agrupamento independente de pesquisa cênica

Composto atualmente pelos artistas pesquisadores Clóvis Domingos, Flávia Fantini, Frederico Caiafa, Idelino Junior, Joyce Malta, Lissandra Guimarães, Matheus Silva, Nina Caetano, Paulo Maffei, Sabrina Batista Andrade e Wagner Alves de Souza, o Obscena funciona como uma rede colaborativa de criação e investigação teórico-prática sobre a cena contemporânea que visa instigar a troca, a provocação e a experimentação artísticas. Também participam dessa rede colaborativa obscênica os artistas Admar Fernandes, Clarissa Alcantara, Erica Vilhena, Leandro Acácio, Nildo Monteiro, Sabrina Biê e Saulo Salomão.

São eixos norteadores do agrupamento independente de pesquisa cênica, o work in process, os procedimentos de ocupação/intervenção em espaços públicos e urbanos e os procedimentos de corpo-instalação, além da investigação de uma ação não representacional a partir do estudo da performatividade e do pensamento obra de artistas como Artur Barrio, Hélio Oiticica e Lygia Clark.

Atualmente, o Obscena desenvolve o projeto Corpos Estranhos: espaços de resistência, que propõe tanto trocas virtuais e experimentação de práticas artísticas junto a outros coletivos de arte, como ainda a investigação teórica e prática de experimentos performativos no corpo da cidade. Os encontros coletivos se dão às quintas-feiras, de 15 às 19 horas, na Gruta! espaço cultural gerido pelo coletivo Casa de Passagem.

A criação deste espaço virtual possibilita divulgar a produção teórico-prática dos artistas pesquisadores, assim como fomentar discussões sobre a criação teatral contemporânea e a expansão da rede colaborativa obscênica por meio de trocas com outros artistas, órgãos e movimentos sociais de interesse.

terça-feira, novembro 28, 2017

Ainda é possível DESOBECER?

O último café-conversa do Obscena em parceria com o Sesc Palladium foi realizado com as provocações de Frederico Caiafa que abordavam questões sobre a desobediência cênica e atualizavam as perseguições contra a arte nos dias de hoje.

Transcrevo minhas afetações-impressões:

Foto de Marúzia Moraes

- Fred com seu "corpo plataforma" de pequenos textos, realiza uma performance apresentando um corpo atravessado pelas injustiças sociais.

- o EMOCIONAR-SE como forma política e afetiva de se estar no mundo ( fala do Matheus Silva, integrante do Obscena).

- Quais seriam as desobediências do cidadão comum no espaço urbano? Táticas e estratégias a partir das ideias de Michel de Certeau.

- Quais as desobediências possíveis, molares, clandestinas, imperceptíveis?

- Haveria de fato uma liberdade na vida social, ou ela seria condicional e relativa?

- A intolerância ao diferente voltou como mote temático.

- Será o convívio uma forma de política? A política e a polícia em Rancière.

- café não é apresentação, é conversa, logo: PARTICIPAÇÃO. Logo: "performance coletiva", espaço construído, risco o tempo todo... Da artista peruana e seu depoimento ao ver um Brasil EMPOBRECIDO  ao homem agressor que tenta calar a fala de uma mulher que afirma seu direito ao aborto. 

- como sair da opinião pessoal e gerar de fato conversas, fios que se estendem a partir de atos de fala e de escuta? Como criar PERGUNTAS?

- E os artistas desobedientes nas ruas: o menino do malabares na faixa de pedestre, o grafiteiro, o rapper, os homens-estátua?



Como conciliar a aldeia global e a aldeia local? Estamos cercados de flores plásticos. Estamos cercados de câmeras de vigilância. Estamos cercados de grades. Estamos cercados de medo do encontro. Estamos cercados de jardins artificiais. Estamos cercados de possibilidades de desobedecer. Estamos cercados de discursos. Há tanta polícia internalizada em mim. Taz. Eles cantam escravos de Jó e coreografam o Caxangá. Eu faço zigue zigue za. Pequenas camuflagens. Delicados desvios... Faço Taz, faço jaz, faço jazz. Duro pouco. 

terça-feira, novembro 21, 2017

Como aceitar a raposa morta?

