para
acolher os afetos que se produzem neste percurso. Deixe o método, a explicação
e a interpretação desamparados. (...)Trata-se de ultrapassar o que se coloca
como limite entre sujeito e objeto para problematizar a relação produzida neste
movimento. Implica construir um modo de pesquisar que acolha a experiência que
insiste em expressar a multiplicidade que nos constitui. (...) O laboratório
está em você. Ande com o pensamento e percorra os afetos que lhe tocam ao
pesquisar.
Este
entrelaçamento que dissolve funções e refunde funcionamentos rizomáticos entre produto e processo, sujeito
e objeto, como também entre teoria e prática, faz do work in progress, de Renato Cohen, e sua elaboração sobre a obra em
processo, uma ferramenta importante para a realização de pesquisas:
A criação pelo work in progress opera-se através de redes de leitmotive, da superposição de estruturas, de procedimentos
gerativos, da hibridização de conteúdos, em que o processo, o risco, a
permeação, o entremeio criador-obra, a iteratividade de construção e a
possibilidade de incorporação de acontecimentos de percurso são as ontologias
da linguagem. O uso de linhas de força (leitmotive criativos, narrativas) de
“irracionalidade”, a incorporação do acaso/sincronicidade, são operações do work in progress, no qual o paralelismo
entre o processo e o produto são matrizes construtivas da linguagem.
Como trabalhar em coletivos de pessoas? Como tornar
nosso espaço de pesquisa um mar aberto, desconhecido?
COHEN, Renato. Work in progress na cena contemporânea: criação, encenação e recepção. São Paulo: Perspectiva. 2013, p. 1, 2.
2 comentários:
Escrevi este texto no calor do momento... atravessado por muitas linhas, movido por paixões. A pergunta fica aberta: como participar de uma rede de pesquisa sem querer impôr um único funcionamento?
Os afetos são nossas bússolas. Estejamos nós capturados por uma espécie de desejo identitário ou deslizantes em linhas pulsantes que convergem à alegria e a liberdade.
Como estar à altura do que nos acontece?
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