Publico aqui uma entrevista que respondi para o Paulinho sobre o nosso trabalho:
Como o Obscena lida com a questão da localização de sua produção artística, no que diz respeito ao diálogo com a Performance, o Teatro, a Intervenção [Ocupação] Urbana e como estas fronteiras dialogam com a produção do grupo?
Acredito que fazemos e investimos numa prática cênica bricoladora com variadas formas de se fazer arte. Dialogamos com o teatro, a Performance, o vídeo, a literatura, a filosofia, a fotografia e a intervenção urbana. Uma produção híbrida, rizomática, fronteiriça, horizontalizada e muito pautada pelos interesses do agrupamento. Somos um agrupamento de pesquisa e a relação entre as inúmeras linguagens nos interessa muito.
Como se dá o processo criativo?
Por uma rede colaborativa na qual se cruzam desejos pessoais e acordos coletivos. Nos reunimos para leituras, discussões, práticas internas e ações e vivências na cidade. Também trocamos provocações em nosso blog, espaço no qual relatamos e refletimos sobre nossas pesquisas. Realizamos mostras de trabalho abertas ao público, convidamos pessoas para dialogarem com as pesquisas, enfim, o processo de criação está sempre em movimento e descoberta. Como numa rede, as pesquisas se interligam, se comunicam o tempo todo. Atualmente trabalhamos sobre a questão do espaço público, o poder, os corpos, e debaixo deste enorme guarda-chuva temático se abrigam diferentes abordagens de um mesmo assunto.
Como vocês enxergam dentro do agrupamento à relação Coletivo/Individual e a relação Cidade/Artistas?
Na questão coletivo/individual estamos sempre transitando entre esses dois pólos. Tentando achar um lugar de pesquisa e trabalho que se ligue nessas duas instâncias. Então é importante eu desejar algo individualmente e ainda assim levar isso para uma fricção com o coletivo. São acordos que fazemos quando decidimos investigar determinada temática. De alguma forma é o individual que alimenta o coletivo e vice-versa. Tem um diálogo aí também.
Já a questão do artista e sua relação com a cidade, acho que desejamos criar brechas nos espaços públicos. Tentar fazer da cidade nosso cenário expandido, criando ações e intervenções que provoquem as relações estabelecidas. A rua é um lugar de risco e me interessa muito atuar ali sem estar protegido pelo rótulo de artista. É uma invasão que busca ser “anti-espetacular”, e que pode tensionar as fronteiras entre realidade e ficção. Criando momentos de estranhamento, caos, e se possível, desordem.
Lembro-me que no ano passado propus ao agrupamento a prática de algumas ações que chamei de “exercícios de desorientação”. Experimentávamos por exemplo formar filas em lugares como uma faixa de pedestre, um poste, ou então filas para lugar nenhum. Enfim, filas em lugares os quais não se formam filas. Foi muito interessante ver a reação das pessoas. De alguma forma complicávamos a ação cotidiana das pessoas na cidade. O tecido urbano tem multiplicidades invisíveis, pessoas interessantes, lugares diferenciados, é um campo aberto, relacional, tenso e até mesmo poético. E na rua perdemos a autoria da obra, uma vez que o transeunte é convidado a atuar também. Na rua estamos em relação o tempo todo, nela uma ação artística se amplia, se transforma, ganha diferentes contornos..
(Belo Horizonte, Março de 2011).
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