No terceiro café-conversa do Obscena, Matheus Silva falou de sua pesquisa sobre o corpo queer, e mais, se apresentou e performou as questões urgentes desse corpo-besta-animal-raposa nos espaços da cidade! Quem tem direito à VIDA na cidade?

Apresento algumas notas reflexivas dessa experiência vivida:

- a nossa dificuldade de aceitar a violência presente na sociedade brasileira, violência naturalizada, como se não existisse aqui no país. A "imagem congelada" do brasileiro harmonioso e gentil, cordial... Isso é uma falácia!!!! Aceitar a raposa morta todos os dias é muito constrangedor para ser refletido no espelho de um povo que se deseja acolhedor, isso quebra nossa imagem idealizada! Serão "ficções de tranquilidade?" A violência está na tela de tv apenas e nos jornais?

- Por quê liquidar as "vidas menores" na Diferença? Por quê se exigir homogeneidade nas formas de se pensar, amar, ver o mundo?

- Seremos corpos-bichos? O inumano é tolerável? Que corpo bizarro é esse? A supremacia do ser humano racional e dono do mundo? Pretensão, arrogância ou ingenuidade? Que corpo é esse como "Montagem"? Me lembrou Paul Preciado e corpo como tecnologias.

Imagem: Marúzia Moraes

- Como levar essas conversas para as comunidades da cidade, as periferias? Boa questão. Mas a rua é tão heterogênea, que marca um ponto de encontro com gente tão diferente. Estarei enganado?

- quem desacredita de você? Quem te fragiliza? Qual é o papel da arte? Folha molhada na chuva?

- o alargador na boca, a fala violentada, feito um animal que GRITA! Isso baba.... sulco, saliva, corpo vivo.... A corda no corpo, feito corrente... será esse corpo da raposa uma atualização de um corpo escravizado? Quem é o capataz? Quem é o Senhor do Engenho? Lembro da Butler: " a polícia de gênero"......

- daquilo que resiste a civilizar-se!!!! domesticação...

- a raposa está morta? quantas raposas querem viver? quem vai lutar por essa fauna chamada HUMANIDADE?

- a rua é REDE: conexões, indagações, falas, escutas, provocações, peixes de um mar chamado cidade....

- da "Mais-valia" para:

o mais-ENCONTRAR
MAIS-RUA
MAIS-luta
mais- ação. 

terça-feira, novembro 14, 2017

é um café-conversa uma obra de arte? uma intervenção urbana? uma obra em construção?

Nos cafés-conversas realizados esse mês pelo Obscena, me veio essa questão:

 O que estamos criando juntos num tempo e num espaço compartilhados? Uma obra de arte? Arte como Encontro? Dispositivos relacionais? Arte e política? 

Na mesa de café: comida, sabores, partilhas, afetos
Na "mesa" de conversa: saberes, partilhas, conflitos, diálogos
No chão da rua: buracos, pausas, interrupções, formas horizontais....

O que pode a fala? O que pode a Escuta? Serão espaços de escuta? 

Foto de Frederico Caiafa

"A essência da prática artística residiria assim na invenção de relações entre os sujeitos; cada obra de arte em particular seria a proposta para habitar um mundo em comum e o trabalho de cada artista, um feixe de relações com o mundo, que geraria por sua vez outras relações, e assim sucessivamente até o infinito" (Bourriaud. Arte Relacional). 

Que relações outras estariam sendo geradas então? 

é possível um mundo comum que sustente a Diferença? 

sábado, novembro 11, 2017

Sobre cidade e memória a partir dos Irmãos Lambe-lambe

Aconteceu na última sexta-feira, mais um café-conversa no Sesc Palladium sobre as ações e pesquisas dos integrantes do Obscena. Dessa vez, fui o mediador da conversa a partir da discussão das questões do afeto e memória nos espaços da cidade. Partilhei a ação urbana "Irmãos Lambe-lambe" que juntamente a Leandro Acácio venho desenvolvendo há seis anos em diferentes contextos da cidade.



Uma boa conversa sempre gera novas questões. e surgiram falas de participantes que muito me instigaram, como por exemplo, a ideia e desejo de realizar um lambe-lambe numa moradia de idosos ( pela questão deles preservarem a prática da memória) e a questão dos nomes dos lugares serem nomeados para evocarem pessoas e acontecimentos que interessam mais ao Poder Público, do que a uma comunidade, daí a importância da memória como singularidade e subjetividade. 

Para Jacques Le Goff  "a memória não é só uma conquista, mas também um instrumento e objeto de poder". Daí discutimos: o que nos dizem os monumentos presentes na paisagem urbana? Quem escolhe o que deve ser lembrado e o que deve ser esquecido? Por que os nomes masculinos são maioria nos monumentos e praças da cidade? 

Também falei da montagem da memória, isto é, a luta e conflito que se dão entre história, memória e narrativa.... Também discutimos sobre a velocidade das imagens e como a carta é uma experiência temporal...  Citei Vilém  Flusser:

“Eu desconheço se já se desenvolveu alguma filosofia por meio de troca de cartas. Ela deveria partir de uma análise do esperar. Cartas são coisas por que se espera – ou que chegam inesperadamente. Naturalmente, esperar é uma categoria religiosa: significa ter esperança. O correio fundamenta-se no Princípio Esperança. Os carteiros, esses gentis funcionários medievais, são anjos (de “angeloi” = mensageiros), e o que eles carregam são evangelhos (mensagens felizes conforme a esperança amparada pelo correio). [...].  (FLUSSER, 2010, p.116)”. 

Foi um encontro-conversa bem dinâmico, e até surgiram lembranças do Sesc Palladium e suas longas filas de cinema, como também, os antigos e hoje extintos espaços de exibição de filmes na cidade. 



Podemos falar de múltiplas memórias: a social e a oficial, a singular, a instituída, daí pensar em coexistências mnemônicas atravessando fluxos temporais e espaciais. Memória como conflito. O que somos levados a lembrar e o que não podemos esquecer. 



terça-feira, novembro 07, 2017

Quando um Espaço do Silêncio é falado


Nina Caetano, performer e integrante do ObsCENA abriu na última sexta uma série de cafés-conversa nas ruas da cidade, num projeto de parceria com o Sesc Palladium. A artista falou de sua pesquisa com a ação "Espaço do Silêncio".



 Como pesquisador e integrante do agrupamento, acompanhei essa ação dialógica e artística e escrevi algumas notas sobre o acontecimento:

- Qual a força da palavra, do manifesto lido, da voz que pulsa? O que pode ecoar quando um trabalho artístico é compartilhado publicamente no espaço urbano?

- Como é falar de violência, machismo e feminicídio no espaço aberto da cidade, quando esta é vivenciada como ameaçadora à integridade das mulheres?

- Como um dispositivo cênico-performático como a presença viva da artista e a instalação dos lençóis com as etiquetas das mulheres assassinadas atua no imaginário urbano e provoca reverberações?

- Quando outras mulheres falam de assédio, misoginia e luta, o que acontece como enunciação coletiva e discursiva?

- Arte e política não são forças e táticas que se encontram? é possível separá-las de fato? Qual arte não será política? O que fala um espaço de conversas senão de uma política de corpos? Não serão situações liminares, isto é, interstícios entre arte e ação cidadã?


- Os lençóis expostos também denunciaram para além das estatísticas, pois singularizam mortas e assassinos. Como permanecer indiferente a tudo isso?

- Quando o espaço do silêncio se torna ESPAÇO DA PALAVRA, não haveria nesse deslocamento um ato político, de reconfiguração, de denúncia para ANÚNCIO?

- O espaço falado foi também um ESPAÇO DE DIÁLOGO. Os homens presentes também puderam falar, mas escutaram muito mais. Nina convocou a todos nós para essa luta. Os homens também precisam discutir entre eles essa temática. Nesse ponto trago um trecho do texto de Márcia Tiburi que afirma:

"Às vezes um lugar de fala pode ser um lugar de dor, às vezes um lugar de dor pode ser um lugar de fala. Se o lugar de fala é abstrato e silencia o outro onde deveria haver um diálogo, então ele já não é mais um lugar político, mas um lugar autoritário que destrói a política no sentido das relações humanas que visam o convívio e a melhoria das condições da vida em sociedade".

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Segunda edição do projeto cOOFee CENA - Conversas públicas

Publicamos aqui uma parte do texto de apresentação desse projeto realizado agora em Novembro em parceria com o Sesc Palladium em Belo Horizonte:


Aí começa a inevitável pergunta: isto é arte? Não, senhoras e senhores: a arte é que é isto. Qualquer isto. Um isto problemático, reflexivo, que é necessário interrogar e decifrar...


No mês de abril o obsCENA Agrupamento desenvolveu uma série de ações artísticas e formativas junto ao Sesc Palladium, dentro da programação do eixo temático e curatorial DE REPENTE ISSO É ARTE?

Dentre as ações de ocupação e intervenção artísticas urbanas propostas, o cOFFee-CENA se destacou por produzir quatro encontros com debates públicos e abertos a todas as pessoas interessadas em arte contemporânea, seus desafios, linguagens, espaços institucionais, alcances e diálogos com a vida social. Uma micro-comunidade se formou na área externa do Sesc Palladium e, além de uma mesa com café colocada para todos se servirem, também foram disponibilizadas cadeiras, e bancos, que garantiram a criação de uma espacialidade circular e horizontal, permitindo a livre circulação de ideias e falas.

Tal evento nos revelou a potência desses encontros interdisciplinares e indisciplinares, capazes de gerar um espaço de fato público e acessível a todo tipo de colaboração, indagação e produção de conhecimentos sobre o papel da arte na sociedade contemporânea.

Diante disso, propomos a realização de uma nova série de cafés-conversas organizados e mediados pelos integrantes-pesquisadores do Obscena, agora num novo formato: a cada encontro, um ou dois artistas trazem provocações para serem lançadas aos presentes, a partir de suas pesquisas de interesse, cujas temáticas perpassam a arte contemporânea em intenso vínculo com questões prementes da vida urbana, tais como: arte, cidade e memória; performance e violência contra a mulher, o universo ciborgue queer, os movimentos sociais e ações artivistas: arte de ação direta, de transformação e questionamento etc. 

Entendemos que tais assuntos são de fundamental emergência para o momento político atual, no qual a violência, a intolerância e o fascismo têm ameaçado fortemente os direitos democráticos e a discussão séria, daí a importância de se colocar a palavra expressa em movimento e circulação no espaço público, criando fóruns de discussão nos quais as diferenças sejam respeitadas e as vozes das ruas possam soar, de modo que também possamos realizar o necessário exercício da escuta dos outros.

A arte no espaço público atua na construção e efetivação de uma coletividade capaz de se auto-criticar e minimamente repensar seus direitos e deveres, principalmente na cidade que se constitui como lugar de disputas espaciais, simbólicas e discursivas. Nesses cafés-conversas cria-se a oportunidade de se fazer política e arte públicas, a partir de temas comuns, bem como de se investir na potência de transformar e dar visibilidade a outros encontros, outros modos de subjetivação que afirmem a vida e a arte em toda sua diversidade.